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LARA E SOPHI dormem no banco de trás. Sophi deitou a cabeça no colo de Lara, que está dormindo com a boca aberta. Papai ouve o rádio com um sorriso leve no rosto. Todo mundo está tão tranquilo, e meu coração bate um milhão de vezes por minuto, na expectativa pelo que estou prestes a fazer.

Vou falar com Bárbara hoje, esta noite. Antes de voltarmos às aulas, antes de todas as engrenagens voltarem ao normal e nossa história não passar de uma lembrança. É como um globo de neve: por um momento, tudo fica de cabeça para baixo e tem purpurina por toda parte e parece até magia, mas logo tudo se acomoda e volta para onde deveria estar. As coisas têm um jeito de voltarem a ser o que eram. Eu não posso voltar.

Espero até estarmos a um sinal do bairro de Bárbara para pedir a papai para me deixar lá. Ele deve ter percebido a intensidade na minha voz, a necessidade, porque não faz nenhuma pergunta, só concorda.

Quando paramos na casa de Bárbara, as luzes estão acesas, e o carro dela está na entrada da garagem. A minivan da mãe dela também. O sol está se pondo cedo porque estamos no inverno. Do outro lado da rua, os vizinhos de Bárbara ainda estão com os pisca-piscas de Natal pendurados. Hoje deve ser o último dia para isso, pois é Ano-Novo. Ano novo, vida nova.

Consigo sentir as veias nos pulsos latejando, e estou nervosa, muito nervosa. Saio correndo do carro e toco a campainha. Quando ouço passos lá dentro, faço sinal para papai ir embora, e ele dá a ré. Sophi acordou e grudou o rosto no vidro de trás, sorrindo muito. Ela faz sinal de positivo, e aceno para ela.

Bárbara abre a porta. Meu coração dá um salto. Ela está usando um moletom preto de Queen's que nunca vi. Deve ter ganhado de presente de Natal. O cabelo está amassado no alto, como se tivesse acabado de se levantar. Ela não parece muito surpresa em me ver.

— Oi. — Ela olha para a saia do meu vestido, que quase se esconde debaixo do casaco de inverno. — Por que você está tão arrumada?

— Por causa do Ano-Novo.

Talvez eu devesse ter passado em casa para trocar de roupa. Pelo menos eu me sentiria mais como eu mesma, de pé na porta daquela garota, tentando me desculpar.

— E aí, como foi seu Natal?

— Bom. — Ela responde devagar e demora quatro segundos inteiros para perguntar: — E o seu?

— Foi ótimo. Temos um cachorrinho novo. O nome dele é Jamie Fox-Pickle. — Nem um traço de sorriso no rosto de Bárbara. Ela é fria; eu não esperava ser tratada com frieza. Mas talvez nem mesmo fosse frieza. Só indiferença. — Posso falar com você por um segundo?

Bárbara dá de ombros, o que parece um sim, mas não me convida para entrar. Um medo repentino de Heloísa estar lá dentro se aloja no meu estômago, mas se dissipa rápido quando lembro que, se ela estivesse lá dentro, Bárbara não estaria aqui comigo.

Bárbara deixa a porta entreaberta enquanto coloca os tênis e um casaco, depois sai para a varanda. Bate a porta e se senta nos degraus. Eu me sento ao lado dela e ajeito a saia.

— E aí, o que houve? — pergunta, como se eu estivesse tomando seu precioso tempo.

Isso não está certo. Não é o que eu esperava. Mas o que exatamente eu esperava de Bárbara? Que eu entregaria a carta a ela, e ela a leria e me amaria? Ela me abraçaria e nós nos beijaríamos apaixonadamente, mas só beijos, só coisa inocente. E aí? Nós namoraríamos?
Quanto tempo demoraria até ela ficar cansada de mim, sentir saudade de Heloísa e querer mais do que eu estava preparada para oferecer, tanto no quarto quanto na vida? Alguém como ela nunca ficaria satisfeita de ficar em casa e ver um filme no sofá. Estamos falando de Bárbara Passos, afinal.

P.S.: Ainda amo você |ADAPTAÇÃO BABITAN|Where stories live. Discover now