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— ME CONTE MAIS sobre sua namorada — pede Stormy.

Estamos sentadas de pernas cruzadas no chão da sala dela, separando fotos e lembranças para o scrapbook. Ela foi a única a aparecer para a aula de hoje, então fomos para o apartamento dela. Fiquei com medo de Janette reparar na frequência baixa, mas, desde que comecei a trabalhar como voluntária, ela nem deu as caras. Melhor assim.

— O que você quer saber sobre ela?

— Ela faz algum esporte?

— Joga lacrosse.

— Lacrosse? — repete ela. — Não futebol nem beisebol ou basquete?

— Ah, ela é muito boa. Já está sendo sondada por faculdades.

— Posso ver uma foto dela?

Pego o celular e mostro uma foto de nós duas no carro dela. Ela está com um moletom verde-floresta que a deixa particularmente bonita. Gosto quando ela usa moletons. Fico com vontade de abraçá-la e fazer carinho como se ela fosse um bichinho de pelúcia.

Stormy olha com atenção.

— Ah — comenta ela. — Sim, ela é muito bonita. Mas não sei se é tão bonita quanto meu neto. Meu neto parece um Robert Redford jovem.

Opa.

— Vou lhe mostrar se você não acredita — diz ela, se levantando e procurando uma foto.

Ela abre gavetas, tira papéis do lugar. Qualquer outra avó em Belleview já teria uma foto do amado neto em exibição. Em um porta-retratos, em cima da tevê ou da lareira. Não Stormy. As únicas fotos em porta-retratos são dela mesma. Tem um retrato de noiva em preto e branco enorme na entrada, que ocupa quase toda a parede. Se bem que acho que, se eu já tivesse sido tão linda, também ia querer me exibir.

— Nossa. Não consigo achar nem uma foto.

— Você pode me mostrar na próxima vez — digo, e Stormy se senta novamente no sofá e apoia as pernas na banqueta.

— Aonde os jovens vão para passar um tempo sozinhos hoje em dia? Um lugar mais "reservado"?

Ela está pescando informações. Stormy é um cão de caça quando se trata de farejar coisas particulares, mas não vou entregar nada. Não que eu tenha muito a oferecer.

— Hã, não sei... acho que não vão.

Eu me ocupo de recolher uma pilha de pedaços cortados de papel. Ela começa a cortar alguns contornos.

— Eu me lembro do primeiro garoto com quem saí de carro para um mirante. Ken Newberry. Ele tinha um Chevy Impala. Deus, a emoção de um garoto tocando em você pela primeira vez. Não tem nada igual, tem, querida?

— Tem. Onde está sua pilha de programas antigos da Broadway? Devíamos fazer alguma coisa com aquilo.

— Devem estar no baú.

A emoção de, não necessariamente um garoto, tocando em você pela primeira vez. Sinto um tremor no estômago. Conheço essa sensação. Lembro perfeitamente, e lembraria mesmo que não tivesse sido capturado em vídeo. É legal pensar naquilo de novo como uma lembrança própria, separada do vídeo e de tudo que veio depois.

Stormy se inclina para perto.

— Carolina, só se lembre de uma coisa: a garota sempre deve controlar até onde as coisas vão. Os garotos pensam com o você-sabe-o-quê. Depende de você manter a cabeça no lugar e proteger o que é seu.

Por que ela está me dizendo isso? Eu namoro uma mulher... Ah, é.

Minha namorada tem um pênis também. Mas não é como se ela soubesse disso.

— Não sei, Stormy. Isso não é meio sexista?

— A vida é sexista. Se você ficasse grávida, seria a sua vida que mudaria. Nada de significativo muda para o garoto. É sobre você que as pessoas vão cochichar. Já vi aquele programa, Jovens e Mães. Todos aqueles garotos são uns inúteis! Lixo!

— Você está dizendo que eu não devo fazer sexo? Por que se estiver, lembre-se que namoro uma mulher, e eu só acho que não posso engravidar dela.

Stormy sempre me diz para deixar de ser tão careta, para viver a vida, para amar. E agora, isso?

— Estou dizendo que você deve tomar cuidado. Tanto cuidado quanto se fosse uma questão de vida ou morte, porque é isso que é. — Ela me lança um olhar significativo. — Eu fiquei sabendo sobre sua namorada, ela é bem conhecida pela cidade aparentemente. Então, nunca confie em alguém para levar a camisinha. Uma dama sempre leva a sua.

Eu tusso.

— O corpo é seu, e é você que tem que protegê-lo e se divertir com ele. — Ela ergue as sobrancelhas de forma significativa. — Com quem você decide compartilhar a diversão é escolha sua, e escolha com sabedoria. Todos os homens que já tocaram em mim tiveram a honra de fazer isso. O privilégio. — Stormy balança a mão na minha direção. — Tudo isso? É um privilégio reverenciar este templo, entende o que quero dizer? Não é qualquer jovem bobinha ou bobinho que pode se aproximar do trono. Lembre-se das minhas palavras, Carolina. Você decide quem, até onde e com que frequência, se decidir que sim.

— Eu não tinha ideia de que você era feminista — digo.

— Feminista? — Stormy faz um som enojado na garganta. — Eu não sou feminista. Sinceramente, Carolina!

— Stormy, não fique zangada. Só significa que você acredita que homens e mulheres são iguais e devem ter os mesmos direitos.

— Eu não acho que qualquer homem é igual a mim. As mulheres são muito superiores, nunca se esqueça. Não se esqueça de nenhuma das coisas que acabei de falar. Na verdade, você devia estar anotando tudo, para as minhas memórias. — E começa a cantarolar "Stormy Weather".

Nunca houve ameaça de as coisas irem longe demais quando estávamos juntas de mentira. Mas agora vejo como as coisas podem mudar rápido sem a gente nem perceber. Podem evoluir de um beijo para mãos debaixo da minha blusa em dois segundos, e é tão febril, tão frenético. É como se estivéssemos em um trem de alta velocidade indo para algum lugar muito rápido, e eu gosto, gosto mesmo, mas também gosto de um trem devagar, no qual consigo olhar pela janela e apreciar a paisagem, os prédios, as montanhas. É como se eu não quisesse perder as etapas; quero que durem. E então, no segundo seguinte, quero ir mais rápido, mais, agora. Estar tão pronta quanto todo mundo. Como é que todo mundo está tão pronto? Ainda acho surpreendente ter uma garota no meu espaço pessoal. Ainda fico nervosa quando ela passa o braço pela minha cintura ou segura minha mão. Acho que não sei namorar no século XXI. Fico confusa.
Não quero o que Lara e Arthur tiveram, nem o que Bárbara e Heloísa tiveram. Quero uma coisa diferente. Acho que posso dizer que desabrochei tarde, mas isso implica que todos temos uma agenda predeterminada, que há um jeito certo ou errado de se ter dezesseis anos e estar apaixonado por alguém.

Meu corpo é um templo, não é qualquer pessoa que pode reverenciá-lo. Não vou fazer nada além do que eu queira fazer.

P.S.: Ainda amo você |ADAPTAÇÃO BABITAN|Where stories live. Discover now