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NA NOITE DE domingo, faço ondas no cabelo. Ondular o cabelo é um ato intrínseco de reflexão. Gosto de fazer as ondulações à noite e pensar nas coisas que podem acontecer amanhã. Além do mais, costuma ficar bem melhor depois de uma noite de sono, não tão armado. Estou com metade do cabelo preso e quase acabei um lado quando Miih entra pela minha janela.

— Eu devia estar de castigo agora, então tenho que esperar minha mãe dormir antes de ir para casa — explica ela, tirando a jaqueta de couro. — Você ainda está deprimida por causa da Passos?

Enrolo outra mecha de cabelo no aparelho.

— Estou. Não se passaram nem quarenta e oito horas.

Miih passa o braço pelos meus ombros.

— Odeio falar isso, mas esse namoro estava destinado ao desastre desde o começo.

Lanço um olhar chateado para ela.

— Muito obrigada.

— Ah, é verdade. O jeito como vocês ficaram juntas foi estranho, depois teve a coisa toda do vídeo do ofurô. — Ela pega o babyliss da minha mão e começa a fazer ondulações no próprio cabelo. — Mas preciso dizer que acho que foi bom pra você passar por tudo isso. Você se protegia demais, querida. Você pode ser muito crítica.

Pego o babyliss da mão dela e finjo que vou bater na cabeça de Miih com ele.

— Você veio me alegrar ou enunciar meus defeitos?

— Desculpa! Só estou dizendo. — Ela me oferece um sorriso alegre. — Não fique triste por muito tempo. Não é seu estilo. Existem outras gostosas além da Passos. Gostosas que não são sobra da minha prima. Tem gostosos também, como o Bak McClaren. Ele é gato. Eu iria atrás dele, se ele não estivesse a fim de você.

— Não consigo pensar em mais ninguém agora — digo, com delicadeza. — Bárbara e eu acabamos de terminar.

— Você e Gabriel têm química. Vi com meus próprios olhos na festa da cápsula do tempo. Ele está interessado. — Ela bate com o ombro no meu. — Você gostava dele antes. Talvez ainda haja alguma coisa aí.

Eu a ignoro e continuo a fazer ondas no cabelo, uma mecha de cada vez.

* * *

Bárbara ainda se senta à minha frente na aula de química. Eu não sabia que dava para sentir ainda mais saudade de alguém quando a pessoa está a poucos passos de distância. Talvez seja porque ela não olhou para mim, nem uma vez. Eu não entendia totalmente como ela tinha se tornado parte importante da minha vida. Ela se tornou tão... familiar para mim. E agora, sumiu. Não sumiu, ainda está presente, só não está disponível para mim, o que talvez seja pior. Por um minuto, foi muito bom. Foi muito bom mesmo. Não foi bom? Talvez as coisas muito, muito boas não sejam feitas para durar tanto tempo; talvez seja o que as torna mais doces, o fato de serem temporárias. Talvez eu só esteja tentando me sentir melhor. Está funcionando, um pouco. Um pouco basta, por ora.

Depois que a aula acaba, Bárbara fica um tempo na carteira, depois se vira e diz: — Oi.

Meu coração pula.

— Oi.

Tenho um pensamento repentino e louco de que, se ela me quiser de volta, vou dizer sim. Vou esquecer o orgulho, esquecer Heloísa, esquecer tudo.

— Eu quero meu colar de volta — diz ela. — Obviamente.

Meus dedos tocam o pingente de coração pendurado em meu pescoço. Eu queria tirar de manhã, mas não consegui. Agora tenho que devolver? Stormy tem uma caixa cheia de lembranças e presentes de antigos namorados. Eu não achava que teria que devolver a única coisa que alguém tinha me dado. Mas foi caro, e Bárbara é prática. Ela pode pegar o dinheiro de volta e a mãe pode revendê-lo.

— Claro — digo, mexendo no fecho.

— Não quis dizer que você tinha que devolver neste segundo — diz ela, e minha mão para.

Talvez ela deixe que eu fique com o colar por mais um tempo, talvez até para sempre.

— Mas eu o quero de volta.

Não consigo abrir o fecho, está demorando uma eternidade e é excruciante, porque Bárbara fica ali de pé. Por fim, ela vai para trás de mim e afasta meu cabelo. Pode ser minha imaginação, mas acho que posso ouvir o coração dela batendo. O dela está batendo, e o meu parece que está se partindo.

P.S.: Ainda amo você |ADAPTAÇÃO BABITAN|Where stories live. Discover now