Capítulo 10

191 24 1
                                    

Esse capítulo faz menção a temas delicados. A intenção nunca será de "romantizar" qualquer assunto ou minimizar responsabilidades.

Lembrando: em caso de abuso de qualquer tipo, denuncie. Busque uma rede de apoio segura.

🍀


Encaro assustado a garota. O tempo parece congelar enquanto eu repasso em minha mente as palavras maduras demais para uma criança. Ela tem o que? Uns 9 anos? Ela usa firmemente as palavras machucar (e isso me faz pensar que ela não sabe que na verdade o homem está morto), e abusar. E essa última faz meu corpo tremer.

- Amor, se acalme certo? - a voz doce de Johannah é direcionada a menina. - Você não precisa falar disso.

Estou me perdendo na estória. Não sei mais do que sei ou não. Não sei nem se posso continuar nesse caso. O caso de Louis é simples. Ele vai ser condenado e eu só vou tentar fazer com que ele não pegue pena máxima. Mas uns dez anos ele pega fácil. No mínimo. Mas olhando essa garotinha, eu já não sei mais.

- Você gosta de gatos? – Pergunto para menina sem saber ao certo o que estou fazendo. Mas eu preciso ter essa conversa com Johannah e não acho que deva ser na frente da garota. Ela assente confusa. - Eu tenho um. Ele se chama Ares e está dormindo lá na cozinha. Você poderia ir alimentá-lo para mim? O pote fica debaixo da pia.

Tento parecer o mais suave possível. Mas a garota franze a testa ao me encarar, por um instante, vejo perfeitamente a semelhança entre ela e Louis. A expressão de raiva dela é idêntica a dele. A conclusão de que ela de fato é filha de Louis faz meu estômago se desfazer dentro de mim.

- Você adultos sempre acham que as crianças não podem ouvir as conversas de vocês. - Ela diz firme. - Mas percebendo que você é um péssimo advogado,  imagino que também seja um péssimo dono de gatos. Então eu vou lá ver se ele ainda está vivo. - ela se levanta e caminha até a porta que eu indiquei ser a cozinha. Eu deveria estar ofendido com as palavras da menina, mas pelo contrário, a petulância dela me faz querer sorrir. Mas me controlo.  E quando ela sai, me volto para Johanna.

-Ela é mesmo.... filha do Louis?  - engulo em seco por minha pergunta.

-Sim. Isabella. Ela tem dez anos. Louis criou ela sozinho. - A mulher abaixa o rosto e eu faço rapidamente as contas em minha cabeça. - quer dizer, nós sempre ajudamos e teve o Adam, que eu espero que esteja queimando no inferno.

Ok. Agora eu tenho que confessar que estou curioso para saber melhor o que realmente aconteceu.

Quando faz menção de continuar, Johannah é interrompida por Isabella. Que surge novamente na sala com meu gato, Ares, no colo, o que me surpreende, já que o felino nunca deixa ninguém se aproximar a não ser Zayn. Ele é quase um demônio em forma de gato.

- O Adam abusou de mim e meu pai matou ele. Não tem nada de difícil para entender Harry.  Você que é meio burro.  - A menina diz direto. Sem rodeios. E caminha, se sentando no sofá com meu gato no colo.

Esse seria mais um momento que eu riria do jeito espontâneo da garotinha, se sua fala não tivesse sido como um soco em meu estômago e eu não consigo respirar por alguns segundos. Posso perceber por suas palavras que ela teve um amadurecimento a frente da sua idade.

Permaneço encarando a menina, que agora está de cabeça baixa acariciando meu gato, vejo uma lágrima cair de seu rosto em cima de Ares e eu já não sei se consigo continuar essa conversa, quando Johannah segura a mão de Isabella,  como se a dissesse que não está sozinha. A garota respira fundo antes de falar. Eu não movo meus lábios, não tem nenhuma palavra passando por minha mente agora.

- Naquele dia, meu pai teve que trabalhar até mais tarde, ele avisou a Lisa, a moça que fica comigo, e pediu para ela esperar por ele, mas quando Adam chegou, ele insistiu com ela que estava tudo bem, que ele poderia ir embora. - Isabella conta com soluços e lágrimas escorrendo. Eu juro que quero pedir para ela parar, que não precisa falar sobre isso, mas minha boca não me obedece e não solta nenhum ruído. - Eu corri para meu quarto e fiquei lá, torcendo para o papai chegar logo. Mas aí, depois de um tempo, o Adam entrou no meu quarto e começou a falar coisas....

- Você não precisa amor. - Johanna interrompeu quando o choro da menina aumentou. Mas Isabella apenas respirou fundo indicando que iria continuar.

- É pelo papai vó. - Ela olha para a avó que seca um pouco de suas lágrimas. - Ele começou a dizer aquelas coisas, e eu pedi para ele sair, mas ele disse que eu deveria ficar quieta para não ser pior. Aí ele me segurou e .... ele tirou... tirou minha roupa...

- Bela, não.  - A avó interrompeu novamente. Com uma voz calma.

- Aí, eu ouvi a porta abrindo e a voz do meu pai me chamando, e Adam se apavorou e começou a colocar a calça dele de volta. – A menina chora ao dizer, e eu posso estar chorando junto, não sei. Sinto nojo de pensar nessa parte da estória que ela pulou, indo direto para quando Louis chega em casa. - Eu gritei, gritei socorro e aí, tudo foi muito rápido. Meu pai abriu a porta de uma vez e quando ele olhou para mim e para o Adam, ele só segurou o Adam pela camiseta e levou ele para o quarto deles. Eu comecei a ouvir gritos e barulhos e só me escondi em baixo das cobertas. Com medo. - O choro de Isabella é agoniado. Eu sento vontade de arrancar minha própria pele de ouvi-la contando essa história. – Depois de um tempo meu pai voltou, ele me ajudou a me vestir, ele estava todo sujo de sangue e até sujou meu pijama, aí ele ligou para Vovó me buscar.

Isabella desabou de uma vez no choro, no colo de sua avó. Deixando meu gato sair de seus braços. 
Sinto o impulso de amparar a garotinha, acolher seu choro em meus braços. No entanto não é difícil me conter quando meus músculos estão paralisados e eu estou horrorizado.

- Eu cheguei lá e me deparei com a cena - Johanna continuou a históriada neta. - Eu já vi meu filho chorar muitas vezes Harry, a vida nunca foi muito generosa com meu menino, mas naquele dia, eu vi meu filho destruído. Eu vi nos olhos dele. Eu vi quando ele colocou Bella em meus braços, e disse a ela para me contar o que havia acontecido. - A mulher respirou fundo, derrotada. - Ele deu um beijo nela, e depois um em mim, e disse que sentia muito. Ele pediu desculpas pra Bella e para mim, e eu me esqueci de perguntar sobre o sangue em suas mãos quando Isabella começou a chorar desesperada em meu colo. Então eu só levei ela para minha casa como meu filho me pediu. Nós partimos para Doncaster naquela mesma noite e ficamos em uma casa de campo lá desde então. Eu senti naquele beijo que Louis me deu que ele estava se despedindo, mas eu não consigo seguir sem saber do meu menino. Eu preciso ver meu filho.

Confiar de novoOnde histórias criam vida. Descubra agora