Capítulo 38

19 2 0
                                    

Eu estava sozinha no ringue de treino me aquecendo. Às vezes Adam e Bran lutavam comigo, me ajudando a melhorar as minhas habilidades. Já que nenhum dos mortais tinham interesse em mim
Parei de socar um saco de luta e olhei para os lados analisando.
Para eles.
Mesmo não chegando perto de mim. Eles ainda continuavam me julgando de longe. De marcação. Os cochichos sussurrados aos ouvidos, acompanhados de olhares tortos. Às vezes me encaravam descaradamente sem fingir.
Então rapidamente, eles desviaram os olhos.

— Não ligue para eles. As pessoas temem o... desconhecido.
Kay me alertou chegando sem eu ver, roubando minha atenção de todo o resto. Era a primeira vez que ele se dirigia a mim, depois da minha briga com Kenae. Sua voz incrivelmente baixa. Eles não estavam desviando os olhos de mim.
Estavam desviando os olhos dele.
Kay emanava autoridade por onde quer que andava, ou causava medo. Eu havia percebido que ele era uma pessoa realmente mais seria, na verdade mais recluso e calado. Uma pessoa de pouca interação. E havia as raras exceções, que ele guardava os poucos sorrisos, e a animação vibrante dentro dele, para as duas pessoas que cuidavam da sua segurança.
E estranhamente, para mim.
Mas isso já faz muito tempo.

Para todos os outros, ele era um ser do antigo mundo. O guardião do fogo. A besta vermelha. Kay Won o Pilar carmesim da criação. E para todos os lugares que ia, seja em pequenas vilas ou grandes cidades as pessoas o veneravam.
Kay na visão do povo só estava abaixo do Rei.
O povo o amava.
Não porque ele era o príncipe deles, antigo futuro rei. O povo amava ele de verdade. Um carinho que poucos líderes tem dos seus súditos. Para toda Corte de Fogo e Cinzas, ele era um símbolo de força e poder.
Um símbolo de que o território estava vivo e de pé.

E por onde ele passava as pessoas se curvavam. Olhos se enchiam de lagrimas em agradecimentos chorosos, por ele estar constantemente cuidando deles. Protegendo seus lares nos limites do território. As pessoas proferiam bênçãos, de boa sorte e saúde. Ele conhecia muitos dos líderes e anciãos das aldeias pelo nome, e fala com eles. Eles ofereciam alimentos e o convidavam para comer com eles.
Kay não podia se aproximar, mas, aceitava a comida. Comia na frente deles sem medo de ser envenenado. Ou que eles lhe fizessem algum mal.
Kay Won amava intensamente todo o seu povo, e o seu povo admirava ele com total devoção. As criancinhas o admiravam, ele tinha um certo jeito para lidar com elas, como se soubesse exatamente o que estava fazendo com uma criança. Quando via as crianças, que mais pareciam saquinhos de ossos perambulantes. Eu via em suas feições a dor, e o desejo profundo de abraça-las, de ajuda-las.

Certa vez em um pequeno povoado, em uma aldeia distante quase próxima ao litoral, repleta de casa maltrapilhas caindo aos pedaços, totalmente afetadas pelo salíto, um solo salgado demais para qualquer coisa florescer.
Flagrei Adam, saindo de dentro da casa mais afastada da aldeia. A casa da anciã e líder do povo, de fininho...
Caminhei sorrateiramente até a lateral da casa e esperei.
Um minuto depois, Adam saia de dentro do lugar, de costas, o tecido da aba da casa se arrastando, e revelando seus ombros largos. Em suas mãos, não, aconchegado aos seus braços como um bebê, estava aquele baú estranho de Kay.

E Adam tirava dali pequenos saquinhos de coisas que tilintavam, enquanto se virava para partir, na pontinha dos pés.
— Pronto. — Disse ele aos sussurros, em tom de conflagração. — Acho que essa quantia vai ser o suficiente para eles passarem o verão.
— Adam, o que você estava fazendo aí dentro? — Perguntei.
Ele pulou como um gato assustado, apertando o baú contra o peito, como se de fato estivesse fazendo algo escondido.
E ele estava.
— Aí. Que susto... você quase que me mata de susto! — Me acusou.
Ele apertou as mãos, estremecendo, e a moedas dentro dos saquinhos chacoalharam.
Arqueei uma sobrancelha.

— Alguém sabe disso? — Claramente o que ele estava fazendo era ilegal. Todo dinheiro recebido, deveria ter o imposto arrecadado. Para ajudar na estabilidade da Corte.
Ele me encarou na defensiva.
— O que você quer que ele faça? Que deixe as pessoas morrerem de fome? Elas nem tem forças para trabalhar.
Ele? Ele quem?
Kay...
Kay estava totalmente envolvido nisso, enterrado na coisa até o pescoço. Estava tirando dinheiro de os deuses sabe onde para dar ao seu povo o que comer. Mas seu avô havia diminuído os suprimentos da unidade, ele também não poderia nos ceder esse dinheiro?
Seu peito começou a subir e a descer de nervoso. Estava nervoso. Adam estava nervoso? Por que?

O Festim dos OssosOnde histórias criam vida. Descubra agora