Capítulo 37

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Seraffine
 
Eu não escutava nada de um ouvido, fiz menção de mexer a boca e o lábio partido doeu. As costelas doíam. A covarde da Kenae só batia nas costelas. Mexo o ombro e os braços doem, meus deuses eu estava completamente destruída.
De novo.
Isso havia virado um hábito pelo visto.
Abro os olhos anuviados pelos remédios, e vejo as manchas roxas espalhadas pelas brechas dos meus braços enfaixados. Mas o sorriso que se instala no meu rosto, é o mais satisfeito que já dei.
— Rum...

Ouço um resmungo e um som de fogo, cicia no espaço.
Meu rosto vira automaticamente indo de encontro a voz, e imediatamente odeio a reação imediata do meu corpo. Como se meu corpo reconhecesse a voz dele a quilômetros. Kay... está sentado em uma cadeira ao meu lado direito, estreito os olhos embaçados tentando foca-lo.
Ele abaixa a cabeça de novo, e tento processar o que ele está fazendo na minha tenda.
Tento me mover na cama, e ele resmunga de novo, e sibila um:
— Pare...
Mas eu o ignoro, revivo a cena de mim, destruindo Kenae e não consigo não sorrir.
Ele ergue o rosto de novo, e fala devagar.

— Você está muito feliz para quem teve uma costela quebrada.
 Está com a perna direita cruzada e com o tornozelo em cima do joelho, escrevendo em um caderno com capa de ferro. Desenhando. Ele está desenhando? Estico devagar o pescoço para ver o que, e ele esconde o objeto de mim. Mexendo a caneta de ferro, gesticulando um não.
— Coisinha curiosa...

A voz ecoa de novo, grave, mansa, acalmando em ondas cada ponto de dor em mim, um anestésico vivo. Droga. Eu odeio ele, haja como alguém que o odeia pelo que ele está fazendo Seraffine.
Mas ainda continuo com o pescoço virado.

Estou encarando. Com certeza estou encarando ele não estou? Ele repuxa de leve o canto da boca, estreitando os olhos. Um projeto mal feito e feio de sorriso. Sério demais, sem graça demais. Está tudo errado. Continuo encarando porque ele desvia os olhos, mas vejo que as olheiras fundas haviam quase sumido agora.
Me lembro de que não estamos nos falando.

— Agora você fala comigo?
Ele fica em silêncio por um tempo e por fim, desvia do assunto.
— Seu bichinho de estimação toda hora vem aqui te ver. — Diz ele com ironia. Bufei dando uma risada, e uma corrente de dor, percorreu meu corpo.
— Bran já voltou?
— Ele voltou ontem. Mas já teve que sair de novo. — Constatou Kay.

Bran havia partido mais uma vez logo após o incidente dos ominuns para a fronteira.
— Esse menino tem sérios problemas com ansiedade. — Falei franzindo a testa.
— Ele gosta de você.
— Eu sei. Mas ele não para de falar nunca. É cansativo.
— O que você esperava? É a sombra de Adam.
Risos difíceis saíram de dentro de mim e reviro os olhos. Sinto os olhos de Kay por baixo dos cílios fixos no meu rosto, então se desviar para o caderno de novo.
— Você ficou apagada por dois dias inteiros e perdeu seu primeiro combate na unidade.
— Droga. Eu estava ansiosa para isso.

— Pois é, eu e Adam fizemos até uma coreografia de boas-vindas para você. — Debochou ele ainda sério.
— Com roupa a caráter e tudo?
— Sim, tinham até babados.
— O que eu perdi? — Perguntei com cautela.
— O de sempre. Bestas raivosas e ansiosas por uma refeição com um coração pulsante, e toda baboseira de morte e destruição.
Ele gesticulou com a mão.
Bufei irritada.

E ele continuou:
— Não teve nada demais, apenas alguns pequenos bandos, Adam e alguns arqueiros deram conta de tudo.
Engoli em seco, me lembrando do motivo, de estar desse jeito.
— E... — Olhei para os olhos dele, que me encaravam. — Kenae, como ela está?
— Adam a levou para a enfermaria deixando aos cuidados das amigas, ela acordou três horas depois. É dura na queda. Se não fosse assim não seria a terceira na hierarquia da minha unidade.
Já era de se esperar.
Me virei para frente e suspirei.

O Festim dos OssosOnde histórias criam vida. Descubra agora