𝚃𝙷𝙴 𝙰𝙱𝚂𝙾𝙻𝚄𝚃𝙴

Tempestade

Enquanto contava tudo que acontecia, sentia o olhar de Lance sobre mim. Com o tumulto, não havia percebido os arranhões superficiais em seu rosto, sequer percebi a tempestade que estava fora do quarto. Os raios e trovões silenciaram-se apenas para ouvir nossa conversa, o mundo ficou mudo apenas para prestar a atenção em nós.

— Seus dias foram melhores do que o meu, Náiade — sorriu. — Sem sombra de dúvidas!

— O que aconteceu em seu rosto?

— Phobos passou por alguns galhos que não pude desviar — explicou-se. — Quando notei que era uma armadilha, vim o mais rápido que pude e isso me rendeu alguns arranhões.

Com um toque suave, percorri meus dedos sobre os arranhões no rosto de Lance. Seu olhar encontrou o meu, e por um momento, o silêncio entre nós falou volumes. A tempestade lá fora ecoava a intensidade que se desenrolava no quarto.

— Lance, você deveria ter mais cuidado — murmurei, meu coração batendo um pouco mais rápido pela preocupação.

Ele segurou minha mão, trazendo-a aos seus lábios para depositar um beijo gentil. A suavidade de seu toque era como um bálsamo para os arranhões e também para minha alma.

— Não se preocupe, Náiade. Sobrevivi a muitas coisas e cogito sobreviver a muito mais, especialmente se tiver você ao meu lado — ele sussurrou com um sorriso, seus olhos refletindo um brilho reconfortante.

O trovão ecoou distante, e uma rajada de vento fez as janelas tremerem. Um relâmpago iluminou brevemente o quarto, revelando a expressão nervosa em meu rosto.

— Não precisa ter medo, Náiade. Estamos seguros aqui — Lance tentou me tranquilizar.

Mas a cada trovão, minha inquietação crescia. Lance percebeu meu nervosismo e, em vez de me puxar para mais perto, ele afastou as cortinas para revelar a tempestade lá fora.

— Olhe, Náiade. Às vezes, enfrentar nossos medos nos faz perceber que não são tão assustadores quanto pensávamos — ele apontou para a chuva que caía, como se fosse uma dança caótica e bela.

Engoli em seco, tentando sobrepor o som do trovão com a batida mais calma do meu coração. Lance permaneceu ao meu lado, uma âncora silenciosa na tempestade.

— É só uma tempestade, Náiade. E como todas as tempestades, vai passar — ele sussurrou, seus braços envolvendo delicadamente meus ombros.

Ali, mesmo com o rugir da tempestade, encontrei um tipo diferente de abrigo nos braços de Lance. Ele me ajudava a enfrentar não apenas a tormenta lá fora, mas também os redemoinhos de medo que se agitavam dentro de mim. 

— Lance — o chamei. 

— Sim, Náiade? 

— Eu... — me virei para ele. — Quando disse que tudo aqui pertence a mim, como sua alma... Falou a verdade? 

— Não tenho motivos para mentir para a senhorita. 

Meu peito se aqueceu. 

— Quero me casar com o senhor, estou pronta para isso e com essa ameaça do negociante, receio que não podemos perder tanto tempo... 

Lance olhou fixamente para mim por um momento, seus olhos castanhos refletindo a seriedade da situação. Então, ele sorriu gentilmente e segurou minhas mãos com firmeza.

— Selene, tem certeza do que quer? Eu também quero mais do que tudo estar ao seu lado para sempre. Essas palavras que disse são verdadeiras. Eu lhe dou não apenas minha alma, mas meu coração inteiro. Mas, não quero que faça algo que se arrependa. Eu a amo, mais que tudo que já amei nesse mundo e vou te proteger, estando casada comigo ou não. Não precisa se casar comigo por conta desse detalhe. 

Eu senti um alívio profundo e uma alegria indescritível ao ouvir suas palavras. Lance era meu porto seguro, minha âncora em meio à tempestade. O mesmo segurou meu rosto. 

— Tenho certeza, Lance. 

Seu sorriso duplicou de tamanho, conforme ouviu minhas palavras. Me abraçou forte. 

— Amanhã darei a notícia ao pessoal do casarão e vamos a alta sociedade, ainda há coisas que um homem não possui a capacidade e olhar para fazer, então terei que pedir auxílio a uma velha amiga. 

  Beijou minha testa, por longos segundos, me deu boa noite e saiu do quarto. Radiante. 

Me joguei na cama, ainda abobada com os acontecimentos. Pela primeira vez irei me casar com um homem bom, pela primeira vez, minha vida melhorava e caminhava pelo rumo correto.