Estou numa rua escura, chove dramática e incessantemente, então um poste se ilumina e debaixo dele eu vejo o Humberto.
— Bebeto!
Corro até ele, mas o mesmo desaparece e aparece debaixo do poste mais à frente.
— Vem comigo. — ele diz com um sorriso largo e bonito.
Vou seguindo ele, e todos os postes se iluminam no caminho dele.
— Vem, Daniel.
Chegamos na esquina e tudo muda, agora estamos num campo minado.
— Cuidado! — o aviso, mas é tarde demais, ele pisa numa mina. — NÃO!
Acordo assustado chorando.
— Daniel, você tá bem?
— T-Tô, sim, mãe.
Vou pro banheiro e lavo o rosto, então deito de novo e fico um tempo olhando pro nada. Nem percebi quando dormir, só fui ver quando acordei de novo de manhã.
— Isso dói tanto, meu Deus... — meus olhos se enchem de água.
Levanto, tomo banho e desço pra encontrar meus pais.
— Mãe, pai, me conta como vocês se conheceram de novo. Eu quero ouvir uma história de amor...
Eles sorriem pra mim.
— Claro.
Sento com eles.
— Bem... — minha mãe começa. — Tudo começou em 1990, quando eu fiz um intercâmbio em Berlim depois que o muro caiu.
— Eu tinha 22 anos e esbarrei numa linda moça no campus da faculdade. — continua o meu pai.
— Quando esbarrei no seu pai, a gente engatou numa conversa.
— Isso excluindo o fato da gente ter se apaixonado desde o primeiro olhar.
Dou um sorriso pequeno.
— A gente começou a conversar toda hora, ficamos muito próximos. — continua mamãe.
— Depois de um tempo resolvemos namorar e tudo deu certo. Eu me formei, ela se formou, a gente casou e depois tivemos você em 93.
Eu nasci em Berlim, então com pouco menos de dois anos nós viemos morar em Santa Catarina, terra da minha mãe.
— Por que isso não pôde acontecer comigo, hein?
As lágrimas descem e eu fungo, colocando as mãos na cabeça.
— Eu ia pedir o Humberto em casamento agora em janeiro.
Soluço.
— Eu queria criar o Pedrinho com ele.
Meus pais me abraçam.
— Infelizmente, meine liebe, existem essas pessoas que abominam o relacionamento amoroso entre dois homens. — diz meu pai. — Elas se sentem incomodadas e não aguentam ver a felicidade alheia.
— Quando os policias vieram pegar o meu depoimento, eu nem precisei fazer um retrato falado, parece que aquele grupinho é famoso da região.
— Infelizmente. — diz minha mãe.
[...]
Passei a semana toda no meu quarto, no escuro, olhando fotos do Bebeto e lembrando de tudo que vivi com ele. Chorar foi inevitável com essa sessão de nostalgia, saudade e tristeza. E eu não estou comendo muito também, nada parece descer.
No final da semana a polícia localizou e prendeu os responsáveis pela morte do Humberto, o que me deu um pouco de paz, mas bem pouquinho.
— Acho que vou voltar pra minha casa na segunda.
— Não!
— Daniel, fica mais um pouco.
— O que foi?
— Se você for pra casa, eu vou ficar preocupada. E se você fizer uma besteira?
— Não, eu não vou.
— Como você pode prever?
— Tá bom, eu fico.
[...]
Na segunda eu juntei forças e voltei pro meu emprego, sendo recebido com abraços pelos meus colegas de trabalho. A jornada de trabalho foi boa na medida do possível, eu fiquei muito desanimado, triste e quase chorei algumas vezes.
Consegui me controlar, mas sinceramente, eu não sei até quando.
Continua...
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Perdido (Romance Gay)
RomanceDaniel é um jovem metade brasileiro e metade alemão, o mesmo perde o namorado num ato de violência na virada do ano e vai tentar a vida na Europa. Será que ele encontrará o amor novamente?