Enquanto acompanhava o capitão em uma curta caminhada pelo navio, me preguntava o que se passava na mente dele naquele momento. Ele continuava com uma expressão séria e mesmo sem saber o motivo, temia por qual seria o assunto em questão.
Mesmo depois que chegamos ao convés principal e paramos em um dos lados do navio, o silêncio se manteve presente entre nós. Alguns marujos cumpriam suas tarefas por ali, mas não perto o bastante para nos ouvir.
— E então? — o capitão começou chamando minha atenção para si — Vai me dizer porque está fugindo do Duque?
Engoli em seco diante de sua pergunta direta. Eu sabia que uma hora ou outra ele descobriria a verdade, mas ainda assim não me sentia preparada para isso.
Permaneci em silêncio, pensando em alguma desculpa que me ajudasse a fugir daquela conversa, mas nada me veio à mente. Olhei para o homem ao meu lado, que me encarava de forma imperturbável e decidi o que iria fazer.
— Não tenho nenhuma obrigação de dizer isso a você — cruzei os braços na frente do corpo e ergui a cabeça tentando soar o mais firme possível.
— Sabe, estão oferecendo uma boa recompensa por você — disse sem tirar seus olhos dos meus — Talvez eu devesse levá-la até ele...
— Faria mesmo isso?! — exclamei indignada com sua ameaça e sentindo a raiva tomar conta de mim — Você tem mentido para mim durante todo esse tempo, então por que deveria te contar alguma coisa?
Percebi seus ombros tensos e parecendo pensar por alguns instantes, suspirou e deu um passo à frente.
— Muito bem então. Façamos o seguinte acordo: a partir de agora seremos totalmente sinceros um com o outro — estendeu uma mão em minha direção.
Olhei para seu rosto com desconfiança, tentando encontrar qualquer sinal de que aquilo não passava de um truque.
— Como posso ter certeza de que não está me enganando de novo? — questionei fazendo-o abaixar a mão e cruzar os braços.
— Está certa. Então vou começar dizendo o porquê de você estar aqui — um sorriso satisfeito se abriu em seu rosto ao notar que conseguira chamar minha atenção — Vou resumir as partes mais importantes.
Ele se inclinou sobre a estrutura ao lado e olhou para o mar azul.
— O Duque Reeves, seu noivo, é um velho conhecido meu... — disse e fez uma pausa, provavelmente pensando em suas próximas palavras — Acontece que ele fez algo que me prejudicou no passado, de propósito, e desde então estou buscando uma oportunidade para me vingar dele.
Acreditei em suas palavras, levando em conta os muitos boatos que ouvi sobre a maldade do Duque para com os outros. Ainda assim, algo me incomodou na forma como ele dissera isso, como uma ira contida.
— A vingança não é o melhor caminho a ser seguido — aconselhei na tentativa de abrir os olhos dele para a verdade — Ela só vai te dar uma falsa sensação de realização, mas quando isso passar... você se sentirá novamente vazio.
— Não tente me persuadir de uma decisão que tomei há muito tempo e pela qual vivi incessantemente! — ele me encarou com olhos afiados, sua respiração oscilando por conta de sua agitação repentina.
— Então me conte... — com um gesto ousado, me aproximei dele e coloquei minha mão sobre a sua.
Ele fitou nossas mãos juntas e ergueu o rosto para olhar para mim, parecia estar travando uma luta dentro de si para saber o que fazer, se confiava em mim ou não.
— Isso não é importante — murmurou se afastando de mim e voltando a olhar para o mar — Você só está aqui porque é a noiva dele, queria trazê-lo até o mar para que finalmente pudesse enfrentá-lo. Você é apenas a isca que estou usando para atraí-lo até aqui. Só isso.
Dois sentimentos diferentes se conflitavam dentro de mim depois de ouvir isso. O primeiro me fazia ficar triste por estar sendo vista apenas como um meio para um fim. Mas o outro insistia fortemente que o que ele dizia não era de todo verdade. E foi nesse último que escolhi me apoiar.
— Eu não acredito nisso, capitão — afirmei chamando sua atenção para mim — Você pode estar querendo parecer um cara mau, mas eu sei que você tem um bom coração.
— E o que te faz ter tanta certeza disso? — sorriu com desdém, mas não deixei que isso abalasse minhas convicções.
— Você prometeu que me levaria até a cidade que pretendo ir e até agora tem me protegido e me mantido segura — Também sorri mostrando confiança em meu argumento.
— Isso não garante nada. Posso estar mentindo de novo para você...
— Você está?
O sorriso sumiu de seu rosto e ele nada disse. Comemorei por dentro pela minha pequena vitória em deixá-lo sem palavras, pela primeira vez desde que o conhecera.
— É a sua vez de falar — mudou de assunto sem encarar meu rosto.
Voltei meu olhar para o mar também e hesitei por alguns segundos antes de dizer alguma coisa. Precisava pensar muito bem no que iria revelar e se podia realmente confiar nele. Novamente, escolhi seguir aquele que parecia ser o meu segundo sentido e decidi contar a verdade.
— Eu morava com meu pai em uma pequena casa longe do porto, ele tinha uma sapataria e eu o ajudava no que pudesse — comecei mesmo sabendo que aquela informação não era tão relevante para ele — O Duque era um homem conhecido por todos na cidade. Alguns o viam como um homem rico e de boa influência, mas outros, assim como eu, sabiam de sua má fama por ser um homem cruel e egoísta.
Engoli em seco sabendo que a pior parte ainda viria.
— Já o tinha visto algumas vezes nas ruas da cidade, mas só estive realmente perto dele quando ele foi até a minha casa — olhei para o capitão com um fraco sorriso — Ele queria casar comigo.
— E você aceitou, certo? — Jack me encarava atentamente, prestando total atenção em todas as minhas palavras.
— Como eu poderia? Eu nunca me casaria com alguém como ele — balancei a cabeça com veemência, como se aquilo fosse um absurdo — Eu disse não.
— E ele reagiu bem a isso?
— Claro que não — soltei um suspiro lembrando nitidamente daquele frustrante dia — Ele disse que nos daria alguns dias para tomar uma decisão e que conseguia tudo que queria. Quando o prazo acabou, ele veio novamente tentar me convencer, mas não cedi e ele saiu revoltado. Depois disso, meu pai adoeceu...
Meu coração apertou ao lembrar da angústia que senti. Minha garganta se fechou por alguns instantes, mas me forcei a continuar.
— Fiz tudo o que podia para fazê-lo melhorar, mas ainda assim... — mordi o lábio inferior tentando prender as lágrimas que ameaçavam descer — Não consegui salvá-lo... — olhei para meus pés, em busca de forças para terminar meu relato — Um dia depois, Conrad veio novamente me procurar só para dizer que meu pai tinha uma dívida no banco e que minha casa era a garantia oferecida à ele, e agora ela pertencia ao duque. Sem saber mais o que fazer, aceitei seu pedido de casamento, só para ganhar tempo e fugir dele. E assim eu cheguei aqui.
Respirei fundo me acalmando lentamente. Um silêncio necessário perdurou entre nós por mais alguns minutos. Me senti aliviada por poder desabafar com alguém sobre os meus problemas, mesmo que isso não fosse resolvê-los.
— Escute, Flora — Jack se virou completamente em minha direção e segurou meu rosto virando-o para encará-lo — Eu falei sério quando disse que irei levá-la até onde deseja ir. Você tem minha palavra de que ele nunca encostará um dedo em você enquanto estiver comigo, juro pela minha vida.
Seu olhar ardia em determinação e mesmo que ele não pudesse cumprir as suas palavras, eu acreditei em cada uma delas, de todo o meu coração.
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Flora Harper E O Navio Pirata - Amor Em Alto-Mar
RomanceSinopse: Flora Harper, uma garota cristã e gentil, vive em uma cidade portuária com o pai, dono de uma pequena e singela sapataria. Até que um dia, após a repentina morte de seu pai, ela se vê obrigada a se casar com um homem cruel a quem não ama e...