Matteo
Tentamos ao máximo fazer com que a notícia não se espalhasse para não prejudicar ainda mais Eveline, mas tive que contar a verdade ao lorde e a lady Hudson, para que entendessem porque ela não havia aparecido para trabalhar no dia seguinte. Por sorte, Peter Floyd, que foi quem conseguiu separar a briga, confirmou tudo que contei a eles.
Não ter impedido Eveline de ir embora era uma decisão que me atormentava e tranquilizava ao mesmo tempo, sabia que ela precisaria de um tempo para si depois de tudo que aconteceu, mas ainda assim havia em mim um sentimento egoísta que gostaria que ela tivesse ficado em casa.
Sendo sincero, eu não dormia direito há algumas noites, pois todas as vezes em que fechava meus olhos a imagem de minha esposa sobre o chão tentando se afastar daquele homem asqueroso vinha a minha mente. Se eu estou desse jeito, ela deve estar ainda pior.
— Matteo, cuidado! — o alerta da senhora Morris não foi rápido o suficiente e acabei derramando mais café do que deveria na xícara, fazendo o líquido deslizar pelo balcão de madeira clara.
Ela tirou o bule de minhas mãos enquanto eu tentava, sem muito exito, voltar aos eixos. Sob o olhar acusatório da governanta, limpei a bagunça antes que piorasse e desisti da ideia de tomar café, então apenas sentei-me novamente e esperei até que meu horário de almoço de acabasse.
— Senhor Castelo, acredito que uma folga lhe cairá bem. — ela falou de repente — Acho que o senhor precisa esfriar um pouco a cabeça diante dos eventos recentes.
— Mas, o lorde Hudson...
— Não se preocupe, explicarei ao visconde, sei que ele entenderá. Agora vá, antes que haja outro acidente com café.
Não é muito comum ver atos de bondade vindos de Philomena, então devo estar realmente em um estado deplorável, por isso, seguindo a ordem disfarçada de conselho que recebi, levantei-me e peguei minhas coisas para ir embora.
A princípio, pensei que seria uma boa ideia ir visitar os meus pais, mas acabei desistindo. Eles não fazem ideia do que aconteceu e eu prefiro que continue assim, pelo menos por agora.
Eu não me sentia pronto para ir para casa, já era ruim demais passar a noite inteira sozinho lá, e perder o resto do dia no vazio do silêncio era uma ideia ainda mais deprimente, então tomei o caminho mais longo para atrasar minha chegada. Caminhei devagar pela estrada coberta de neve, sem saber ao certo aonde estava indo, o que me fez ficar surpreso ao notar que parei em frente ao portão da antiga casa em que trabalhei.
A construção grande continuava praticamente igual, apenas com um ou outro desgaste do tempo. Mesmo sem entrar, poderia facilmente dizer onde ficava cada ambiente dentro daquela propriedade, dos jardins a vista de todos, aos estábulos no fundo, era como ter um vislumbre de um fantasma do passado.
— Mathew? — uma voz familiar chamou-me e voltei a prestar atenção no mundo ao meu redor.
— É Matteo, senhor William. — respondi com um sorriso, sabia que o nome errado era apenas uma brincadeira.
William é o jardineiro da mansão desde... bem, sempre. O conheci logo quando comecei a trabalhar aqui e costumávamos passar bastante tempo juntos, infelizmente perdemos contato quando fui demitido após o acidente.
— Claro, foi exatamente isso que eu disse. — O homem coçou a barba, como se não entendesse minha correção. — Como você está, rapaz? Soube que se casou, é verdade?
— É sim, foi há alguns meses atrás.
O homem deu uma gargalhada grave e alta, antes de pôr a mão meu ombro e apertá-lo gentilmente, como costumava fazer para agradecer quando eu o ajudava em alguma tarefa.
— Fico feliz por você, Mathew. — suas palavras eram sinceras. — Sabe, você me lembra como eu era quando mais novo, mas acho que as coisas deram certo no seu caso.
O encarei em silêncio, mas não consegui entender o que ele queria dizer.
— Do que o senhor está falando?
— Ah, bem... Eu já fui tão apaixonado por alguém como você é por sua senhora, mas ela era uma moça rica e seu pai nunca permitiria que nos casássemos. Eu quis pedir a mão dela várias vezes e não o fiz, agora estou aqui, velho, sozinho e arrependido de não ter feito algo.
— Acha que teria sido mais feliz se as coisas tivessem seguido um rumo diferente?
Seu olhar tornou-se um pouco mais triste, mas William apenas sorriu e assentiu, ele sempre fora um homem de poucas palavras e não mudou isso após tantos anos.
A conversa acabou tomando outro rumo e demorei apenas mais alguns minutos por lá antes de ir para casa, como pretendia desde o início. Porém, na metade do caminho encontrei Josephine. Eu não sabia se Eveline havia contado a verdade às tias, então ver uma delas pareceu mais desconcertante que nunca.
— Como você está, querido?
— Bem. — Forcei um sorriso. Eu apenas não queria que meu estado deplorável chegasse aos ouvidos de minha esposa. — E vocês, como estão?
— Vivendo um dia de cada vez, eu diria... — Eu sabia que aquilo não era sobre ela ou Jennifer. — Bem, preciso ir andando, mas foi bom vê-lo, senhor Castelo.
— Igualmente, senhora.
Mantive-me parado enquanto a observava dar passos lentos pela calçada, até ela parar abruptamente e virar em minha direção.
— Dê tempo ao tempo, Matteo. — Apenas assenti, sem saber ao certo o que poderia responder. — As coisas irão se concertar aos poucos.
Foi a última coisa que ela me disse antes de partir de fato, deixando-me com as suas palavras repetindo pela minha mente.
Dê tempo ao tempo.
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A Bailarina de Neve
RomansaDizem que a primavera é a estação das flores e do amor, mas há quem discorde e veja mais encanto no frio do inverno. Talvez tenha sido esse encanto que uniu Matteo, um jovem valete, e Eveline, uma aspirante a bailarina. Para livrá-la de um problema...