"Como eu ia saber que amar é morrer?Que sensação é essa?"
Tiago
Eu estava na livraria no coração da cidade, um refúgio silencioso em meio ao caos urbano. A fachada da loja, com suas janelas grandes e molduras de madeira desgastadas pelo tempo, escondia um universo de histórias e segredos. O cheiro inconfundível de papel envelhecido e café recém-passado preenchia o ar, criando uma atmosfera acolhedora que convidava à introspecção.As prateleiras altas de madeira escura se estendiam até o teto, repletas de livros de todas as épocas e gêneros, enquanto escadas de rodinhas permitiam alcançar os volumes mais altos e raros. Nas paredes, quadros com capas de livros clássicos e frases inspiradoras de escritores famosos davam um toque de charme ao ambiente.
No canto, um velho piano de cauda preta repousava em silêncio, como se esperando o momento certo para trazer música aos ouvidos atentos. Poltronas de couro desgastado e mesas de café distribuídas estrategicamente ofereciam aos visitantes um lugar para se perder nas páginas de um bom livro ou se deixar levar por conversas sussurradas.
Meus dedos tamborilavam de maneira distraída em um romance esquecido na prateleira, o ritmo irregular batendo como o pulso da cidade ao redor. Foi então que a vi pela primeira vez.
Seus cabelos caíam em ondas suaves sobre os ombros, um véu de mistérios a ser desvendado. Cada mecha parecia capturar a luz suave da livraria, refletindo um brilho dourado que contrastava com o ambiente acolhedor. Seus olhos, de um castanho profundo como o âmbar sob a luz do sol, encontraram os meus por um breve instante, mas foi o suficiente para me deixar com a sensação de uma página virada rápido demais, uma história interrompida antes de começar.
Ela tinha a pele clara, quase translúcida, como se cada toque pudesse revelar os segredos guardados por baixo. Seus lábios, delicadamente desenhados, exibiam um sorriso enigmático, sugerindo uma confiança tranquila e uma curiosidade latente. Vestia um casaco de lã cinza que caía elegantemente sobre seu corpo esguio, e um cachecol de seda vermelha acrescentava um toque de cor e sofisticação ao seu visual.
Enquanto ela se movia, havia uma graça natural em seu andar, como se cada passo fosse uma dança coreografada com precisão. Nossos olhares se cruzaram novamente, e naquele momento, o mundo ao nosso redor pareceu se dissolver, deixando apenas a promessa de uma história por escrever.
— Collen Hoover? — sussurrei, notando o livro em suas mãos.
Ela sorriu gentilmente, seus olhos brilhando com uma curiosidade misteriosa. — É assim que começa, versão limitada — respondeu, antes de voltar a caminhar pela livraria.
Eu senti uma vontade súbita de correr atrás dela, de perguntar quem ela era, de descobrir mais sobre aquela presença intrigante. Mas a timidez me segurou no lugar, como se as palavras que eu queria dizer estivessem presas na minha garganta. Permaneci ali, imóvel, observando-a se afastar entre as estantes repletas de histórias não contadas.
Por um instante, a livraria pareceu mais vazia, mais silenciosa, como se a aura daquela mulher tivesse levado consigo todos os sons e movimentos que antes preenchiam o lugar. Olhei para o livro de romance que ainda segurava, minha mente mergulhada em pensamentos tumultuados.
Eu sabia que aquele encontro não poderia ser simplesmente deixado para trás, como um capítulo inconcluso de um romance inacabado. Decidido, guardei o livro de volta na prateleira, respirei fundo e me lancei em direção à saída da livraria, determinado a encontrar Kate e finalmente desvendar os mistérios que ela guardava consigo.
Kate vivia sua vida como se estivesse tecendo uma tapeçaria complexa, cada fio entrelaçado com mistérios e sonhos. Ela era uma artista, perdida no labirinto de suas próprias criações. Quando nosso caminho se cruzou, ela mal notou o olhar pesado que eu lançara em sua direção. Para Kate, eu era mais uma sombra entre tantas outras que habitavam sua vida sempre ocupada, sempre em movimento.
Enquanto me apressava para alcançá-la do lado de fora da livraria, minha mente estava repleta de questionamentos e anseios. Me perguntava o que a fazia tão enigmática, por que seus pensamentos pareciam tão distantes e sua presença tão envolvente.
Ao sair da livraria, finalmente avistei Kate caminhando pela rua, perdida em seus próprios pensamentos. A segui de longe, sem perceber que, para ela, eu era apenas mais um rosto na multidão. Enquanto isso, Kate continuava seu caminho, mergulhada em suas próprias reflexões. Ela se perguntava se algum dia encontraria alguém que fosse capaz de desvendar os mistérios que guardava consigo, alguém que compreendesse a complexidade de sua arte e a poesia de sua alma.
Quando finalmente se deu conta da minha presença atrás dela, Kate parou e virou-se lentamente, encarando-me com seus olhos profundos e misteriosos. Em um instante de silêncio tenso, nossos olhares se encontraram, como se tentassem decifrar um ao outro, como se buscassem nas entrelinhas a resposta para todas as perguntas não feitas.
— Kate — disse ela, com um olhar curioso.
— Tiago — respondi, estendendo a mão para a mulher misteriosa que agora possuía um nome, um belo nome.
Kate pegou minha mão estendida, e uma leve eletricidade percorreu minha pele no momento em que nossos dedos se tocaram. Em seus olhos, vi um brilho de curiosidade e algo mais profundo, algo que parecia ecoar em minha própria alma.
— Kate — repeti, saboreando o nome nos lábios como se fosse a chave para desvendar todos os enigmas que a envolviam. — É um prazer finalmente conhecer você.
Nossos olhares continuavam a se encontrar, comunicando mais do que palavras poderiam expressar. Em meio ao burburinho da cidade ao nosso redor, eu sentia como se estivéssemos em um mundo à parte, onde o tempo parecia desacelerar e as possibilidades se estendiam diante de nós como um vasto horizonte a explorar.
— Você sempre vem a essa livraria? — perguntei, tentando prolongar aquele momento.
— De vez em quando — respondeu ela, com um leve sorriso. — Gosto do silêncio e das histórias que encontro aqui.
— Eu também — confessei. — Mas nunca encontrei uma história tão intrigante quanto a sua.
Ela ergueu uma sobrancelha, divertida. — E o que faz você pensar que a minha história é tão interessante?
— Talvez seja o mistério nos seus olhos — disse, sentindo meu coração acelerar. — Ou talvez seja apenas curiosidade.
— Curiosidade pode ser uma coisa perigosa, Tiago — respondeu ela, com um brilho enigmático no olhar.
— Estou disposto a correr o risco — disse, com determinação.
O que o futuro reservava para nós era tão incerto quanto as páginas em branco de um livro ainda por escrever, mas juntos, talvez pudéssemos encontrar as respostas que tanto buscávamos.