13. two prisoners.

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Independentemente do quanto o Santuário era sombrio, mesmo durante o dia, ao anoitecer conseguia se tornar pior. O ar era mais úmido, mais gelado, e as lâmpadas que já não davam conta de iluminar os ambientes com o auxílio da luz do sol entrando através das janelas de vidro, se tornavam ainda mais ineficazes durante o breu da noite.

Esme vagueou pelos corredores. Não tinha conseguido dormir e, já estava tão tarde que não encontrava nenhuma alma viva de guarda, pelo menos dentro do prédio. Nem mesmo na frente da cela de Daryl. Mordeu o interior da bochecha. Não podia ajudá-lo a fugir – isso poderia acabar encrencando os dois, mas podia amenizar o sofrimento dele. Ou tentar.

Destrancou a porta, dentro da cela era simplesmente impossível de ver qualquer coisa. Não havia iluminação alguma, nenhuma janela ou lâmpada, tornando a parede indistinguível do chão ou de outra parede. Daryl também não estava em seu campo de visão. A iluminação do corredor? Não bastava nem mesmo para o próprio corredor, quanto mais causar alguma diferença dentro da cela.

— Daryl? – chamou em um sussurro, torcendo para que ele não estivesse mais tão furioso. – Eu comi um sanduíche muito bom hoje, eu... Eu fiz um 'pra você.

Era mentira. Tinha feito o sanduíche para si mesma, afim de comer no meio da madrugada, mas lembrou que, enquanto ela e Mason estavam com Dwight fazendo os sanduíches para o almoço, Dwight fez um com comida de cachorro para Daryl. Esme não pôde interferir, mas pensou que podia compensar. Além disso, ainda se sentia muito culpada pela noite anterior.

Daryl estava invisível naquela escuridão absoluta, e não parecia fazer um só movimento ou som.

E de fato, não fazia. Quando a porta da cela se abriu, ele estranhou, embora não fosse como se tivesse tido seu sono interrompido – não conseguia dormir, de qualquer maneira. Ficou quieto, esperando que Dwight tivesse resolvido aparecer de repente para humilhá-lo um pouco mais ou agredi-lo, talvez.

Não aconteceu. Ao invés disso, uma silhueta familiar tomou forma na entrada, e então a voz amigável de Esme surgiu, oferecendo um sanduíche de verdade. Daryl sentiu a boca aguar com a idéia de comer algo diferente do pão com sanche de ração que Dwight lhe trazia, mas ainda estava ressentido com Esme. Agora que ela era um deles, teria ido lá para fazer piada com ele também?

Esme esperou por alguns minutos, totalmente silenciosa, embora os pés se mexessem nervosamente dentro das botas conforme o tempo passava e ele não reagia. No entanto, o sanduíche na mão, estendido na direção de Daryl, permaneceu.

Quando estava pronta para exalar um suspiro derrotado e ir embora, sentiu os dedos sujos de Daryl roçando os dela ao agarrarem o sanduíche. O cheiro sutil do ovo frito o tinha convencido de que era seguro comer o sanduíche.

Esme não foi embora, continuava o olhando, nervosa, exatamente do mesmo modo como tinha chegado. Tinha muita coisa que queria dizer para Daryl, mas também queria deixá-lo em paz.

Queria contar tudo, se explicar, se desculpar. Isso se estendia para cada membro do grupo de Rick que a tivesse acolhido e se sentido traído pela situação mal interpretada.

Daryl já tinha terminado de comer o sanduíche, era tão gostoso quanto ela tinha dito. Também tinha percebido quanto ela estava inquieta, embora evitasse olhá-la diretamente. Não tinha certeza se ela estava conseguindo ver alguma coisa, mas a visão do caipira estava adaptada a escuridão da cela a essa altura. Ele via muito bem.

Além disso, estava nu, e isso o deixava profundamente desconfortável. As articulações já estavam dolorindo depois de passar o dia todo encolhido, tentando se esconder, e assim Daryl permanecia.

— Por quê? – Ele perguntou em um fio de voz, sentindo que era o encorajamento que Esme precisava para começar a falar o que queria ali de fato.

— Eu sinto muito.

Foi tudo o que conseguiu dizer, em um tom de voz tão suave quanto o dele.

Em resumo, era o que sentia, embora fosse muito mais complexo do que isso. Tinha muito mais a dizer, mas não sabia quanto ele estava disposto a ouvir. Sabia que Daryl era o poço do mau humor, então não o julgaria se, naquela situação, ele estivesse aborrecido demais para ouvi-la.

Daryl pousou os olhos no que conseguia ver de Esme.

A jaqueta que estava usando era justa, conseguia ver pela forma de sua sombra que não servia bem nela, portanto era nova – as roupas que usava em Alexandria lhe serviam perfeitamente. Havia outra coisa inédita: a linguagem corporal de Esme. Geralmente era vista em um humor leve, sempre assumindo uma postura amigável e gentil, e mesmo quando ficava incomodada com algo, divertia os outros com seu jeito implicante de reagir.

A tinha visto chateada pela morte de Noah, hesitante ao conhecer o grupo, mas nunca cabisbaixa como estava agora. Esme era uma pessoa adaptável, era fácil perceber, e isso significava que ela estava assustada com o Santuário. O que mais justificaria aquela mudança tão profunda em menos de vinte e quatro horas?

Aparentemente, enquanto estivessem no Santuário, independentemente se estivessem dentro ou fora daquela cela, eram dois prisioneiros.

Daryl não disse nada sobre o pedido de desculpas vago de Esme, apenas desviou o olhar para o chão enquanto ela dava um passo para trás, lentamente fechando a porta e sumindo.

Novamente, ele se recolheu na escuridão de sua cela, e Esme voltou a perambular sem rumo pelo Santuário.

Way Down We Go [TWD]Onde histórias criam vida. Descubra agora