Na porta do arsenal do Santuário, havia uma gritaria acontecendo há tempo suficiente para um pequeno grupo de Salvadores se juntar ao redor para assistir, Esme entre eles. Ela estava confortavelmente sentada sobre um barril vazio, observando Mason e Dwight trocando empurrões, resistindo ao impulso de balançar as pernas enquanto os dois explodiam de raiva.
A besta de Dwight — ou melhor, de Daryl — tinha desaparecido durante a pausa que o loiro fez para almoçar e tirar um cochilo. Pelo que havia entendido da discussão, não seria a primeira vez que Mason furtava algo lá dentro, abusando da certa imunidade que tinha como Tenente, o que levou Dwight a indagá-lo. Como a maioria dos homens lá dentro, Mason tinha uma autoconfiança exacerbada, que o tornava insuportavelmente arrogante. Consequentemente, ele não estava aceitando bem ser acusado por algo que claramente faria, e já tinha ousado fazer em outras ocasiões.
Cruzou os braços, relaxando as costas contra a parede fria de concreto atrás dela, e também cruzou as pernas.
Como o valentão que era, assim que ficou sem argumentos para retrucar, Mason puxou a pistola da cintura, apontando-a para o nariz de Dwight com as mãos levemente trêmulas. Ele estava furioso, Esme podia perceber.
Mas Esme não interveio. Se ele de fato matasse Dwight, teria que explicar isso a Negan, e então ele teria alguns problemas. Estava ansiosa para descobrir a proporção deles. Entretanto, outros dois Salvadores interferiram, acabando com o entretenimento geral do possível derramamento de sangue, e, com a diversão cortada, todos começaram a se dispersar de volta às suas funções.
— Olha só quem tá aqui. — O tom era acusador, e Esme entendeu o porquê quando reconheceu o gorducho de aspecto sujo que lhe apontava o dedo. O homem que tinha assediado Enid no dia anterior, recordou-se ela. Esme revirou os olhos. — Se acha muito corajosa, não é? Seus amiguinhos de Alexandria não tão aqui pra você impressionar.
Na prática, a morena se considerava puramente medrosa, mas sim, era mais fácil se levantar contra uma ameaça quando o perigo não era direcionado a ela. Então, talvez, Enid não a achasse medrosa pelo que ela havia feito. Talvez ela realmente não fosse sempre medrosa. Mas corajosa ainda era uma palavra muito forte para defini-la.
Esme não queria ver até onde ele iria tentando provocá-la, então continuou seus passos com os punhos cerrados.
A mão dele se moveu para envolver seu braço, segurando-a bruscamente. Esme parou involuntariamente, mas girou o corpo no mesmo instante, o punho fechado vindo por baixo e acertando em cheio o nariz do homem. Ela se deu conta do que tinha feito quando ele cambaleou para trás, o nariz sangrando, e dois outros Salvadores o segurando para mantê-lo em pé.
Isso lhe garantiu uma bela represália logo em seguida, mas não reduziu sua satisfação com o feito. Quinze minutos numa sala com Simon lhe dizendo que aquele comportamento infringia o código de conduta do Santuário e que não seria tolerado caso se repetisse lhe deu a sensação de que estava pronta para socar a cara de mais alguém naquele mesmo dia — esperava que fosse a de Simon.
Porém, não levou a ideia adiante. Não era burra e sabia que aquilo tinha bastado por um dia. Mesmo que o homem que nocauteou tivesse passado a odiá-la mais, certamente, ele também havia aprendido uma lição sobre a paciência de Esme. Seria inteligente se ele passasse a temer que, na próxima vez, ela cumprisse aquela ameaça e lhe arrancasse um dedo.
Esme estava pensando — algo perigoso naqueles dias. Não mais planejando violência, mas refletindo sobre o quadro inteiro. O Santuário era muito grande, com recursos demais, armas demais e muitas pessoas. Pior ainda, pessoas que realmente idolatravam Negan. Obviamente, havia também as exceções, os que nem mesmo queriam estar ali, mas também havia os que gostavam daquilo; porque lhes dava o direito de impor violência contra outras pessoas, de se sentirem deuses que detinham toda a liberdade do mundo, desde que a liberdade deles não desrespeitasse as regras de Negan.
Mordeu o interior da bochecha, ainda refletindo. Não podia voltar para Alexandria: não achava que a aceitariam de volta, e, se aceitassem, Negan tornaria o pesadelo deles ainda mais vívido e horrendo. Também não podia consertar o Santuário, fazer daquele lugar um ambiente decente, não do jeito como as coisas eram. A lealdade conquistada pelo medo era difícil de ser quebrada, e, aparentemente, Negan sabia disso também.
Cogitou fugir mais uma vez. Mas o Santuário era uma concentração de pessoas como Mason, e, embora tivesse fugido dele uma vez, acabou esbarrando com ele de novo, o que lhe levava a pensar que, mesmo se conseguisse deixar aquele lugar, ainda poderia ir parar ali novamente. Dwight e Sherry eram um bom exemplo.
Valia a pena arriscar a vida pela falsa ilusão de liberdade? Esme concluiu que não, e se lembrou o porquê se achava covarde.
Fechou o porta-malas do Honda Civic 2008, encarando a tintura vermelha desbotada pela exposição constante ao sol e à chuva. O estalo da tranca lhe lembrou de Daryl, jogado naquela cela, quando não estava sendo humilhado. Ele provavelmente não hesitaria em fugir, não tinha hesitado nem mesmo em dar um soco em Negan. Daryl era corajoso. Imprudente, mas corajoso — e não era tênue a linha que dividia essas duas coisas?
Voltou todo o caminho até o Santuário a pé, tendo tempo suficiente para planejar o que iria dizer quando chegasse. Iriam perguntar pelo carro, sabia, e então diria que teve que deixá-lo para trás por causa de algumas dezenas de zumbis. Quando lhe perguntassem onde, diria que perto de um posto de gasolina a oeste, e se ofereceria para buscar o carro junto de alguém quando fosse mais seguro.
Depois, descobririam que aquele carro nunca foi para oeste, estava bem longe de qualquer posto de gasolina, e Esme não tinha abandonado o carro por causa de zumbi nenhum. No entanto, até lá, Esme continuava dançando conforme a música.
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Way Down We Go [TWD]
FanfictionEntre alianças frágeis, decisões impossíveis e cicatrizes que ninguém vê, Esme descobre que os verdadeiros inimigos nem sempre são os mortos. Com o passado a perseguindo pelos corredores do Santuário e o futuro a espera nos portões de Alexandria, Es...
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