Quando trouxe o carro para casa, não vi Juliette ao voltar para o andar dos quartos, mas senti um cheiro vindo da cozinha. Algo gostoso estava sendo preparado para o jantar.
Antes de entrar no meu quarto fui até o quarto da Elisa e a encontrei desperta, chupando seu dedinho.
- Acordou princesa?
- Papai... - ela deu um salto em minha direção e me abraçou.
Lhe peguei nos braços e senti toda a ternura de um abraço. Elisa me amava e nada mais justo que eu amá-la ainda mais.
- O papai te ama princesa. Te amo e te amo. O seu amor é o melhor e mais doce do mundo. Um dia você vai entender. O papai jura nunca te deixar e ser mais presente.
- Papai... Você é lindo.
- Você que é linda demais.
Elisa era minha pequena menina falante, mas as vezes ela não tinha dimensão das palavras.
- A minha mamãe do coração também é linda.
- Quem filha?
- A Juzinha.
- Já te falei que não pode chamar ela assim. Vai assustar a moça.
- Ela deixa, eu juro papai.
...
Juliette foi subindo ao quarto, no justo momento que Rodolffo se declarava para Elisa. Um sentimento invadiu o seu coração e algumas lágrimas molharam o seu rosto.
Em seguida entrou no seu quarto e refletiu sobre como nunca ouviu seu marido se declarar ao filho. Muito pelo contrário, no dia fatídico, Lázaro destratou seu próprio filho e também a ela por um motivo idiota.
O pequeno Miguel só não gostou do sorvete que o pai lhe ofertou e Lázaro jogou o sorvete longe. Juliette ficou magoada com o ato e esse também foi um dos motivos de ter ido no banco de trás, não o quê ela fazia questão de contar a todos.
Lázaro era um mecânico, profissão que herdou do pai e assim sendo, tinha o famoso pavio curto. Era um homem bom, isso era inquestionável, mas seus carinhos eram limitados.
Juliette lembrou que ele nunca disse que a amava, mesmo que ele tenha sido o único homem que a tocou, isso pareceu não ter grande importância por que na lua de mel, ele não foi delicado o suficiente com uma mulher virgem.
Algumas coisas Juliette sentia que deveriam ter sido diferentes, mas voltar no tempo era impossível. As recordações ruins, ela tentava esquecer e só recordar do bom dono de casa, profissional e filho que ele foi. Nunca deixou faltar nada em casa e o dinheiro que ela ganhava como professora serviam para financiar o carro da família.
Com a morte de Lázaro, Juliette se desfez de tudo, inclusive da casa própria. A oficina do marido também foi vendida e ela guardou o dinheiro para o futuro. Qual seria esse futuro, ela não sabia, mas o dinheiro estava aplicado.
...
Na hora do jantar, sentamos a mesa nós três e Elisa queria ser mimada, então pedia comida na boca e eu dava.
- Está preguiçosa... Só hoje.
- Papai, só hoje. - ela disse risonha e Juliette parecia triste.
- Está tudo bem Juliette?
- Sim. Tudo bem.
- Não parece.
- Não fica triste. - Elisa tocou no rosto da Juliette. - Amanhã vamos a praia.
- Sim, princesa. Vamos a praia.
Depois do jantar, eu brinquei com minha pequena, quando ela começou a sentir sono, escovei seus dentes e a coloquei para dormir.
Vi que Juliette ainda estava acordada e buscava alguma coisa na cozinha.
- Quer ajuda? - disse sem a intenção de assustá-la, mas foi inevitável.
- Não chegue dessa forma. Eu me assusto.
- Desculpa.
- Estou buscando aquele conjunto de copos da Elisa, mas não encontro.
Fomos a busca dos copos e os achei sem demora.
- Estou distraída. Não reparei que estava ali. - ela disse sem graça.
- Anda pensando no passado?
- Um pouco...
- Quer conversar? Eu tenho um bom vinho para nos deixar relaxados.
- Eu não bebo vinho a muito tempo.
- Mas não gosta? Eu gosto.
- Eu aceito. Se não for atrapalhar a nossa viagem amanhã.
- Uma taça...
Fomos até a adega e escolhi um vinho tinto suave.
- Sinta o aroma. - Cheiramos o vinho.
- O cheiro é bom.
- E o gosto não decepciona.
Juliette deu o primeiro gole e disse:
- É uma delícia.
Algo naquelas simples palavras fez meu corpo arrepiar. Eu estava envolvido em algo unilateral.
Com as taças na mão fomos até uma parte do jardim e eu levei a garrafa do vinho junto. Uma taça bebemos logo e depois seguimos com a segunda.
- Estava pensando no seu filho?
- No meu marido. - ela disse sem rodeios.
- Sente muita saudade dele?
- Sinto mais do Miguel. Meu filho é a maior saudade da minha vida.
- E por que pensou no seu marido?
- Por que eu te ouvi com a Elisa hoje e meu marido nunca falou em amor comigo ou com o filho.
- Mas você o amava?
Juliette terminou sua taça e pediu um pouco mais.
- Eu acho que sim. Mas o nosso amor era prático e não romântico.
- Prático?
- Sim.
- O quê é um amor prático para você?
- É um amor com promessas reais. Lázaro e eu queríamos uma família, desejamos casar... Casamos e eu engravidei logo, assim vivemos a espera do nosso filho. Com Miguel nascido vivemos para ele, tempos depois queríamos outro filho e eu engravidei. Sem rodeios, tudo bem planejado... Prático.
- Sexo por obrigação?
- Pessoas casam e fazem isso sempre. Se não deseja isso não case.
- Realmente não me identifico. Por obrigação e para cumprir tabela deve ser ruim.
- É só fechar os olhos. - ela disse isso me olhando longamente.
- Fechar os olhos? Ah não. A cama foi feita para estremecer. O homem tem que fazer sua mulher pedir mais... Implorar por mais.
Juliette riu de mim e eu não entendi.
- Por que está rindo?
- Você é muito teórico.
- E você é muito prática.
- Eu sou realista Rodolffo.
- Então me diga... Não sente falta de ter um homem?
- Não sinto. - ela deu mais um gole.
- Por que seu marido era ruim, se fosse bom sentiria.
- De que adianta ser tão bom e se deitar com uma garota de programa?
Juliette sabia colocar o dedo na ferida. Aquilo acabou comigo.
- Vou deitar. Até amanhã. - ela disse ao sair de perto de mim.
Quando me vi sozinho, me permiti chorar. Ninguém sabe o quê eu sinto além de mim mesmo e se muitos me julgam, talvez seja por que eu mereço.
...
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Os Caminhos (In)certos
FanfictionO quê reserva o destino para duas pessoas machucadas?