𝐴𝑛𝑗𝑖𝑛ℎ𝑜 𝑆𝑜𝑙𝑎𝑟

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Ú𝑙𝑡𝑖𝑚𝑜 𝐶𝑎𝑝í𝑡𝑢𝑙𝑜.

Uma vez enquanto estávamos indo até o encontro de uma de nossas vítimas Killian me viu ter uma crise de ansiedade. Eu pedi que ele parasse o carro e me desse um tempo, mas tudo o que ele fez foi usar de sua voz mais mansa para dizer o quanto eu estava sendo inconveniente.

Ele falava baixinho, com paciência, moldando cada palavra dita com a mais cruel das intenções, repetindo que eu o fazia sentir mal sempre que passava por algo assim, que essa minha "artimanha" era bastante cruel com ele, afinal, o colocava em maus lençóis, como se ele de repente fosse um homem horrível que me despertava algum desconforto por vontade própria.

Killian me fazia sentir mal por eu estar mal. E enquanto sua voz ia entrando na minha mente, eu ia me perguntando se não estava exagerando, se no fim a culpa não era minha mesmo.

Eu odiava vê-lo se sentindo mal. Eu me desdobrava para não deixá-lo assim.

E aí eu me reprimia, empurrando a ansiedade para o fundo da mente, esfolando os cantos das unhas, deixando sangrar, arrancando fios e mais fios do cabelo, tudo para aliviar a dor emocional. Tudo para silenciar as minhas partes ruins em prol dele.

No entanto agora, sentada no último banco da platéia do tribunal mais famoso de Toronto, com uma peruca loira e óculos escuros, eu só consigo sorrir por vê-lo sofrer. E quanto mais Killian se debate contra as acusações, mais meu peito se expande de alegria.

Parece que eu posso me ver nele.

A mesma postura derrotada, o mesmo pavor no olhar, a sensação de impotência, o medo. Tudo. Tudo o que eu senti. Tudo o que ele me fez sentir.

E por mais que em alguns momentos ele saiba que está com a razão, ninguém o escuta.

Assim como ele nunca me escutou.

Ninguém se importa com o que ele sente.

Assim como ele nunca se importou com o que eu sentia.

Ninguém o respeita;

Assim como ele nunca me respeitou.

O povo dentro e fora da internet só repercute esse caso. E tanto que ele queria ferrar com Nikolay, de nada adiantou, pois apesar de estar prestes a ser chamado para um depoimento, o caso do patinador ficou em segundo plano.

Agora todos os olhos e ouvidos buscam mais e mais sobre o estelionatário que matou o próprio pai e a namorada, além de sumir com o corpo dela.

Porque sim, a autópsia e a análise do pen-drive apontaram para ele com todas as forças.

E quando a sentença finalmente é proferida, vejo Killian gritar como um insano, implorando por ajuda, repetindo inúmeras vezes que nunca matou ninguém, que jamais envenenou Maxim e que de forma alguma foi o único responsável pelos golpes.

Vejo-o quase se ajoelhar diante dos juízes, chorando copiosamente, os soluços ecoando pelo cômodo.

Não que alguém se importe.

Assim que o juiz deliberou e emitiu a sentença, palmas explodiram por todos os lados, dentro e fora do tribunal.
Sorrisos aliviados e rostos contentes eram a única coisa que se via.

Um desses rostos e sorrisos era o meu.

Killian pegou duas penas perpétuas pelo duplo homicídio mais omissão de cadáver, seis anos por estelionato, com agravante de usar a tecnologia para armazenar dados das vítimas (tudo bem que quem armazenava cada dado era eu, mas estava na nuvem dele, então...), e mais alguns anos por porte de Mercúrio K-09 e entorpecentes.

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