Capítulo Dezoito

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Felipe Ribeiro

— Chega, tô cansado. — Lohan disse ofegante.

Era sábado, último dia de treino da semana, e bom, Lohan foi tão persistente que além de treinar nos sábados, ele agora treinava na minha academia. A prova a qual eu submeti ele foi cinco horas de treino ininterruptas comigo, fiz ele treinar cinco vezes seguidas, repetindo os aquecimentos, os movimentos do dia, tudo em cada mínimo detalhe. Jiu-jitsu era técnica mas, principalmente, repetição e vontade. Ele quase desistiu, mas no fim aguentou mais do que os próprios atletas fixos da academia.

— Já? — me agachei perto dele — Que bom que a vida de traficante deu errado, não ia durar muito. — zombei.

— Eu não tinha que me esforçar tanto quanto aqui. — deitou no tatame, ofegante.

— Mais umas semanas e você vai acostumar. — me sentei ao lado dele — Já tá quase na hora de encerrar também, só falta quinze minutos.

— Amém, eu não aguento mais. — se sentou, abrindo sua garrafinha d'água e bebendo.

— Segunda-feira tem mais, te quero na academia, tá bom? Não é porque sua mãe paga sua mensalidade que você pode fazer o que quiser. A academia tem uma tolerância de duas faltas por semana. — mentira, mas eu queria o prender naquela vida. Se fosse pra ele se machucar, que fosse treinando e não trocando tiro com a PM ou rivais.

— Duas?! — perguntou surpreso — Ai, nossa. — coçou a cabeça.

— Tá arrependido? — ri.

— Não vou mentir, não. Eu tô. — riu, pela primeira vez riu de forma espontânea e genuína.

— Tem vontade de viajar? — o estimulei.

— Viajar tipo pro Rio de Janeiro ou pra Santa Catarina?

— Pra onde você quiser.

— Tenho, óbvio. Sempre quis ver a praia.

— Nunca viu?

— Nunca.

— Então não desiste disso aqui. — olhei pros colegas dele que ainda treinavam no auditório da escola — Não desiste da escola, não desiste do esporte. Um dia você vai poder ir pra onde quiser. Vai poder ver todas as praias do Brasil, ir pra todos os estados, melhor, conhecer outros países. Isso aqui vai te dar futuro, o tráfico nunca te daria metade do que o jiu-jitsu vai te dar. — bati no tatame, sinalizando que ali, naquele âmbito, ele poderia se tornar rico de tudo o que o dinheiro não poderia jamais comprar

Ele me olhava com olhos de esperança, de orgulho de si mesmo e do que eu havia dito.

— Será que um dia eu consigo comprar uma casa pra mim e pra minha mãe?

— Consegue. Se você for um atleta exímio, você não vai ganhar nem em Real. Vai ser em Dólar, Euro, Libra.

— E Olimpíadas?

— Jiu-jitsu ainda não é esporte olímpico. — ri — Queria muito que fosse, mas não é. Mas um segredo que ninguém sabe é que o Wagner é faixa preta de judô. Se um dia você quiser chegar nesse patamar, ele te ajuda igual ele tá me ajudando.

— Tô sabendo. — assentiu — Ele falou pra mim da Coreia.

— Ele tá falando pra todo mundo. Mas eu não acho que vai dar certo. Qual a probabilidade de notarem um brasileiro no meio de um bando de gringo que quer uma vaga?

— Mas pros xing-ling a gente é gringo também. Você não é um deles, então... — contraiu os ombros e espalmou as mãos pra cima.

— Eu não sei se eu quero ir, pra ser sincero. Não tô me sentindo pronto.

ElãOnde histórias criam vida. Descubra agora