Felipe Ribeiro
— A gente pode conversar? — perguntei ao chegar na sala, vendo a Brenda deitada no sofá com a cara mais fechada que eu já tinha visto vir dela.
— Não quero conversar. — respondeu, olhando pra televisão.
— Então tá, vou mandar meus documentos pro Wagner.
Obviamente eu não iria mandar assim, de uma hora pra outra, nós precisávamos conversar primeiro, eu não anularia os sentimentos dela em relação a essa viagem ou a desvalidaria, mas eu sabia que ela me ignoraria até o último momento porque ela era naturalmente difícil e pra piorar tudo era militar, então apelei pra algo que eu sabia que a chamaria a atenção. E foi tiro e queda.
— Você o quê?! — me fuzilou com os olhos.
— Já que você não quer conversar sobre o que tá rolando, eu vou adiantar o meu documental. Não quero perder a minha vaga no campeonato. — fui frio, sabendo que aquilo a mataria por dentro.
— Eu não acredito! — riu sarcástica — Se você fizer isso, quando você voltar, suas roupas vão estar todas na calçada! — voltou a ficar mais séria do que antes.
— Então conversa comigo! Eu só quero me explicar!
— Você achou o quê?! Que tudo bem não me contar sobre algo dessa proporção?! Você vai pra outro país! Ia me falar quando?! — perguntou perceptivelmente irritada — Felipe, eu sou sua noiva!
— Brenda, calma, me deixa falar!
— Fala a sua ladainha, Felipe, fala!
— Na semana que o Wagner me inscreveu foi a mesma semana que você quase abortou. Foi literalmente dois dias depois, dia vinte e seis de julho. Eu não podia falar pra ele o que estava acontecendo aqui em casa então não consegui pedir pra ele revogar a minha inscrição.
— E por que você só não pediu e ponto final?!
— Eu pedi! Mas ele negou.
— Mas você não me contou por quê?! —perguntou irredutível.
— Você estava uma pilha de nervos por causa da gravidez e eu estava uma pilha de nervos por causa de você. Eu fiquei com medo de te causar mais um quadro de sangramento e eu não quis perder o nosso filho, eu não quero. E outra, eu jamais iria imaginar que um campeonato gringo iria me selecionar pra uma competição. — fui sincero — Cara, eu entendo toda sua raiva e frustração, mas eu não tive culpa. Eu não escondi de você de má fé, eu só não quis criar um desconforto desnecessário, um mal-estar.
— E o mal-estar se instaurou de qualquer jeito.
— Mas eu ainda não tenho culpa! — rebati — Eu não tenho culpa de ter despertado o interesse de uma pessoa que eu sequer conheço mas que gostou do meu modo de lutar. Sem contar que eu só estou pré-selecionado, não significa nada, eu posso ser desclassificado ou descartado a qualquer momento.
Ela parou de falar, bufando e batendo o pé com tanta vontade que fazia barulho pela nossa casa.
— Você poderia ao menos ter falado que tinha se inscrito, custava me deixar a par?
— Eu esqueci que estava inscrito! — repeti, um pouco impaciente — Brenda, você tá comigo há anos e não se acostumou comigo? Eu não tenho autoestima nenhuma, eu nunca imaginei que isso pudesse dar certo. Mas deu certo, parcialmente. Sem contar tudo o que estava acontecendo dentro da nossa casa, eu não tinha cabeça pra nada, só pra sua gestação. — meu tom era desabafo — Brenda, você pode ficar puta, mas eu tô sendo sincero contigo.
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Elã
RomanceA segunda parte do livro "Entre a Paz e o Caos", "Elã" retoma sua história oito anos após os eventos. Os personagens principais, Felipe e Brenda, agora moram em São Paulo, enquanto Amanda e Diogo permanecem no Rio de Janeiro. Felipe abandonou a vida...