Capítulo 1 | Perfume de destruição

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CALLIOPE

O sol já estava baixo no céu quando girei a placa de "aberto" para "fechado" na porta da minha floricultura. O cheiro das rosas, lírios e tulipas ainda pairava no ar, impregnando as paredes do pequeno espaço que eu amava chamar de meu. Laura tinha ido embora mais cedo hoje, precisava buscar seu filho na creche.

A "Floricultura Lewis" não era apenas um negócio; era o meu refúgio, o único lugar onde eu conseguia esquecer, ao menos por algumas horas, as sombras que me acompanhavam. Cada flor, cada arranjo que eu montava, me dava uma sensação de controle, algo que havia se perdido há muito tempo na minha vida. Era quase terapêutico. Organizar flores e vê-las florescer, mesmo nas menores coisas, me trazia uma paz que eu não encontrava em nenhum outro lugar.

Terminei de ajeitar um buquê de lavandas, admirando como os tons suaves de lilás contrastavam com o verde vibrante das folhas.
Minha mãe, Edilha, costumava amar o cheiro de lavanda antes de tudo mudar. Antes de perdermos meu pai, antes de ela se perder completamente.

Lembrei-me de como ela ficou depois da morte dele. Foi como se a luz nos olhos dela se apagasse. E eu... Bem, eu também nunca mais fui a mesma. Meu pai era tudo para mim, e a sua morte foi um golpe duro. Ele era o tipo de homem que sempre sabia como trazer alegria, mesmo nos momentos mais difíceis.
Se ele estivesse vivo, nós dois estaríamos correndo pela cidade agora, comprando coisas para fazer uma enorme festa surpresa para minha mãe, como fiziamos tantas vezes no passado.

Mas ele se foi, e o que restou foi um vazio que parecia impossível de preencher. Por anos, fiquei reclusa, cuidando da minha mãe como podia, enquanto Caius mantinha nós duas, ele era o único que trabalha naquele tempo. Por sorte seu trabalho o remunerava maravilhosamente bem.
Edilha, que antes era uma mulher vibrante, cheia de vida, se tornou apenas uma sombra do que um dia foi.
Passei anos assim, sem ter uma saída, até que ela começou a mostrar sinais de melhora. Foi aí que consegui contratar uma babá, Dana, de meio período, e finalmente pude sair de casa, tentar reconstruir minha vida.

Abrir a floricultura foi como um recomeço para mim. Um espaço onde eu podia me dedicar a algo bonito, algo que fazia sentido.

Olhei para o relógio e me dei conta de que estava atrasada. Com um sorriso melancólico, lembrei-me do motivo: hoje era o aniversário da minha mãe.
Suspirei, colocando o buquê na prateleira, antes de pegar a bolsa e apagar as luzes.

Ao sair, a brisa noturna acariciou seu rosto, um alívio bem-vindo após o dia quente.

Eu nunca gostei muito de comemorações, especialmente depois da morte do meu pai. Ele sempre foi o responsável por tornar esses momentos especiais. Sem ele, as festas perderam o brilho, mas ainda assim, sabia que tinha que fazer algo por ela. Afinal, era uma chance de recordar os bons momentos e, quem sabe, criar novos.

Minha mãe sempre nos surpreendeu em seus pedidos de aniversário, mas por incrível que pareça, a sua única exigência nesse dia era um bolo de morango da padaria "Doce Lugar".

A caminhada até a padaria era rápida, cerca de dez minutos pelas ruas movimentadas de Argo, uma cidade que nunca parecia dormir.
Eu amo esse ambiente, do contraste entre os prédios altos e as vielas estreitas, das lojas elegantes que coexistiam com cafés aconchegantes e pequenos negócios familiares. Era como se cada esquina escondesse uma história, um segredo a ser descoberto.

Quando entrei na padaria, fui recebida por um cheiro de açúcar e café.
A loja estava cheia, mas, como sempre, o atendimento era ágil. Eu esperei pacientemente na fila, parando para observar o movimento ao meu redor.
Aquele lugar sempre tinha um ar acolhedor, mas algo parecia diferente naquele dia. Olhei ao redor, buscando o balcão, e foi quando ele apareceu.

Entre flores e segredosOnde histórias criam vida. Descubra agora