Capítulo 35 | Quase namorada

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NOAH

Eu estava jogado no balcão da padaria, o celular na mão, fingindo estar distraído. Mas a verdade?. Minha mente estava a quilômetros dali, focada exclusivamente nela. Calliope, na casa dela, em sua rotina tão mundana, mas para mim, aquilo era hipnotizante. Ela estava no computador, provavelmente lidando com fornecedores, como sempre fazia. Renovar a floricultura, comprar móveis novos, fazer parcerias… Tão dedicada. Tão perfeita.

O sol estava começando a se pôr, lançando uma luz suave pela janela, mas eu mal notava o resto do mundo. Só conseguia enxergá-la. As ruas de Argo estavam movimentadas lá fora, o dia comum seguindo seu curso, mas tudo isso parecia ruído de fundo para o meu verdadeiro interesse.

Ela mordia o lábio, concentrada. Cada pequeno gesto era uma obra de arte, um detalhe que eu queria guardar para sempre. O jeito como os dedos deslizavam pelas teclas do notebook, como a testa franzia levemente ao ler uma mensagem, como inclinava a cabeça ao pensar em algo. Ela não fazia ideia de que estava sendo observada. Não fazia ideia de que cada movimento dela, por mais insignificante que fosse, parecia ser o evento mais importante do meu dia.

Era loucura, eu sabia disso. Tinha plena consciência do quão doentio era esse fascínio. Mas eu não conseguia evitar. Ela era como uma melodia constante na minha mente, e eu, como o mais dedicado dos ouvintes, sempre prestando atenção. Quantas vezes eu já tinha passado por isso? Assistir de longe, absorver cada gesto, cada palavra, cada detalhe.

Eu sabia que logo ela se levantaria para fechar as cortinas ou verificar se algo estava fora do lugar. Um padrão. Ela sempre fazia isso antes de terminar o dia. E eu já estava antecipando esse momento, como se fosse um ato final de uma peça que eu já tinha visto dezenas de vezes.

Talvez fosse bizarro, talvez ridículo. Mas assistir Calliope era, de alguma forma, a única coisa que me dava paz.

Até que a voz familiar da Tryz quebrou o silêncio. Ela apareceu do nada, como sempre, se aproximando com aquele jeito provocador.

- Então ela que é a coitada?. Tryz
perguntou, uma sobrancelha arqueada e um sorriso malicioso nos lábios. O tom era puro veneno.

Desviei os olhos de Calliope e me virei para encarar Tryz. Meu humor azedou no mesmo instante. Ela sabia exatamente como me irritar.

- Coitada?. Repeti, sarcástico, cruzando os braços. - Ela é quase minha namorada.

Tryz riu, um riso que parecia dançar entre diversão e desdém. Claro, ela sabia que a palavra “quase” era o que mais me incomodava. A cada dia que passava, Calliope se tornava mais obsessão, e menos acessível.

- O que impede dela ser completamente sua namorada?. Ela provocou, jogando a isca, esperando me ver morder.

Soltei uma risada seca, sem humor, sentindo a familiar irritação subir pelo meu peito.

- O marido dela. Respondi, seco, o gosto amargo na boca ao dizer aquelas palavras.

Ela soltou uma risada curta, como se minha resposta fosse uma piada que ela já esperava ouvir.

- Ah, o marido… . Disse ela, revirando os olhos, como se Caius não fosse grande coisa. Ela se inclinou contra o balcão, me olhando com aquele brilho nos olhos, sempre querendo mais. - E desde quando isso foi problema pra você?.

Eu a encarei por um segundo, um sorriso lento e irônico se formando nos meus lábios. Claro, ela não estava errada. Na verdade, nada me impediria de ter Calliope, nem mesmo Caius. Mas a questão não era o que eu podia fazer. Era quando. Era como. Porque eu sabia que, eventualmente, ele não estaria mais no caminho. Só era uma questão de tempo, ou talvez eu gostava de sofrer um pouco.

Entre flores e segredosOnde histórias criam vida. Descubra agora