Tínhamos fechado a padaria cedo hoje, não por falta de movimento, mas porque Tryz teve um de seus típicos ataques de histeria. O motivo?. Eryx não estava trabalhando. Ele estava resolvendo outros assuntos para mim, e isso foi o suficiente para desestabilizar Tryz.
A chuva batia forte, o som das gotas ecoando pelo meu apartamento vazio, intensificando a solidão que me cercava. As luzes da cidade lá fora mal conseguiam atravessar as cortinas, deixando o ambiente em um crepúsculo permanente. Estava no sofá, as pernas estendidas, o olhar preso no teto como se as respostas para todos os meus dilemas estivessem lá.
Mas não estavam.
Eu pensava nela. Sempre nela. Cada curva do sorriso, cada palavra trocada. Mas, infelizmente, ela estava longe. Fora do meu alcance. Escondida naquela casa, protegida por ele. A sombra desprezível de Caius pairava sobre ela como um veneno. Só de imaginar isso, meu peito se enchia de ódio. Ele não a merecia, nunca mereceu.
O pensamento me corroía, como se o monstro que eu tentava esconder dentro de mim se agitasse.
O celular vibrou discretamente na mesa de centro ao lado, interrompendo meus pensamentos. Peguei o aparelho e, ao ver o nome de Eryx brilhando na tela, uma sensação de alerta tomou conta de mim. Ele raramente ligava, a não ser que fosse algo importante.
Deslizei o dedo pela tela e levei o celular ao ouvido, mantendo o tom controlado, mas curioso.
- Tem uma novidade. Tô passando aí.
Sem dizer uma palavra, finalizei a chamada. Eu sabia que não precisava responder. Eryx conhecia meus hábitos. Sabia que a porta estava destrancada. Sempre estava. Um reflexo da confiança cega que depositava nele, o único a quem permitia cruzar aquela barreira sem precisar pedir permissão. Olhei de relance para a porta, o silêncio do apartamento agora mais tenso, apenas o som da chuva persistente quebrando a quietude. A espera por sua chegada começava a pesar no ar, como uma sombra se aproximando.
Permaneci deitado, os pensamentos se tornando uma teia de imagens, Calliope rindo, Caius saindo de cena, o mundo aos meus pés com ela ao meu lado. Era inevitável. Tudo conspirava para isso. Era o único desfecho lógico. E eu sempre lidei com lógica, com precisão. Isso não era uma obsessão romântica, como muitos diriam. Era pura química.
Os minutos passaram e, finalmente, ouvi a porta se abrir e fechar com um clique suave. Eryx apareceu no corredor, tirando o casaco encharcado pela chuva. Ele parecia casual, mas conhecendo-o, eu sabia que vinha com algo importante. Não perdia tempo com bobagens. Por isso ele era o único de confiança.
- Trouxe boas notícias?. Perguntei, sem mover um músculo.
Ele riu, sacudindo a cabeça enquanto se jogava na poltrona à minha frente.
- Sempre. Parece que a princesinha vai sumir por uns dias.
Essa frase imediatamente me fez sentar, os olhos fixos nele.
- Continua.
Eryx deu de ombros, como se a informação fosse um detalhe insignificante.
- Caius vai levar ela para um chalé amanhã, aquele nas montanhas ao sul. Eles saem cedo. Então, o marido perfeitinho decidiu que uma viagem pra "desconectar" seria ideal.
Eu ri. A ideia de Caius acreditando que podia "cuidar" de Calliope me divertia, mas de uma forma distorcida, amarga.
- Um chalé isolado... . Sussurrei, as engrenagens da minha mente começando a girar.
- Exatamente. Disse Eryx, seu sorriso conivente crescendo. - Isolado, sem ninguém por perto.
Havia algo reconfortante em saber que, em poucas horas, ela estaria fora da cidade. Fora do meu campo de visão, sim, mas vulnerável, apenas com Caius como companhia. E isso, para mim, não era um problema. Na verdade, era uma oportunidade, porém ainda não era o momento.
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Entre flores e segredos
De TodoA vida pacífica de Calliope Lewis na floricultura da família é virada de cabeça para baixo quando ela recebe uma fita cassete e uma carta misteriosa. Envolvida em um jogo psicológico de gato e rato, ela enfrenta uma perigosa batalha de sobrevivência...