JONAS LEVI SE surpreendeu a se deparar com a expressão de Marcela, quando ela abriu a porta dos fundos para ele. Ao que parecia, ele esperava que a bandeja de isopor com cafés fresquinhos e que cheiravam muito bem fossem suficientes para atenuar qualquer que fosse o motivo pelo mau humor da garota.
Não foi o caso.
— Boa tarde, Cinderela — um sorriso lascivo acompanhou a frase. Sorrisos de Jonas Levi costumavam ser o bastante para desarmá-la, então, algo devia estar realmente errado.
Ele exibiu uma covinha para Marcela, mais uma vez tentando desfazer as rugas de irritação em sua testa. Mas a garota não sorriu de volta.
— O negócio do aniversário da sua irmã — ela disse, sem rodeios. — Não vai rolar.
Jonas franziu o cenho, imitando-a.
— Como assim?
— O plano está cancelado. Não vou poder ir. A empresa de eventos de Andrea está organizando essa festa — disse Marcela com a mão na maçaneta, pronta para expulsá-lo. — Minha madrasta — ela esclareceu, porque Jonas não pareceu entender de primeira. — Eu vou ficar na recepção, conferindo os convites.
Parado à porta, Jonas pensou por alguns instantes, assimilando as informações enquanto a irritação no rosto de Marcela era substituída por decepção.
— Sem receber um real por isso, presumo.
— Presumiu certo — ela agitou a cabeça e indicou com as sobrancelhas a cozinha, para que ele entrasse. Jonas estava pegando o jeito de sua dinâmica familiar, o que era um alívio. A garota ela levada à exaustão toda a vez que precisava explicar que a madrasta a via como uma mera funcionária, não uma enteada.
— Vamos trocar de organizadora — concluiu Jonas. — Simples assim.
— Por favor, não faça isso. Andrea vai me torturar por semanas.
— Ela não vai descobrir.
— Não depende de ela descobrir ou não — Marcela explicou, enxugando o suor de suas mãos no avental. — Eu sou o canal principal de externalização de raiva. Ela provavelmente vai me fazer trocar as telhas se perder esse contrato.
— Vamos pensar em alguma coisa — assegurou ele, entregando à garota um copo de papelão com tampa, o café fumegando por um pequeno corte. Marcela aceitou a bebida.
— É impossível — ela insistiu. — Não vai dar certo. Já não seria o melhor dos planos com as gêmeas lá, prontas para me identificar e arruinar tudo. Mas com a madrasta, bem... isso apenas significa que eu vou ser descoberta em dois minutos, em vez de cinco.
Jonas sacou o próprio celular do bolso do paletó sem tirar os olhos de Marcela e digitou rapidamente um número de telefone.
— Irmã — ele murmurou, e Marcela notou o tom adicional de ternura quando ele se dirigiu a Giorgia.
Jonas, em geral, era extremamente austero. Era desconcertante vê-lo agindo de maneira que poderia ser descrita como afetuosa. Marcela já tinha se pego pensando, por diversas vezes, quem tinha o privilégio de receber uma versão de Jonas que não fosse sempre tão formal e distante. Mesmo que ele tivesse chamado o que havia entre eles de uma amizade, ela não julgava ser tratada de maneira diferente das demais pessoas. Ouvindo-o falar com a irmã, teve certeza.
— Sobre aquele projeto que comentei. É, esse mesmo. Além das roupas, precisaremos tornar a garota irreconhecível. Muito. Tipo, a própria madrasta dela não a reconheceria. É possível? — Jonas sorriu, encarando os próprios sapatos. Então, levantou os olhos para Marcela e passou a descrevê-la: — Loira, cabelos cacheados. É mais para um dourado. Acho que é natural. Pouco mais de um metro e setenta. Ela é magra, mas tem umas curvas. Ah... — Jonas corou, e Marcela se empertigou. — Olhos azuis. Intensos.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Cinderela às avessas
Teen FictionPalácios, vestidos brilhantes e sapatinhos de cristal não fazem parte da realidade de Marcela Leone. Órfã de mãe desde bebê e de pai pela metade de sua vida, a garota foi obrigada a convencer seu coração sonhador de que não há fadas madrinhas ou prí...