Prólogo

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HELENA DUARTE

Podia sentir cada gotícula de água contra a minha pele enquanto apressava cada vez meus passos, embora sentisse que a qualquer momento minhas pernas perderiam suas funções e me levariam ao chão por conta do desespero eminente que eu sentia. Mesmo não podendo ver o que me causava isso, ainda que a todos os momentos eu olhasse para todos os lados, mas eu sabia que ele estava ali, podia sentir sua presença e ela me sufocava a cada minuto. 

De Repente a chuva parou e o céu cheio de nuvens escuras e carregadas que cobriam a rua caótica e deserta em que eu caminhava, desapareceu, na verdade, tudo desapareceu e só sobrou a escuridão, para qualquer direção que eu olhava, nada mais se via. E foi aí que percebi que tinha parado de caminhar, estava parada e ainda sim não conseguia ver quem me perseguia, mas agora podia sentir sua presença perto de mim, não perto, ele estava em mim, dentro de mim e isso não era confortante... Era amedrontador. 

Um solavanco do meu corpo me despertou do transe provocado pela minha mente traumatizada. Os sonhos cada vez mais confusos e aterrorizantes minavam minha paz, que já era escassa, tornando-se parte da minha rotina monótona: acordar suada e com a respiração desregulada.

Levantei da cama de solteiro, que fez um barulho irritante de cama velha com meu impulso. Ignorei como faço com tantas coisas no meu dia a dia, e segui até a porta do quarto, pegando uma muda de roupa. Dirigi-me então ao único banheiro da casa, no corredor, cuja fechadura quebrada sempre permanecia ineficaz, apesar de meus esforços para consertá-la.

Examinei o corredor e constatei que ninguém estava ali, minha mãe provavelmente já teria saído para seu trabalho de vendedora e meu padrasto devia está por aí tentando lidar com os sintomas comuns da ressaca, tentaria ser o mais breve possível em meu banho para que aonde ele estivesse não me ouvisse e me deixasse continuar o meu dia sem sentir nojo de mim mesma. 

Entrei no banheiro, e o frio do piso acimentado me fez estremecer. A lâmpada amarelada piscava no teto, lançando sombras inquietantes nas paredes. Meus olhos encontraram o espelho manchado e eu quase recuei com a imagem que vi. Estava pálida, com olheiras profundas, como se cada pesadelo tivesse deixado uma marca física em meu rosto.Respirei fundo tentando acalmar o tremor das minhas mãos, mas o esforço parecia inútil.

Lavei o rosto com a água gelada, tentando afastar o peso do sonho que ainda pairava sobre mim como uma nuvem negra. Mas, assim que fechei os olhos, flashes do pesadelo invadiram a minha mente - a escuridão e a sensação de algo dentro de mim.

Vesti-me rapidamente, sentindo cada costura da roupa como se fosse feita de espinhos. O tecido parecia mais pesado do que deveria,  uma parte de mim questionava se o dia de hoje seria diferente de todos os outros - mas já sabia a resposta. A rotina se repetia, os dias se arrastavam, e eu me sentia presa em um ciclo interminável de monotonia e medo.

Ouvi a porta do banheiro ranger, senti o tremor em meu corpo já sabendo que era ele. De repente minhas pernas começaram a tremer e eu já sentia o caminho quente em meu rosto causado pelas lágrimas que caiam descontroladas pelo mesmo. Sentia seus passos se aproximando de meu corpo e naquele momento fechei meus olhos e tentei fazer minha mente me levar daquele momento. 

Mas quanto eu mais tentava ignorar, sentia ele tirando a única coisa que escondia a minha nudez, senti como se um muro fosse derrubado dando total liberdade para que meus inimigos andassem por áreas que deveriam ser totalmente restritas e inalcançáveis. Sentia os solavancos que seus movimentos causavam em meu corpo e eu queria não sentir, queria está anestesiada. De repente queria estar morta. 

Enquanto ele me violentava, cada segundo parecia se arrastar em uma eternidade de dor e desespero. Meu corpo tremia descontroladamente, tentando escapar para algum lugar onde a dor não pudesse me alcançar. Eu sabia que era inútil, mas, ainda assim, tentei me agarrar a qualquer fragmento de esperança, a qualquer lembrança que pudesse me afastar daquele horror. 

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