Capítulo 31 - Saudades

1.5K 209 12
                                    

CAMILA NÃO FALOU COM ASTRID nem com Lauren durante dois dias.

A manhã de sábado no acampamento tinha sido tranquila. Tirando Josh e Ruby, todos estavam de ressaca ou não tinham dormido bem. Apenas Lauren continuava desmaiada na barraca quando todos já estavam prontos e de mala feita.

Astrid e Spencer foram embora antes mesmo de Josh terminar de preparar o café da manhã no fogo, não dando a Camila e Dinah nenhuma chance de conversar com a amiga. E Lauren dormiu durante todo o percurso de volta à cidade.

Agora era segunda à noite e Camila se sentia como se estivesse saindo do corpo. Ela e Dinah trocaram muitas mensagens durante o fim de semana, mas em especial sobre o fato de nenhuma das duas conseguir falar com Astrid.

Camila teria ido até a casa da amiga para confrontá-la, mas tanto ela quanto Dinah estavam sobrecarregadas de trabalho em suas respectivas lojas, compensando os dias de folga que tiraram no spa e no acampamento improvisado. Além disso, ela não queria emboscá-la. Estava na hora de ser sincera quanto às suas preocupações, sim, mas ela e Dinah concordaram em abordar a situação com cautela, ainda mais agora que Astrid estava claramente evitando as duas e não facilitaria as coisas.

Todo esse estresse poderia ser gerenciável - afinal, ela estava preocupada com Astrid desde que a melhor amiga ficara noiva -, mas agora também tinha Lauren, que não tinha mandado mensagem, nem telefonado, nem passado na livraria desde que voltaram das Termas de Bagby.

Tudo bem, Camila também não tinha ligado, nem mandado mensagem. Fazer qualquer uma das duas coisas daria um tom de namoro à coisa e elas com certeza não estavam namorando. E, como não estavam namorando, entrar em contato daria a entender que havia segundas intenções e isso não parecia legal.

Nada parecia legal!

Ela sabia que um relacionamento casual era assim e disse a si mesma, várias vezes, que estava tudo bem. Disse a si mesma que estava tudo bem quando Ruby perguntou se Lauren podia vir comer uma pizza com elas sábado à noite e ela disse que não. Disse a si mesma que estava tudo bem ao se virar na cama domingo e ainda sentir o cheiro de Lauren em seu travesseiro. Disse a si mesma que estava tudo bem ao rolar o feed do Instagram de Lauren segunda à noite, deitada no sofá enquanto a chuva caía lá fora, ignorando o fato de que a dor em seu peito ficava maior e mais forte a cada imagem.

Ficou especialmente melancólica ao ver a fotografia de uma mulher negra maravilhosa usando um vestido formal com saia de tule, descalça no fluxo de água de um hidrante em Nova York, com um muro de pedras grafitado atrás dela. O vermelho do hidrante se destacava em meio às roupas neutras da mulher, ao cinza e aos azuis e verdes desbotados do muro, às gotas de água que pareciam pedacinhos de cristal suspensos no ar.

Era uma foto linda. Digna de estar pendurada em uma parede. De uma galeria, até.

Ela havia acabado de abrir mais uma imagem de tirar o fôlego, se afundando na pena que estava sentindo de si mesma, quando a campainha tocou.

Empurrou o casulo de cobertores, xingando Josh por ter chegado cedo pela primeira vez na vida. Ele ia levar Ruby e Tess ao cinema e depois elas iam dormir no apartamento dele. Ainda faltavam quinze minutos para o horário combinado.

Puxou a alça da regata que ficava caindo, mas nem se preocupou em dar um jeito no cabelo, que estava preso em um coque bagunçado no topo da cabeça, desde que ela chegara da livraria, mas já tinha cedido um pouco à gravidade.

- Ruby, seu pai chegou! - gritou em direção ao corredor ao chegar à porta.

- Nossa, ele está adiantado!

- Ouviu isso? - perguntou Camila, abrindo a porta. - Você chocou sua ...

Ela piscou olhando para a pessoa que estava em sua varanda embaixo de um guarda-chuva rosa com babados. Uma pessoa que com certeza não era Josh.

- Eu choquei quem? - perguntou Lauren.

- Ah. Ninguém. Achei que fosse o Josh.

- Sinto muito decepcionar.

- Não! - gritou Camila, alto o bastante para deixar Lauren levemente assustada. Ela se esforçou para se acalmar. - Desculpa. Não, não estou decepcionada. Só surpresa.

Lauren assentiu, e ficaram se olhando por alguns segundos, durante os quais Camila se deu conta de que estava com uma calça de moletom suja, uma regata com uma mancha antiga de mostarda perto do seio esquerdo e o
cabelo parecendo um ninho de vespa. Estava um pouco maquiada, mas, com uma noite inteira para sentir pena de si mesma e beber vinho pela frente, nem tinha se preocupado em dar uma ajeitada ao chegar da livraria.

- Então posso entrar? - perguntou Lauren. - Tirei umas fotos hoje que adoraria mostrar pra Ruby.

Camila sentiu um frio na barriga, mas deu um passo para trás.

- Claro, desculpa, entra. Mas a Ruby vai sair co...

- Olha só. Olá, senhoras! - Josh veio correndinho pela calçada, com uma calça justa e uma camiseta cinza básica salpicada de pingos de chuva no peito e nos braços. - Que noite linda, hein?

- Oi - disse Camila. - Ruby está quase pronta.

- Beleza. Oi, Lauren.

- Oi.

- Belo guarda-chuva.

Lauren olhou para cima, como se tivesse esquecido a aparência daquela coisa.

- Era o único que a Pousada Caleidoscópio tinha pra me emprestar.

- Parece uma torta de morango - comentou Josh. - O que vocês vão aprontar hoje?

- Nada - respondeu Camila.

- Nadinha - garantiu Lauren.

Josh franziu o cenho, olhando de uma para a outra. Camila quase conseguia ouvir a mente dele trabalhando e queria que ele caísse fora. Por sorte, Ruby veio saltitando pelo corredor naquele exato momento, beijando o rosto de Camila e cumprimentando Lauren antes de se jogar nos braços do pai. Então eles partiram em um alvoroço de capa de chuva verde e mochila, com a promessa de que Josh traria a filha de volta na manhã seguinte, às dez.

Camila ficou observando a filha entrar no banco de trás da caminhonete de Josh e colocar o cinto de segurança. Deixou a porta aberta mesmo depois que o carro arrancou e eles saíram de vista.

- Desculpa - disse. - Ruby vai ficar com o pai hoje.

- Sim, percebi - respondeu Lauren.

- Você... Quer dizer... Você quer...

Ela não conseguia pronunciar as palavras.

Queria que Lauren ficasse, mas não queria que ela pensasse que era só pelo sexo. Mas, pensando bem, já tinham estabelecido que estavam só transando, então Camila podia convidá-la para ficar sem medo.

Lauren era quem tinha aparecido à sua porta, pelo amor de Deus.

Ainda assim, não conseguia deixar de querer algo mais. Jantar. Ver um filme. Talvez só dividir uma garrafa de vinho na varanda, ouvindo a chuva e conversando.

Mas isso era ridículo.

Era... impossível.

- Eu quero o quê? - perguntou Lauren, dando um passo à frente.

Camila balançou a cabeça.

- Deixa pra lá. Eu...

Mas então Lauren fechou o guarda-chuva, deixou-o na varanda e entrou. Ela fechou a porta antes de entrar no espaço de Camila, com as mãos em seu quadril e a boca tocando seu lábio inferior ao dizer:

- Eu estava com saudade.

Camila não conseguia respirar. Nem ousava.

- Estava?

Lauren assentiu e a beijou - uma vez, duas, um beijo suave e doce que não indicava que ela esperasse ir para a cama imediatamente. Na verdade, com aquele beijo, bom, parecia que Lauren esperava... algo mais.

CAMREN: Ela Não Se ImportaOnde histórias criam vida. Descubra agora