Capítulo 36: Recomeço

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POV SN

Os dias que se seguiram àquela conversa foram estranhos. Havia um silêncio entre mim e Gabi que não estávamos acostumadas a lidar. Eu não a afastei de verdade, mas também não me aproximei. Era como se estivesse esperando por algo — talvez por ela provar que estava comprometida em consertar o que estava quebrado. Meu coração ainda estava ferido, e eu precisava de mais do que promessas vazias para curá-lo.

Mas, aos poucos, percebi que Gabi estava realmente tentando. Ela começou a me incluir em suas conversas e nas atividades que, antes, pareciam ser só dela e de Rebeca. A ginasta, aliás, também parecia perceber o distanciamento e respeitou isso. As interações entre elas tornaram-se mais profissionais, e o foco voltou a ser nos jogos e no trabalho duro.

Mesmo assim, o incômodo ainda estava lá. Eu queria confiar em Gabi, queria acreditar que ela realmente não tinha percebido o quanto estava me deixando de lado, mas a dúvida ainda pairava sobre mim. O que me impedia de voltar a ser quem éramos antes era o medo de que isso pudesse acontecer novamente. E se eu me entregasse, e ela voltasse a me ignorar, a me substituir por alguém como Rebeca ou qualquer outra pessoa?

Havia uma festa organizada para os atletas no centro olímpico naquela noite, e por mais que eu estivesse hesitante, decidi que ir seria uma boa distração. Gabi não mencionou muito sobre a festa, mas vi em seus olhos que ela estava nervosa, querendo que eu fosse, mas sem saber como me convidar oficialmente.

Quando saímos do hotel, o clima estava leve, mas havia um subtexto denso no ar. As luzes da cidade, os sons da comemoração, tudo contribuía para aquele momento de tensão latente entre nós. Caminhávamos lado a lado, mas parecia que havia quilômetros de distância.

A festa já estava animada quando chegamos. Atletas de todos os países se misturavam, celebrando suas conquistas, e as risadas enchiam o ambiente. Eu reconheci Rebeca de longe, mas ao contrário do que imaginava, ela estava com o grupo de ginastas, distante de nós. Fiquei aliviada. O último que eu precisava era de mais uma interação desconfortável entre nós três.

Gabi se manteve ao meu lado a maior parte do tempo, o que foi um sinal claro de que ela estava tentando fazer as coisas de maneira diferente. Apesar disso, eu ainda sentia uma barreira entre nós. Estávamos ali, juntos, mas faltava aquela conexão de antes. Aquela sensação de pertencermos uma à outra, sem questionamentos.

No meio da festa, encontrei Roberta e Júlia, que estavam rindo e conversando animadamente. Júlia me abraçou calorosamente, como se já soubesse de tudo o que estava se passando na minha cabeça. Ela sempre teve essa habilidade de perceber as coisas antes que eu precisasse falar.

“Você está bem?” ela perguntou, baixinho, para que ninguém mais ouvisse.

Assenti, mas sabia que meu sorriso não convencia. “Estou… tentando.”

Ela apertou minha mão. “Vai dar tudo certo, SN. Só confia.”

Enquanto eu conversava com elas, Gabi se afastou por alguns minutos, indo falar com uma equipe da imprensa que a abordou. Eu me preparei mentalmente, já esperando que as perguntas sobre Rebeca surgissem, mas, para minha surpresa, quando ela voltou, me disse que tinha desmentido todos os rumores de forma clara e direta.

“Eles perguntaram sobre Rebeca de novo,” Gabi começou, um pouco nervosa. “Eu disse que somos só amigas e que não há mais nada acontecendo entre nós. E depois, falei sobre você. Falei que você é a pessoa com quem eu estou, e que ninguém deveria duvidar disso.”

Eu fiquei sem palavras por um momento. Era exatamente o que eu precisava ouvir, mas o peso das últimas semanas ainda estava em mim, dificultando minha resposta imediata.

“Obrigada,” murmurei, sincera, mas sem conseguir abrir meu coração completamente ainda.

Ela me olhou nos olhos, a vulnerabilidade dela estava ali, exposta, esperando por uma reação minha. Mas antes que eu pudesse dizer qualquer coisa mais significativa, uma música começou a tocar no fundo da festa, e algumas pessoas começaram a dançar.

“Quer dançar?” ela perguntou, com um leve sorriso.

Hesitei por um segundo, mas finalmente assenti. Precisávamos desse momento. Talvez esse fosse o primeiro passo para quebrar o gelo entre nós.

Gabi me puxou suavemente para a pista de dança. O ritmo era lento, e eu senti seus braços me envolverem, como se estivéssemos em nosso próprio pequeno mundo. Enquanto nos movíamos, percebi que, apesar de tudo, ainda havia uma conexão profunda ali. Não estava quebrada, apenas machucada. E talvez, com o tempo, ela pudesse se curar.

Ela encostou a cabeça em meu ombro, e por um momento, senti como se o tempo tivesse parado. Estávamos juntas de novo, pelo menos fisicamente, e isso era um começo.

“Eu vou te reconquistar,” ela sussurrou, baixinho, perto do meu ouvido. “Eu prometo.”

Essas palavras me aqueceram por dentro, mas o medo ainda estava lá, me segurando de me entregar completamente.

“Eu só preciso de tempo,” respondi, com sinceridade. “Mas estou disposta a tentar.”

Ela me apertou mais forte, e, naquele momento, senti que talvez estivéssemos no caminho certo. As feridas estavam lá, mas juntas, poderíamos encontrar uma forma de cicatrizá-las. Paris, com toda a sua grandiosidade, ainda tinha espaço para o nosso recomeço.

Cᴏʀᴀçãᴏ ᴇᴍ ᴊᴏɢᴏOnde histórias criam vida. Descubra agora