Cᴏʀᴀçãᴏ ᴇᴍ ᴊᴏɢᴏ

Capítulo 5: Entre cuidados e emoções

*POV SN*

Trabalhar com atletas é sempre um desafio, mas algo em Gabi Guimarães me impacta de um jeito diferente. Talvez seja a determinação nos olhos dela, ou o fato de que ela carrega um peso muito maior do que deveria. Ela tenta esconder, mas é óbvio que, para alguém como Gabi, ficar longe das quadras é um tormento.

Hoje, quando entrei no quarto dela, sabia que teria que ser cuidadosa com as palavras. Gabi tem aquele olhar de quem está perdendo a paciência, mesmo que tente disfarçar. E eu entendo. Cada dia na reabilitação parece uma eternidade quando tudo o que você quer é voltar a ser quem era antes do acidente.

“Oi, Gabi. Como foi a sessão de hoje?” perguntei, tentando abrir uma conversa leve, mas sabendo que provavelmente receberia uma resposta frustrada.

Ela suspirou, e naquele instante, eu soube. Sabia que ela estava no limite, cansada de tentar esconder o que realmente sentia. “Foi boa, mas... não sei, parece que estou presa no mesmo lugar.”

Essas palavras ecoaram em mim. Eu já ouvi isso tantas vezes de outros pacientes, mas com Gabi é diferente. Há algo na maneira como ela diz isso, algo que me faz querer ajudá-la de um jeito que vai além do meu trabalho. Não sei exatamente o que é, mas sinto que preciso estar lá, não apenas como médica, mas como alguém que ela possa confiar.

“Eu sei que é difícil ver o progresso dia a dia, mas ele está lá. Cada pequeno passo que você dá nos aproxima do seu objetivo. E você está fazendo um ótimo trabalho,” digo, e realmente acredito nisso. Gabi está progredindo, mesmo que ela não perceba. Mas a mente de um atleta é sua própria barreira. Eles exigem mais de si mesmos do que qualquer outra pessoa.

Ela me olha, com aquela expressão de quem não está completamente convencida. “Eu tento manter isso em mente, mas às vezes é complicado. Eu vejo todas vocês ao meu redor, me incentivando, mas eu sinto que não estou correspondendo.”

Gabi sempre carrega esse peso nas costas. Não é apenas sobre voltar a jogar, é sobre corresponder às expectativas de todos — do time, da família, dos fãs... e dela mesma. Eu consigo ver isso em cada gesto, cada palavra que ela diz.

Eu me inclino um pouco mais, tentando quebrar essa barreira invisível que ela colocou ao seu redor. “Você está se cobrando demais, Gabi. Todos nós estamos aqui porque acreditamos em você. Mas você precisa acreditar também. A recuperação é um processo, e você não precisa ser perfeita em cada passo. A vitória vai ser quando você voltar às quadras, não em cada sessão.”

Ela precisa entender isso. Precisa aceitar que a recuperação é tão mental quanto física, e que ela não precisa carregar esse fardo sozinha. Eu digo essas palavras esperando que elas a alcancem, que tragam algum tipo de conforto, porque sei o quanto é difícil para ela se permitir descansar. Se permitir não ser perfeita.

Gabi me olha e, por um breve momento, vejo algo mudar. Talvez um pequeno alívio, talvez uma aceitação lenta. Ela sorri, e é um sorriso leve, quase tímido, mas está lá. “Obrigada, doutora... eu acho que precisava ouvir isso.”

Sorrio de volta, sabendo que fiz minha parte por hoje. “Vou te dar um tempo para descansar. Mas lembre-se, Gabi, você está mais forte a cada dia, mesmo que não consiga ver. Eu consigo.”

Enquanto saio do quarto, não posso evitar pensar em como ela é forte. Não só fisicamente, mas mentalmente. Eu vejo o que ela ainda não vê. Ela vai voltar às quadras. E vai ser mais forte do que nunca.

Mas há algo mais. Algo em mim que fica mais forte a cada dia que passo ao lado dela. Não é apenas a vontade de vê-la bem como médica. É mais pessoal. Não sei exatamente o que é, mas a cada conversa, cada sorriso que trocamos, sinto que estou me aproximando dela de uma maneira que não esperava.

Preciso me lembrar do meu papel. Sou a médica dela. Meu trabalho é ajudá-la a voltar a jogar, a se recuperar. Mas, de algum jeito, Gabi está começando a ocupar mais espaço na minha mente do que deveria.