Silêncios Que Falam

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No dia seguinte à festa, o ginásio parecia mais vazio do que o habitual. O treino matinal já havia começado, mas a ausência de Flávia não passou despercebida por ninguém. Júlia tentou se concentrar, mas não conseguia evitar olhar para a porta a cada minuto, na esperança de vê-la entrar. Sabia que Flávia não havia voltado para casa depois da festa, e, apesar de tudo o que havia acontecido, a preocupação crescia em seu peito.

As meninas do time de ginástica também notaram. Rebeca, sempre atenta, foi a primeira a comentar enquanto elas faziam os alongamentos.

"Cadê a Flávia? Vocês sabem de alguma coisa?" perguntou, levantando uma sobrancelha.

Carol, do time de vôlei, que havia passado pelo treino para conversar com algumas das meninas, olhou ao redor como se também esperasse ver Flávia aparecer a qualquer momento. "Ela parecia bem triste ontem... eu a vi saindo da festa meio mal."

Júlia sentiu um aperto no peito, relembrando o momento em que viu Flávia saindo chorando. Ela sabia que aquilo tinha sido por sua causa. Ela viu o beijo entre ela e Luana, e não pôde disfarçar a dor.

"Eu não sei o que está acontecendo, mas acho que ela só... precisa de um tempo," respondeu Júlia, tentando manter a calma, mesmo que internamente se sentisse um caos.

Enquanto tentavam adivinhar o paradeiro de Flávia, Luana, que também havia notado a tensão crescente entre as meninas, se aproximou de Júlia de maneira discreta. Havia um peso em sua expressão, como se ela soubesse que precisava falar.

"Júlia," começou Luana, com a voz baixa, "sobre ontem... Eu sinto muito por tudo. Eu acho que fui longe demais. Não quero ficar no meio dessa bagunça. Talvez seja melhor a gente continuar só como amigas, sabe?"

Júlia a encarou, sentindo uma mistura de alívio e culpa. Por um lado, sabia que Luana estava sendo honesta e genuína; por outro, a ideia de que tudo o que estava acontecendo era resultado das suas próprias decisões a deixava incomodada.

"Não precisa se desculpar, Luana. Eu também... errei. Isso é complicado demais. Eu não sei o que estou fazendo." Júlia suspirou, passando a mão pelos cabelos. "Acho que precisamos de um tempo pra organizar as coisas. Sem pressão."

Luana assentiu, um leve sorriso se formando em seus lábios. "Isso faz sentido. De verdade, Júlia. Eu só quero que você saiba que estou aqui como amiga, se precisar de mim."

Júlia agradeceu com um aceno de cabeça, sentindo o peso da conversa aliviar um pouco sua mente. Mas, mesmo com as coisas entre ela e Luana aparentemente resolvidas, ainda havia um buraco maior a ser preenchido: Flávia.

Ela sabia que o estrago já estava feito, e que não seria fácil consertar. O fato de Flávia estar ausente no treino apenas confirmava que ela ainda estava machucada. Júlia precisava falar com ela, mas cada tentativa nos últimos dias tinha sido um fracasso.

Mais tarde, após o treino, enquanto todos saíam do ginásio, Júlia pegou seu celular e decidiu que tentaria uma última vez. Ela abriu a mensagem de Flávia e digitou, hesitante, mas determinada.

"Flávia, eu sei que você não quer falar comigo agora, mas eu realmente preciso te ver. Podemos nos encontrar? Quando você estiver pronta, eu estarei aqui."

Ela hesitou por um segundo antes de apertar "enviar". Agora, só lhe restava esperar.

Após enviar a mensagem, Júlia guardou o celular no bolso e saiu do ginásio. Ela sabia que a resposta de Flávia poderia demorar – se é que viria alguma resposta. Enquanto caminhava pelo corredor em direção à saída, a mente dela estava a mil. Tudo o que vinha acontecendo nos últimos dias parecia sufocá-la.

Na saída do ginásio, ela encontrou Rebeca e Gabi conversando próximas à porta, ambas com expressões sérias.

"Você tá bem, Júlia?" Rebeca perguntou ao notar a aproximação da amiga. "Acho que todo mundo percebeu que tem algo errado."

Júlia tentou esboçar um sorriso, mas acabou suspirando profundamente. "Não sei, tá tudo tão confuso. Eu só queria que as coisas fossem mais simples."

Gabi, sempre com aquele olhar cuidadoso e protetor, colocou a mão no ombro de Júlia. "Às vezes a gente não tem o controle de tudo, mas dá pra fazer as pazes com o que tá ao nosso alcance. Talvez seja hora de dar um passo atrás e ver as coisas com mais calma."

Júlia assentiu, mas o peso em seu peito parecia não diminuir. "Acho que eu preciso dar um tempo de tudo isso. Flávia não quer falar comigo, e eu não sei como consertar o que eu fiz."

Rebeca trocou um olhar rápido com Gabi antes de responder: "Talvez ela só precise de um tempo para processar as coisas. Todo mundo precisa de um espaço às vezes, até mesmo você, Júlia."

Júlia sabia que elas estavam certas, mas a sensação de impotência não a deixava em paz. A ideia de que poderia ter perdido Flávia de vez fazia seu coração apertar.

Enquanto se preparava para ir embora, Rebeca se aproximou dela mais uma vez, dessa vez mais diretamente. "Eu sei que você e a Flávia estão passando por um momento difícil, mas, se precisar de alguém pra conversar, estamos aqui. Não se esqueça disso, tá?"

"Obrigada, de verdade." Júlia respondeu, abraçando Rebeca de leve. A proximidade das amigas ajudava, mas não era suficiente para aliviar a angústia.

Na casa de Flávia

Enquanto isso, na casa de Flávia, o clima era completamente diferente. Ela não tinha ido ao treino e estava deitada no sofá da sala, olhando para o teto, com o celular jogado ao lado. As lágrimas que haviam escorrido no dia anterior ainda pareciam pesar em seu rosto. O beijo de Lara, o distanciamento de Júlia, o que ela havia visto na festa… tudo estava embaralhado em sua cabeça.

Lara tinha ido embora, mas as marcas da confusão que ela trouxe ainda estavam presentes. Flávia queria ignorar tudo isso, esquecer que tinha sentimentos tão complicados por Júlia, mas não conseguia. O beijo que Lara lhe deu só a deixou mais perdida.

Seu celular vibrou no sofá, mas ela hesitou antes de pegar. Era a mensagem de Júlia.

"Flávia, eu sei que você não quer falar comigo agora, mas eu realmente preciso te ver. Podemos nos encontrar? Quando você estiver pronta, eu estarei aqui."

Ela leu a mensagem diversas vezes, mas não sabia o que responder. Parte dela queria correr até Júlia e resolver tudo. Outra parte queria distância, como uma forma de proteger o próprio coração. Por fim, apenas suspirou, colocando o celular de lado mais uma vez. Não estava pronta para enfrentar isso.

A cabeça de Flávia estava em um turbilhão de emoções que nem ela conseguia entender.

Dias se passam…

O tempo continuava passando, mas a tensão entre as meninas parecia não aliviar. Flávia continuava ausente dos treinos, e Júlia, sem conseguir esconder a tristeza, permitia que Luana se aproximasse cada vez mais dela. Era quase como uma maneira de se distrair, de reprimir seus sentimentos por Flávia, mas tudo parecia vazio.

No entanto, com o passar dos dias, Júlia notou que nada que fizesse parecia preencher o vazio que Flávia deixara. Ela ainda não conseguia entender completamente o que sentia, mas uma coisa era clara: seu coração ainda estava profundamente ligado a Flávia. E quanto mais Luana tentava se aproximar, mais Júlia percebia que aquela situação estava apenas mexendo mais com Flávia.

Luana, por outro lado, se mantinha cautelosa. Apesar de se sentir atraída por Júlia, ela sabia que havia algo maior entre ela e Flávia. Sua intenção nunca foi criar uma confusão, mas ao ver como Júlia se afastava, ela também não queria deixar a amiga sozinha.

Flávia, ainda confusa com seus próprios sentimentos, continuava evitando qualquer contato direto com Júlia. Contudo, o silêncio entre as duas só fazia crescer a saudade e a mágoa. Ela sabia que uma hora teria que encarar a verdade, mas por enquanto, ela ainda não estava pronta.

E assim, mais uma semana se passou, com todos aguardando o momento em que essa tensão finalmente encontraria seu ponto de ruptura.

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