Laura Mendonça
Já se passaram várias horas e eu não sei especificamente quantas horas são, apenas fico olhando a vastidão verde pela minha janela sem vontade de fazer muita coisa, sair, ou conversar com alguém, aqui é o meu refúgio o único lugar em que me sinto à vontade não tenho vontade de ver, olhar ou sentir os olhares de outras pessoas sobre mim, todos eles me olham com muita pena, como se eu fosse uma inútil. E às vezes eu me sinto assim sem poder fazer nada tudo que eu fazia antes agora virou uma mera lembrança.Ouço batidas na porta e permito que a pessoa entre em meu quarto, ouço o som dos sapatos embatendo pelo mosaico do meu quarto e logo percebi ser a minha mãe, ela raramente vinha me ver estava mais focada em sua boutique lá no centro da cidade não tinha tempo para muita coisa, e também eu não ligava muito, eu preferia estar sozinha do que ouvir eles falarem que ainda havia possibilidades de eu voltar a andar, quando eu sabia que isso tudo não passava de uma mentira tudo para me iludir, para me deixar esperançosa e depois novamente eu cairia em uma tristeza profunda, eles queriam e querem colocar coisas em minha cabeça. Queria eu voltar a ser a mesma de antes, mas isso era quase impossível, poxa, eu estava agora presa em uma cadeira de rodas e isso não vai mudar mesmo que eles queiram, sinto o toque da minha mãe em meu ombro e dou um suspiro.
- Laura, precisamos conversar. Não podes continuar assim, essas enfermeiras todas foram embora por sua causa. Você não pode expulsá-las e deixar a situação piorar.
- Eu não expulsei ninguém. Elas saíram porque não conseguiram lidar com a minha realidade. Elas eram fracas.—olho para a mulher.
- Você tem que fazer a sua parte também. Deveria deixar o trabalho delas mais aceitável, parar de reclamar o tempo todo. Não pode ser sempre assim.
- Não é a senhora quem está em uma cadeira de rodas, mãe! Não é a senhora quem está lutando para aceitar essa vida todos os dias.
- Você precisa melhorar esse ânimo. Deixe essa amargura para trás e volte a fazer as consultas com a psicóloga. Isso vai ajudar.
- Eu não quero nada disso, mãe. Só quero que todos me deixem em paz. Eu estou cansada de ser forçada a enfrentar tudo isso, quando o que eu realmente preciso é de um pouco de tranquilidade.
- Entendo, mas amanhã o novo enfermeiro chegará. Espero que você esteja disposta a colaborar um pouco mais. Eu preciso sair agora.
Minha mãe se vira e sai do quarto, fechando a porta com um suspiro resignado.
Estou cansada disso tudo, não sei quando vai terminar e chegará mais uma, quer dizer será enfermeiro desta vez um homem, vamos ver se ele consegue ou vai fugir como as outras enfermeiras saio de perto da janela e me aproximo da minha cama saiu da minha cadeira e me aconchego nela deitada olhando para o teto. Na verdade tenho saudades da minha vida de sair por aí livre, de ter um namorado de fazer todas as coisas que me permitiam ter liberdade estou cansada realmente estou cansada.
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A noite caiu silenciosamente sobre a Fazenda Nova Esperança, envolta em um manto de escuridão que parecia refletir o meu estado de espírito. Eu ainda estava no meu quarto, cercada por troféus e medalhas que agora pareciam meros enfeites de uma vida que não era mais minha. O tempo passava lentamente, e eu me afundava na solidão, sem vontade de sair ou fazer qualquer coisa.
Quando a batida na porta soou, eu a ouvi sem a menor vontade de responder, mas sabia que não poderia ignorar a empregada, Maria. Ela entrou sem esperar por uma permissão formal.
- Senhora Laura, o senhor Ricardo pediu que você descesse para jantar. Ele e a senhora Ana estão esperando.
Eu suspirei, sabendo que não poderia continuar me isolando. A ideia de enfrentar minha família, especialmente após a pequena conversa com minha mãe, era a última coisa que eu desejava. No entanto, eu me levantei, me arrumei o melhor que pude e desci para o jantar.
Sala de jantar
O jantar estava disposto em uma mesa longa e elegantemente posta. O ambiente estava iluminado, meu pai, Ricardo, estava no cabeceira da mesa, enquanto minha mãe, Ana, e minha irmã, ela não estava em casa como de costume
- Laura, que bom que você apareceu.
Eu me acomodei perto da cabeceira da mesa, tentando não pensar no desconforto que sentia. O jantar começou em um tom cordial, mas eu podia sentir uma tensão subjacente.
- Espero que tenha sido uma boa ideia. Às vezes é bom mudar um pouco a rotina, não acha?
- Sim, mãe.—Eu respondi de forma monossilábica, evitando olhar para qualquer um deles.
A conversa fluiu entre eles, com discussões sobre negócios e a vida social de Marta, que não estava em casa, enquanto eu tentava me concentrar em comer o pouco que havia servido.
- Você devia sair um pouco mais, Laura. Ficar trancada no quarto não faz bem para ninguém. A vida não para, você sabe.
Eu olhei para minha mãe, a quem sempre vi como alguém que não entendia verdadeiramente a minha dor, mas que agora estava tentando dar conselhos.
- Não é tão simples, mãe. Às vezes, só estar aqui já é uma batalha.
- Laura, sua mãe e eu estamos preocupados com você. Queremos que você se sinta melhor, e parte disso é tentar voltar às suas atividades normais. Precisamos encontrar uma maneira de te ajudar a sair dessa rotina.
- Eu sei, pai. Mas talvez a solução não esteja apenas em tentar "voltar ao normal". Às vezes, o que eu preciso é de tempo e espaço para processar tudo isso.
A conversa prosseguiu com uma mistura de tentativas de encorajamento e discussões sobre o que seria melhor para minha recuperação. O jantar continuou, mas eu comi em silêncio, refletindo sobre as palavras de minha família e a crescente sensação de estar presa entre a expectativa deles e a realidade da minha condição.
Quando finalmente terminei a refeição, me despedi e retornei ao meu quarto, onde o silêncio mais uma vez me envolveu. Eu sentia uma mistura de frustração e tristeza, incapaz de encontrar uma resposta que satisfizesse todos os envolvidos, mas determinada a encontrar um equilíbrio, mesmo que fosse apenas um pequeno passo de cada vez.
A noite estava silenciosa, exceto pelo ocasional som distante da fazenda, que parecia distante e quase irreal.
Meus olhos se dirigiram para o telefone ao meu lado. Eu o peguei e comecei a percorrer as redes sociais, uma prática que havia se tornado uma forma de escapar, mesmo que temporariamente, da realidade que eu vivia.
Enquanto rolava pelas postagens, fui bombardeada com imagens e atualizações que só acentuavam o contraste entre minha vida atual e o que havia sido. Fotos de amigos e conhecidos em festas, eventos sociais e viagens deslumbrantes apareciam na tela. O mundo lá fora parecia vibrante e cheio de promessas, enquanto eu estava confinada ao meu quarto, lutando contra a monotonia e a sensação de perda.
Eu cliquei em um álbum de fotos antigas, cheio de memórias dos dias em que eu competia em equitação, recebendo medalhas e vivenciando a euforia das vitórias. Olhar aquelas imagens me fez sentir um misto de nostalgia e dor. Eu me lembrei do orgulho dos meus pais, da alegria em meus olhos e da liberdade que eu sentia montando um cavalo, desafiando os limites do que eu achava possível.
Aquela vida parecia tão distante agora. Eu me via como uma sombra daquela pessoa vibrante e cheia de esperança. A frustração e a tristeza se entrelaçavam enquanto eu deslizava pelas fotos, sentindo uma profunda saudade do que era antes.
Agradeço por chegar aqui! Continue lendo♥️
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Além Do Toque
RomanceNo coração do Bengo (Angola), em uma vasta e próspera fazenda chamada "Fazenda Nova Esperança", a vida de Laura Mendonça, uma jovem de 20 anos, mudou drasticamente após um trágico acidente de cavalo. Outrora uma jovem cheia de vida e paixão pela equ...