Capítulo 19

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Laura Mendonça

   

     Os últimos dias tinham sido incríveis. Eu estava me sentindo mais animada, mais viva do que nunca. Leonardo e eu estávamos mais próximos, e parecia que, finalmente, as coisas estavam caminhando para algo além das sessões de fisioterapia. Eu estava me permitindo sonhar de novo, e isso era novo para mim.

  Não queria me apaixonar por Leonardo, mas acho que estou... Essa é uma relação que outrora eu nunca teria, primeira por ele ser o meu enfermeiro e segundo porque não temos nada sério, o que de facto me incomoda muito, pois ficar me agarrando com um homem com quem não tenho nenhuma coisa séria não é para mim, não é uma coisa minha, isso é a minha irmã quem faz, sou mais do tipo tradicional, tem que ter uma relação mais estável, só tive um namorado, e o mesmo me deixou assim que descobriu que ia acabar em uma cadeira de rodas. Ao perceber a hesitação de Leonardo consoante a algo mais que poderíamos vir a ter, eu percebi que de uma maneira ele não tinha certeza do que queria ou sabia exatamente o que queria e não conseguia me dizer.

     Não quero me sentir descartada ou usada por ele, sei que o que temos é real que ele gosta de mim, temos conexão, porém sei que só isso não é suficiente... Entretanto espero que com o tempo ele possa mudar e realmente termos algo mais, apesar de saber que seria algo estranho para a família. Estou feliz por tê-lo na minha vida, por de alguma forma ele não ter desistido me mim, e estar me proporcionando tanta alegria, ele é um homem incrível, às vezes é irritante, mas mesmo assim não perde o seu charme.

    Terminamos a sessão de fisioterapia, mais cedo hoje, conversamos um pouco, e eu subi para o meu quarto para fazer algo. Nem demorei tanto assim. Estava indo para a cozinha, cantarolando baixinho, a animação e empolgação pulsam sobre mim,  quando parei na porta de repente. Meu coração congelou no peito, mal podia acreditar no que os meu olhos estavam vendo, como pode ser... Lá estava ele... Leonardo, mas ele não estava sozinho. Ele estava beijando minha irmã, com uma intensidade que eu nunca imaginei. A cena me atingiu como uma faca, meu peito dói... Dói muito, e tudo ao meu redor pareceu se desintegrar. O que eu estava vendo? Como aquilo podia estar acontecendo? Meu coração quebrou em mil pedaços.

   Sai de perto da porta mais rápido que podia naquela cadeira de rodas, lágrimas escorriam pelo meu rosto, subi a rampa novamente e entrei para o meu quarto chorando, ele me enganou, como eu pude ser tão cega, eu chorava compulsivamente me sentindo sem chão, me iludi com um homem que ficava com duas irmãs ao mesmo tempo, por isso ele nunca falou de ter nada sério, mas fui eu quem se deixou levar pelo desejo, ele nunca me prometeu nada, ele apenas se aproveitou da minha vulnerabilidade, da minha vontade de ser amada e querida por um homem, como pude me enganar desse jeito fiquei cega, ele estava com a Marta, a imagem deles não sai da minha cabeça... Poxa podia ser com qualquer mulher, mas minha irmã!

       
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   Passei um bom tempo chorando até que percebi que não poderia ficar assim, e consegui me recompor, isso acaba hoje, não quero mas ter nada a ver com esse homem, que ele fique com quem quiser se quiser ficar com a Marta que fique, não vou permitir que ele me use como bem quiser, só por estar nessa cadeira, eu sou mais que essa cadeira, como ele mesmo já falou varias vezes. Meu rosto estava já todo limpo, passei um pouco de base só para ninguém notar que estive chorando principalmente ele, olhava a vista pela janela como era o meu costume antes de Leonardo vir trabalhar aqui.

   Sinto alguém abrindo a porta e a fechando rapidamente, era ele, pois tinha o costume de fazer isso, engraçado, deve ter se divertido muito com a minha querida irmã, e vindo para o meu quarto como se nada tivesse acontecido, cínico, acha que sou idiota. A raiva e a dor borbulhavam dentro de mim, e eu não pude mais me conter, me vireo para o encarar, ele estava sorrindo...

- Então é isso, Leonardo? — gritei, minha voz tremendo de raiva. — Você está me beijando de manhã e beijando minha irmã à tarde?

   Ele ficou, confuso, e seu rosto ficou pálido.

- Laura, espera. Não é o que parece... — começou ele, tentando se justificar.

- Não é o que parece? — Eu ri, um riso amargo que saiu mais como um grito. — Eu vi vocês, Leonardo! Vi você beijando ela como se eu não significasse nada! Como se tudo entre nós fosse... fosse uma mentira!

     Ele tentou se aproximar, mas eu me afastei, minha raiva se intensificando.

- Eu nunca quis te machucar, Laura. Eu... — começou ele, mas eu o interrompi.

— Machucar? — Eu cuspi as palavras, meu peito queimando. — Você destruiu tudo! Eu confiei em você, abri minha vida, meu coração! E você joga isso fora, beijando minha própria irmã!

    Leonardo levantou as mãos em um gesto de defesa, sua voz ficando mais urgente.

- Eu cometi um erro, Laura! Ao permitir que ela me beijasse, mas não significa nada, eu juro! Foi um momento em que ela me pegou de surpresa... — ele tentou explicar, mas eu não queria mais ouvir.

- Vai embora, Leonardo! — gritei, apontando para a porta. — Eu não quero mais te ver! Vai embora e não volte nunca mais!

    Ele hesitou, sua expressão passando de arrependimento para surpresa. Talvez ele pensasse que eu estava apenas com raiva, que em algum momento eu cederia. Mas eu não cedi, eu queria ele longe! O mais longe possível de mim

-  Laura, você não pode estar falando sério... — ele murmurou, com os olhos implorando por uma chance.

- Eu estou. Vai embora e não volta mais. — Repeti, minha voz firme, embora meu coração estivesse despedaçado.

   Ele ficou ali, parado, como se não acreditasse no que estava ouvindo. Mas, por fim, mesmo a contragosto, ele não teve escolha. Pegou suas coisas e saiu pela porta, deixando para trás mais do que apenas um quarto vazio.... O meu coração.

   E quando a porta se fechou, a dor se instalou profundamente em mim, coloquei as mais sobre o lado esquerdo do peito recomeçando a chorar como uma criança desamparada... Dói muito, mais do que imaginei, nunca mais quero sentir isso, ele chegou me tirou da minha bolha, para me deixar cair novamente, em um chão cheio de pedras duras, me sinto traída...

    Mentiras, e mais mentiras... Ele é um mentiroso, me seduziu com o seu toque em minha pele, ele despertou novamente o meu desejo de ser tocada e amada, eu me sinto mal por isso agora, entreguei muito a ele, criei expetativas sobre coisas que não tinham futuro algum, mas pessoa carente é assim mesmo... Me pergunto como Marta consegue viver dessa forma despreocupada passando de homem em homem, todos já devem achar que ela é fácil demais, e ela parece não se abalar com nada, simples assim.

    Mais uma lição para guardar na caixinha... Me entreguei por completo a dor que sentia, pelo menos por hoje preciso disso, sentir tudo isso, como um choque duro de realidade.

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