Capítulo 25

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Laura Mendonça

   Estou deitada na cama, o cheiro esterilizado do hospital parece mais intenso hoje. O barulho dos equipamentos ao meu redor é constante, e sinto uma leve pressão no peito. Sei que este é um dos momentos mais importantes da minha vida, mas a ansiedade corrói cada pedacinho de mim. Será que vai dar certo? Será que eu vou voltar a andar?

   A porta se abre e vejo Mateus, entrando com um sorriso suave no rosto. Ele se aproxima da minha cama, com aquele olhar sereno que sempre me acalma.

- Como você está, Laura? — ele pergunta, pegando minhas mãos entre as dele.

   Respiro fundo, sentindo as mãos quentes dele segurarem as minhas com firmeza. Tento forçar um sorriso, mas só consigo mostrar o nervosismo que está me consumindo.

- Um pouco ansiosa, Mateus... na verdade, muito ansiosa — confesso, minha voz soando mais fraca do que eu gostaria. — Não sei o que vai acontecer. E se...

  Ele me interrompe com um leve aperto nas mãos.

- Ei, não pense nisso agora — diz, olhando profundamente nos meus olhos. — Vai dar tudo certo. Eu conheço cada detalhe dessa cirurgia, e você tem uma equipa inteira aqui dedicada a te ajudar. Você é forte, Laura, muito mais do que imagina. Confia em mim.

   Seus olhos mostram uma ternura que me desarma por completo. Mateus sempre foi alguém em quem eu podia confiar, e hoje não é diferente. Tento inspirar mais fundo, buscando acreditar em cada palavra que ele diz. O silêncio entre nós é reconfortante por um momento.

- Vai doer? — pergunto, quase num sussurro.

   Ele sorri novamente, balançando a cabeça.

- A equipa vai garantir que você não sinta nada. O mais importante é que, quando você acordar, estaremos todos aqui. Eu estarei aqui. Só se concentre em imaginar como será quando tudo isso acabar.

   Mateus solta minhas mãos com cuidado e acaricia meu ombro, se inclinando um pouco para ficar à minha altura.

- Em alguns minutos vão te levar para a sala de cirurgia. Quero que se concentre em uma coisa: no futuro que você vai construir depois disso. Um passo de cada vez, entendeu?

- Entendi — respondo, tentando absorver a calma dele, mas meu coração ainda parece correr uma maratona.

   Mateus se levanta e, antes de sair, me dá um último olhar firme e carinhoso.

- Vai dar tudo certo.—sussurrou

   E com isso, ele sai, deixando o quarto em silêncio novamente. Fecho os olhos, tentando segurar as lágrimas e me preparar para o que está por vir. A cirurgia. O possível milagre. O começo de uma nova vida... ou não.

   Pego da minha bolsa o livro que recebi de Leonardo, só o li no dia que o recebi, não tive coragem de continuar lendo o que ele escreveu, porém hoje eu quero sentir ele comigo mesmo que não fisicamente, respiro fundo e abro o livro.

  Na página 42 havia uma foto minha na piscina, boiando sorrindo genuinamente de olhos fechados, era algo que ele me pediu para fazer. Por baixo uma frase:

"Eu não sinto falta apenas de te ver, mas de sentir quem você é quando ninguém mais está olhando."

   Respiro fundo, e sigo para a página seguinte, havia uma foto do canteiro das flores lá da fazenda, um lugar que eu gosto muito, por baixo 2 frases:

"Amar não é olhar um para o outro, é olhar juntos na mesma direção." – Antoine de Saint-Exupéry"

    Nunca duvide dos momentos que tivemos, porque foram genuínos... Little dove, não seguimos na mesma direção, porque permaneci olhando para ti, eu sei que esperava muito mais de mim, e não apenas o que eu te dei, desculpa por te desiludir, por ser incompleto.....

     Desvio meus olhos do livro por um momento para respirar, pois parece que o ar está acabando, e as lágrimas vindo, vou para cirurgia daqui a instantes e estou me agonizando com as palavras de Leonardo.... Finalmente cheguei a página 50, havia uma foto dele, toquei na mesma, por baixo uma frase:

"Eu contra eu"

  Virei para a próxima página e não havia qualquer foto, mas um texto longo.

" Não sei se existem palavras certas para explicar algo que eu mesmo levei muito tempo para entender, mas vamos lá."

   "Eu sempre pensei que a falta dos meus pais não tinha me afetado tanto. Os meus avós... Eles me deram tudo. Carinho, educação, princípios. Foram suficientes para me manter de pé, para me fazer sentir que eu tinha uma base sólida. Mas... com o tempo, percebi que algo sempre faltou.

   Eu nunca tive o modelo de uma família completa. Não vi meu pai me ensinar como cuidar de alguém. Não vi minha mãe me mostrar como é amar e ser amado. E, por mais que eu tentasse me convencer de que isso não me afetava, percebi que... de alguma forma, sempre me afetou.

  Eu achava que compromissos eram algo que eu poderia simplesmente evitar, como se fosse uma escolha minha. Mas, no fundo, era medo. Medo de não saber como ser um companheiro de verdade. Medo de falhar com as pessoas do mesmo jeito que meus pais falharam comigo, mesmo sem eu entender bem como. Eu cresci achando que eu não precisava de ninguém, que era forte o suficiente sozinho. Mas, com você, Laura, tudo mudou. Você me mostrou o que eu estava perdendo. Só que... quanto mais eu sentia isso, mais eu temia te decepcionar. Tive medo de que se me aproximasse demais, eu ia acabar te machucando do mesmo jeito que eu fui machucado quando meus pais me deixaram.

  Eu nunca quis que isso afetasse o que tínhamos, mas a verdade é que eu nunca soube como amar alguém sem ter medo de estragar tudo. Eu achei que, se evitasse o compromisso, estaria te protegendo de mim mesmo. Mas... talvez eu tenha errado ao pensar assim. Eu não queria te afastar, Little Dove. Mas esse medo... de não ser o suficiente, de te perder como perdi meus pais... sempre esteve aqui, me paralisando.

   Fechei o livro rapidamente sentindo lágrimas escorrerem pelo meu rosto, ler tais palavras foi como o ouvir falar bem na minha frente, senti a dor e a tristeza em cada palavra dele, o mesmo nunca me falou da sua família... Mas isso não é o que importa agora, ele... Ele se importou comigo, ao ponto de perder tempo para me escrever todas estas palavras que preenchem este livro, sinto sua presença comigo, não queria chorar hoje de tristeza e nostalgia mas não consegui evitar isso, cada palavra desde livro me faz sentir além de qualquer sentimento normal, não tem como explicar.

   Uma enfermeira entra no quarto de repente e eu desvio o meu olhar limpando o rosto, colocando em seguida o livro em minha bolsa.

- Está pronta senhora.

    Respiro fundo profundamente e olho pra a mulher jovem e bonita.

- Sim, mesmo que nervosa.

  Ela sorri de forma gentil.

- É normal.

   Era hora de ir para a sala de cirurgia, um lugar de onde eu sairia em uma nova fase da minha vida, se tudo correr bem essa fase será se pura felicidade apenas... Leonardo, aonde quer que estejas agora, torça por mim neste momento...

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