Capítulo 1

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Laura Mendonça

   
  Olho pela janela, observando a vastidão verde que se estende além das cercas da Fazenda Nova Esperança. A luz do sol se espalha sobre os campos, criando um brilho dourado que me remete a um tempo que parece pertencer a outra vida. Um tempo em que aquela paisagem era meu refúgio, minha liberdade, onde eu montava meu cavalo com a destreza de quem nasceu para aquilo. Agora, tudo o que me resta é essa vista, distante e inalcançável, como uma memória que insiste em me torturar.

    Eu era a campeã em equitação. A estrela das competições, o orgulho da minha família. Meu pai sempre dizia que eu era a melhor amazona que ele já tinha visto, e as prateleiras do meu quarto são uma prova disso. Medalhas de ouro, troféus polidos e fitas de primeiro lugar que, agora, parecem zombar de mim. Cada uma delas me lembra da glória que eu tinha, da força que fluía pelo meu corpo, da adrenalina que corria em minhas veias quando saltava obstáculos, quando dominava o vento com as rédeas firmes em minhas mãos. E agora... tudo isso se foi.

   Minha vida mudou de um jeito que eu nunca imaginei ser possível. Do dia para a noite, passei de uma jovem ativa e cheia de sonhos para alguém preso a essa cadeira de rodas. É irônico pensar que, antes, eu controlava com perfeição um animal de meia tonelada e, agora, mal consigo me mover sozinha. A fazenda que eu tanto amava, a faculdade de Medicina Veterinária que eu frequentava com tanta paixão, tudo parece um eco distante de uma vida que não me pertence mais.

   Abandonei a faculdade há um ano, o mesmo tempo que se passou desde o acidente. Eu estava no auge dos meus estudos, pronta para seguir o caminho que sempre sonhei, combinando meu amor pelos animais com o conhecimento científico. Mas como posso continuar assim? Como posso me concentrar em salvar vidas quando a minha própria vida se tornou um fardo? Porque é exatamente isso que eu me tornei: um fardo. Um peso que todos têm que carregar. Minha mãe tenta disfarçar, mas eu vejo o cansaço em seus olhos. Meu pai evita olhar para mim por muito tempo, como se eu fosse uma lembrança viva do que ele perdeu, do que ele não pode consertar. E Marta... Marta não poderia se importar menos. Ela se perdeu em festas e diversão, enquanto eu fico aqui, presa neste quarto, presa em meu corpo inútil, até perdi o meu namorado André, eramos um casal conhecido e popular, todos nos invejavam, eu gostava dele e ele dizia gostar de mim, entretanto ele me deixou sem pensar duas vezes, como o infeliz que é, assim que soube que eu ia ficar nessa cadeira, "Laura, eu preciso de uma mulher inteira, alguém que possa me dar tudo, inclusive no sexo. Não dá para fingir que essa cadeira não muda as coisas. Eu não posso viver assim, e você não pode me dar o que eu quero, não mais."

   Estás foram as palavras desse idiota, que ao que parece estava aproveitando muito bem a vida, viajando por aí e dormindo com qualquer rabo de saia que se aproxime, homens podem ser tão... Melhor nem falar e isso já nem dói, doía antes.

   Meus troféus e medalhas são tudo o que resta de uma vida que eu não consigo mais alcançar. Cada vez que meus olhos passam por eles, sinto uma dor profunda, um vazio que nada pode preencher. Eu costumava pensar que era invencível, que nada poderia me deter. Mas agora, presa nessa cadeira, percebo o quanto eu era ingênua. O quanto eu nunca soube o que era realmente estar vulnerável, frágil, impotente.

   Eu me tornei a sombra daquilo que eu era, um reflexo pálido da garota que dominava as competições e conquistava o respeito de todos. Tudo o que sou agora é um corpo quebrado, um espírito esfacelado. A fazenda, que antes era meu reino, se transformou em minha prisão. E este quarto, que antes era cheio de vida, é agora um mausoléu de minhas conquistas passadas, cada uma delas uma lembrança amarga do que eu perdi.

   Enquanto olho para o horizonte, uma lágrima solitária escorre pelo meu rosto. Eu rapidamente a enxugo, não porque alguém possa vê-la, mas porque não quero admitir, nem para mim mesma, o quanto estou quebrada. Eu não sei o que o futuro me reserva, ou se há algum futuro para mim. Mas uma coisa é certa: a vida como eu conhecia acabou. E eu não sei se algum dia serei capaz de reconstruí-la.

   Enquanto olhava o horizonte, a porta do meu quarto se abre e ouço a voz de Maria, uma das empregadas da casa.

- Bom dia senhora Laura, trouxe o seu pequeno almoço.

   Viro a cadeira o que me permite olhar para a mulher de meia idade que colocava a bandeja por cima da mesa de centro.

- Onde está a enfermeira!—pergunto rude.

- Bom, ela se demitiu.

- Bando de incapazes, podes ir embora!

- Claro, com licença.

   Mais uma que não aguentou o trabalho, não sei aonde vão buscar estas enfermeiras, que nem conseguem trabalhar direito, até parece que não são bem pagas, me aproximo da mesa e tiro o copo de sumo de limão dando um gole está como gosto, não muito doce e meio amargo, já vejo minha querida irmã Marta entrar sem sequer bater odeio isso e ela sabe muito bem.

- Bom dia laurinha.—se joga na minha cama.

- Já falei para não entrar no meu quarto sem bater!

- Já me disseste isso muitas vezes, mas olha pra mim, é divertido te ver assim, e não podes fazer nada.—falou debochando.

   Ela está sorrindo me provocando, por estar numa cadeira de rodas, se não fosse por esse empecilho eu lhe daria um surra, sem pensar duas vezes, ela pode ser minha irmã, mas é irritante, se ter irmã é assim acho que preferia não ter, ela não me apoia em nada, nunca me apoiou, até acho que sempre sentiu ciúmes de mim, por isso adorou a novidade deu estar confinada nesta cadeira inútil.

- Sai daqui Marta, não me irrita Yha!

- Já estás irritada, mas imagino porquê —ela caminha até mim e se agacha me olhando.— deve ser horrível estar nessa cadeira e perder as melhores coisas, deves estar com saudades de muita coisa.—sorriu.

- Veio aqui pra isso foi? Para me colocar para baixo, digo já que não vais conseguir.—não mostro nenhuma emoção ao falar.

   Marta se levanta e vai até a janela encarando o horizonte.

- Soube que mais uma enfermeira preferiu ir embora do que te aguentar.

- Olha a Marta sai do meu quarto e vai fazer as tuas coisas sem sentido.

   Ela ri em deboche sem querer saber o que eu digo, Marta sempre foi rebelde ao contrário de mim apesar deu não ser nenhuma santinha, ela sempre deu dor de cabeça aos nossos pais, por ela ser minha irmãzinha eu a protegia, mas isso de nada adiantou ela só piorou com o tempo, e eu agora vejo isso, ela nem quer saber de mim, parece não ter empatia, para ela sou como a sua diversão.

- Tá bom eu vou embora fazer a minhas atividades, como você fala "sem sentido"—fez aspas.— mas pelo menos eu não estou presa a uma cadeira de rodas inútil.

  Ela sai do meu quarto batendo a porta fazendo um enorme barulho suas palavras já não me doem, aprendi a lidar com as palavras duras das pessoas apesar de não sair muito de casa, sei que todas elas falam de mim e prefiro assim ficar no meu quarto olhando para o horizonte, olhando para minhas medalhas, estou só um reflexo daquilo que eu fui no passado.

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E aí, galáxia! Esse foi o primeiro capítulo, caro(a) leitor(a), espero que tenha curtido! Não esquece de me seguir e votar aqui no Wattpad, isso me deixaria super feliz. Obrigada por acompanhar até aqui.

E fique ligado, porque no próximo capítulo as emoções só vão aumentar! Vejo você por lá!

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