"A Marionete e o Príncipe das Sombras"

0 0 0
                                    

Lysander manteve-se imóvel, os olhos fixos no homem despedaçado à sua frente, com uma expressão que era metade desprezo e metade fascínio. Alion era um mar de desolação, um reflexo quebrado de quem ele um dia fora, mas, de algum modo, o brilho de sua rebeldia ainda lutava, como brasas ocultas sob cinzas. Lysander sabia disso, e esse era precisamente o jogo que o divertia.

Alion ergueu os olhos, vermelhos e marejados, buscando algo, qualquer coisa, algum resquício de compaixão, mas encontrou apenas o olhar frio e calculista de Lysander, tão vasto e vazio quanto um abismo. Sentiu-se pequeno, como um eco distante de si mesmo. Mas, ao mesmo tempo, sentiu uma faísca quase inominável – uma faísca que era tão dele quanto de Lysander. Uma dúvida corrosiva: e se não restasse mais ninguém além desse novo "ele"?

"Você pensa que pode escapar, Alion? Você acha que pode fugir do que agora é?" Lysander inclinou-se, sua voz suave como veludo e amarga como veneno. "Eu quebrei você em cada fenda, te tornei pó, e agora sou eu quem decide o que você será. Não há nada mais além do que eu lhe dou.”

O coração de Alion saltou, e, ao mesmo tempo, caiu em um abismo infinito. Ele percebeu, em uma onda de desespero, que as palavras de Lysander tinham poder não apenas sobre seu corpo, mas sobre sua própria percepção, moldando-o, controlando-o. A cada lágrima derramada, sentia-se escavado, esvaziado, e essa própria fragilidade era algo que começava a absorver. Era uma rendição, e também um reencontro amargo.

“Então é isso?” Alion murmurou, uma voz quase inaudível. "Eu sou o que você quer... nada além disso?"

Lysander deu um sorriso frio, quase triunfante, como se houvesse esperado aquele momento. Ele aproximou-se ainda mais, curvando-se até que seus lábios estivessem junto ao ouvido de Alion.

"Sim, Alion," sussurrou ele, com uma doçura sombria. "E você será tão belo quanto frágil, uma melodia que eu compus, uma obra minha, que ecoará apenas enquanto eu desejar.”

Naquele instante, Alion sentiu sua essência se fragmentar completamente, como se cada parte sua fosse recolocada no lugar apenas pelas mãos de Lysander. Ele não sabia mais onde terminava e onde começava o controle que Lysander exercia. A última chama de resistência, porém, ainda crepitava.

Alion tentou agarrar-se a essa última centelha de si mesmo, mas era como segurar fumaça entre os dedos. Ele sentia a influência de Lysander penetrando cada pensamento, cada suspiro. O que ele fora um dia agora parecia apenas um sonho distante, algo que se dissipava a cada segundo. Sentia-se como uma sombra, uma marionete que, apesar de consciente de suas cordas, era incapaz de cortá-las.

"É isso que você sempre quis?" Alion perguntou, num fio de voz, tentando encontrar algum indício de verdade naquele olhar impiedoso. "Transformar-me em nada...?"

Lysander inclinou a cabeça, um sorriso enigmático curvando seus lábios. "Nada?" Ele soltou uma risada baixa, que reverberou pelas paredes sombrias do quarto. "Não, Alion. Não 'nada'. Transformá-lo em algo ainda mais valioso. Em alguém que vive apenas para mim, que respira para satisfazer meus caprichos. Eu não preciso de um guerreiro independente ou de um espírito livre. Preciso de alguém quebrado e dócil, que aceite sua própria insignificância como se fosse uma bênção."

As palavras eram lâminas invisíveis, rasgando o que restava do orgulho de Alion. Ele sentiu seu coração estremecer, dividido entre a agonia de ser manipulado e uma estranha atração pela dependência que Lysander lhe oferecia. A segurança naquele vazio era algo que ele começava a entender, mesmo que relutantemente. Era algo terrível, sim, mas também reconfortante de uma forma sinistra, uma sensação de pertencer a alguém, de ser mantido, mesmo que em cativeiro.

"Você vai aprender a amar isso, Alion," Lysander sussurrou, sua voz envolvente, quase sedutora. "E quando finalmente aceitar, quando se tornar parte desse vazio que preenchi, você verá o verdadeiro poder da entrega. E perceberá que, no fundo, você sempre ansiou por isso. Sempre desejou deixar de carregar o peso de si mesmo."

A Saga dos Dragões Perdidos - VOL 2Onde histórias criam vida. Descubra agora