O Peso das Estrelas

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O sol da manhã despontava no horizonte quando Lyan acordou, sentindo-se inquieto. Acordara várias vezes na noite anterior com sonhos desconexos, flashes de momentos que pareciam reais, mas escapavam de sua compreensão. Um sorriso, um toque, um riso inconfundível: era sempre Livia. Por mais que não conseguisse compreender totalmente, cada sonho parecia trazer algo novo, algo que fazia seu coração acelerar.

Decidido a começar o dia, desceu as escadas e se deparou com uma surpresa: Livia estava à porta, carregando sacolas e caixas repletas de roupas e pequenos pacotes embrulhados. O olhar dela era cheio de expectativa e carinho.

— Bom dia, Lyan! — disse ela, com um sorriso radiante. — Trouxe algo que acho que você vai gostar de fazer.

Ele olhou para as caixas, confuso, mas curioso.

— O que é isso? — perguntou, com o cenho franzido.

— São roupas e alimentos. Eu os arrecadei nos últimos dias para doar a quem precisa. Antes do acidente, você adorava organizar ações assim. Pensei que talvez pudesse ser bom tentar fazer isso de novo. O que acha?

Ele hesitou por um momento, mas sentiu uma fagulha de empolgação crescer dentro de si. Mesmo sem lembrar, algo naquela ideia parecia natural.

— Acho que podemos tentar. Onde começamos? — respondeu, tentando esconder o entusiasmo que começava a tomar conta dele.

Livia e Lyan passaram a manhã arrumando tudo no parque central. Escolheram uma sombra generosa de uma árvore para montar a barraca improvisada. Enquanto ela organizava as roupas em pilhas, ele cuidava dos pacotes de comida. Logo colocaram cartazes simples anunciando as doações. O parque, já movimentado pela manhã, começou a atrair olhares curiosos.

— Eu já fiz isso antes, não é? — Lyan perguntou enquanto ajustava os pacotes na mesa. — Parece... familiar.

Livia olhou para ele, contendo a emoção.

— Já sim. E você sempre gostou. Era algo que fazia com o coração.

— Acho que faz sentido. — Ele deu um sorriso breve. — Parece bom fazer isso.

A primeira pessoa a se aproximar foi uma senhora idosa, que agradeceu emocionada ao receber roupas e comida. Lyan ficou tocado pelas palavras dela e, pela primeira vez desde o acidente, sentiu algo genuinamente pleno dentro de si. Conforme o dia passava, mais pessoas chegavam, e ele parecia cada vez mais à vontade.

— Obrigado por fazer isso comigo — disse ele a Livia em um momento de pausa. — Eu não sei por que, mas isso me faz sentir... mais eu.

Ela o olhou com ternura.

— Você sempre foi assim, Lyan. Generoso, altruísta. Eu só quis te ajudar a lembrar disso.

No início da tarde, algumas crianças começaram a brincar perto da barraca. Uma delas trouxe uma bola de futebol velha e tentou fazer embaixadinhas, sem muito sucesso. Lyan, observando a cena, se abaixou ao lado da criança e começou a ensinar.

— Assim, olha — disse ele, equilibrando a bola com habilidade. — Só precisa de prática.

Livia observava de longe, com um sorriso discreto. O Lyan que ela conhecia estava ali, em pequenas ações, em momentos fugazes que mostravam quem ele realmente era.

— Você gostava de futebol, não é? — perguntou Livia, quando ele voltou para a barraca.

— Acho que sim. Parece tão natural... — Ele deu uma risada curta. — É estranho, sabe? Como se fosse parte de mim, mas ainda distante.

Livia tocou o braço dele, reconfortante.

— Vai voltar. Tudo vai voltar.

Quando o sol começou a se pôr, todas as roupas e alimentos haviam sido distribuídos. O parque já estava mais calmo, e Livia estava visivelmente cansada. Sentou-se em um banco próximo, respirando fundo, mas com um sorriso de satisfação no rosto. Lyan sentou-se ao lado dela.

— Você está bem? — perguntou ele.

— Só um pouco cansada — admitiu ela, rindo. — Mas muito feliz. Foi um dia incrível.

Lyan a observou por um momento. Ela parecia exausta, mas havia uma luz nos olhos dela que ele não podia ignorar. Uma sensação de gratidão e carinho tomou conta dele.

— Obrigado, Livia. Por hoje, por tudo... por não desistir de mim.

Ela se virou para ele, surpresa.

— Eu nunca desistiria de você, Lyan. Nunca.

Ele ficou em silêncio por um momento, mas havia algo que ele precisava dizer.

— Sabe, eu ainda não me lembro de tudo. Mas eu sei de uma coisa. — Ele segurou as mãos dela com firmeza. — Você é a pessoa certa para mim.

Antes que ela pudesse responder, ele se inclinou e a beijou. Foi um beijo suave, mas cheio de emoção, como se algo dentro dele começasse a se realinhar.

Livia ficou sem palavras, com os olhos brilhando.

— Eu senti tanta falta disso — disse ela, com a voz embargada.

Lyan sorriu, puxando-a para mais um beijo, desta vez mais intenso, como se quisesse garantir que aquele momento fosse inesquecível.

Quando finalmente se separaram, ele a levou até a porta de casa.

— Até amanhã, Livia — disse ele, com um sorriso sincero.

— Até amanhã, Lyan.

Enquanto ela entrava, ele ficou por um momento, olhando para o céu estrelado. Algo dentro dele havia mudado naquele dia. Havia esperança, havia amor, havia um futuro. E Livia, do outro lado da porta, agradecia silenciosamente por tudo que estava voltando a ser como deveria.

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