"Na fronteira as nuvens passam sombrias
A região inóspita envolta em silêncio
Nas margens altas do rio Amur
Estão os sentinelas da Pátria
Lá foi estabelecida uma sólida
defesa contra o inimigoLá permanece, corajoso e forte
Na fronteira do Extremo Oriente,
O batalhão blindado de choque
Lá vivem, como diz a canção
A forte e harmoniosa família,
Três tanquistas, três amigos alegres
A tripulação do tanque de guerra"
•••
O silêncio era uma coisa viva dentro daquela cela. Ele rastejava pelas paredes úmidas, se infiltrava nos ossos, e fazia cada um de nós se afundar um pouco mais nos próprios pensamentos. O cheiro metálico de ferrugem era quase insuportável, mas ninguém reclamava. Soap e Gaz murmuravam algo sobre um plano, mas as palavras se misturavam na minha cabeça. Minha própria respiração soava alta demais, irregular demais.
Há um rádio pequeno no canto da parede, um pedaço enferrujado de sucata que, de alguma forma, ainda funciona. O som que sai dele não é nada além de estática por alguns segundos, mas então a melodia se forma no ar, grave, solene, carregada de uma nostalgia que não me pertence. Tri Tankista. Vozes profundas, perfeitamente sincronizadas, cantam sobre heróis blindados, sobre guerra e glória, sobre a pátria e a vitória. A música reverbera na cela como um lembrete silencioso de onde estamos. De quem está no controle. É quase irônico - nós, prisioneiros, trancados sob o som de um hino sobre guerreiros vitoriosos.
Ninguém comenta, mas todos ouvem. Ela preenche o espaço entre os nossos silêncios, entre os olhares desconfiados e os pensamentos que não podem ser ditos. É irritante e, ao mesmo tempo, quase hipnótica. A voz dos mortos ecoando pelo tempo, servindo como trilha sonora para aqueles que ainda estão tentando não se juntar a eles.
O brasão está ali, pintado no concreto áspero e envelhecido. O vermelho já desbotado, as rachaduras atravessando a foice e o martelo como cicatrizes na pele de um fantasma que se recusa a desaparecer. O globo terrestre dourado ainda brilha sob a luz fraca da lâmpada pendurada no teto, e a coroa de trigo ao redor dele se estende como braços tentando envolver tudo.
Fico olhando para aquilo por tempo demais. Não porque me importo com o que significa, mas porque é impossível ignorar. Como um olho morto, fixo, observando a cela e todos dentro dela, julgando em silêncio. Já vi muitos símbolos pintados em paredes como essa-insígnias de regimes, promessas de poder, marcas deixadas por homens que acreditavam ser imortais. No fim, todos caem. Mas essa merda aqui ainda está de pé, desafiando o tempo, a história e até a realidade que temos diante dos olhos.
A música do rádio continua, e por um instante, quase posso imaginar as sombras de soldados marchando por esse corredor, cantando sobre a glória que se desfez. Eles todos morreram por coisas maiores que si mesmos, mas qual justiça há nisso?
Pelo menos uma hora já tinha se passado. Talvez eu estivesse começando a delirar, enlouquecer. Tentei manter-me focado, mas tudo parecia distante, como se eu estivesse dentro de um aquário, vendo o mundo do outro lado do vidro.
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edelweiss | a könig storie.
FanfictionKönig não podia escapar. O passado sulfúreo que emana dos muros e que flutua nas ruas de Viena o perseguiria para sempre. A luz amarela dos postes antigos que resplandecem nas calçadas molhadas, e evocavam a necessidade precípua que todo austríaco c...