— Cl.... claro. — Edu concordou, atordoado enquanto se aproximava do balcão para assinar a autorização de entrada. Felipe não desgrudou os olhos dele por um segundo sequer.
— Tenho a leve impressão de que você anda me seguindo. Devo me preocupar? — Edu continuou, em tom brincalhão, fazendo Felipe sorrir enquanto saiam para o corredor já não tão movimentado como antes, devido ao horário.
— Por enquanto não. — Felipe manteve o clima, fazendo uma cara teatralmente misteriosa e soltando um sorriso de canto, para desespero de Edu. Seu coração estava descontrolado dentro do peito.
— E como está o olho?
— Uma merda. — Felipe disse, sincero e inesperadamente, ambos riram.
— Sinto muito por isso.
— Ah não, por favor não sinta. Aquilo foi o máximo.
— Para você que foi o herói, né? Eu parecia o Robin do seu Batman.
— Qual é, o Robin é importante para a nossa cultura. — Felipe arrancou outro sorriso de Edu, o que parecia estar sendo cada vez mais fácil. — Não é o tipo de coisa que acontece muito por aqui, né?
— O quê, você diz assalto? Não muito. A gente ainda tem o costume de andar despreocupado por aí.
— Bom, infelizmente de onde eu vim é comum. A gente acaba se preparando sem nem perceber.
— De onde você veio?
— Porto Alegre. — Felipe respondeu e encolheu os ombros. Talvez ainda fosse cedo demais para falar de sua antiga cidade.
— Garoto da capital! Por essa eu não esperava. A que nós moradores de São Valentim devemos a honra de ter uma presença tão ilustre?
— Meu pai foi promovido no trabalho e teve que se mudar. Basicamente isso.
— E você não parece ter sido o fã número um da ideia. — Edu tentou, parecendo conhecer Felipe mais rápido do que ele esperava.
— Acho que é algo que eu vou me acostumar. É uma mudança grande, de um dia para o outro.
— Bom, de qualquer forma, bem-vindo a São Valentim. Terra do turismo, da boa comida e dos assaltos.
Edu fez Felipe explodir em risadas enquanto caminhavam pelos corredores do segundo andar. Ao chegarem em frente à sala, perceberam o silêncio fora do comum para uma aula do professor Guedes. Ao entrarem, no entanto, tudo estava óbvio; estavam todos com as luzes desligadas, segurando o riso para não acordar Flávio, que teve a brilhante ideia de passar um documentário sobre a Segunda Guerra Mundial para o seminário da semana seguinte. O professor, que era conhecido por todos pelo hábito de ter o sono pesado, estava com o queixo para cima, os braços cruzados e a boca aberta, enquanto alguns alunos filmavam. Edu e Felipe caminharam sem tentar chamar muita atenção, mas era inevitável. O rosto desconhecido de Felipe havia causado curiosidade instantânea aos colegas de sala, mesmo que ninguém perguntasse nada. Mas Edu sabia que eles se questionavam do porquê do garoto novo conhecer justamente alguém tão aleatório. Em outras circunstâncias, Felipe certamente seria adotado pelo grupo de Daniel ou outro atleta popular para se tornar o centro das atenções. E no fundo, Edu adorava que nem tudo naquela escola fosse tão clichê. Após se acomodarem um ao lado do outro, Edu e Felipe juntaram as duas mesas para continuarem conversando. Guedes se mexia hora ou outra com o zumbido dos garotos ao seu redor, ou pelo barulho da televisão, mas nada que conseguisse lhe acordar efetivamente.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Garoto da Mesa Nove
Romance1º lugar no concurso Cósmico, categoria LGBTQ+; 1° lugar no concurso Escritores Lendários, categoria LGBTQ+; 2° lugar no concurso LGBTQ+, categoria Romance; 2º lugar no concurso Different Blue, categoria LGBTQ+; 2º lugar no Concurso Golden, categori...