2. Ramona

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-Peguem as provas ao sair. Deixei um pouco mais fácil dessa vez, então me entreguem daqui há dez dias. -avisa Miguel.

Suas provas são o cão, ele gosta de testar os alunos e, mais do que isso, deve ter prazer em reprovar a maioria. Ele se sente coroado, um rei enquanto tem todos os olhares da sala presos a ele, exibindo todo seu conhecimento. Veste sempre uma camisa social branca e possuí um olhar egocêntrico, como se ele fosse um gênio, totalmente superior a sala.

Recolho o material exausta, fecho o arquivo do meu ultrabook e o guardo na mochila. Passei o dia inteiro avaliando as falhas de um novo software, só quero chegar em casa e dormir um pouco, é o mínimo que mereço.

-Ramona, preciso falar com você. -diz ele, quando a sala já está quase vazia.

Reviro o olho, inacreditável que, do cento e poucos alunos que assistem sua aula, ele sabe logo o meu nome. Coloco a mochila sobre o ombros e caminho até ele. Miguel por trás da carcaça de físico excêntrico, parece um pouco cansado. Ele senta em sua mesa e coloca minhas questões do trabalho extra na mesa.

-É seu esse trabalho, certo? -pergunta. Apenas confirmo com a cabeça e ele prossegue: -Tem um motivo para que prefiram deixar a média vermelha a responder as questões desse trabalho.

O olho com desdém, porque na realidade nem estou prestando muita atenção no que ele diz. Apenas vejo sua boca mexer e tento me concentrar em não bocejar. Por causa da merda das questões de mecânica quântica que ele me passou meu trabalho no escritório ficou atrasado e não pude dormir já que passei a noite fazendo-o.

-Me explica como resolveu a questão três. -me pediu, apontando para a minha conta.

-Está sugerindo que eu copiei de algum lugar?

-Não apenas sugerindo, ninguém que pegou o trabalho extra resolveu essa conta. Então me explique como, uma estudante que mais parece da área de artes plásticas e afins e que, provavelmente, entrou no campo da física de paraquedas para provar algum preceito feminista, consegue resolver problemas de relatividade de espaço.

Respirei fundo e o encarei. Não acredito que esse merda acha que copiei alguma coisa da internet. Olho para questão. De fato foi uma das mais difíceis, mas não havia copiado nada. Achei que não conseguiria acertar a questão. E noto que ela está marcada com um "x" em vermelho.

-Eu errei essa questão? -pergunto.

-Qual a parte de "ninguém conseguiu" que você não interpretou? Eu anulei a sua.

-Me parece que você que tem problemas com interpretação.

-Como?

Giro a página em cento e oitenta graus e ele se põe ao meu lado, para que eu possa lhe explicar como resolvi a conta. Apenas aponto para o enunciado e o leio e voz alta.

-"Mostrar que um segmento observado a partir de dois sistemas de referência como movimento relativo uniforme apresenta medidas diferentes.".

Ele me olha com desconfiança enquanto aponto para imagem ao lado do exercício. Ele está ao meu lado, sinto seu cheiro de erva-doce e algum desses perfumes masculinos fortes. Sua respiração é acelerada e ele está um pouco vermelho, provavelmente de raiva, por eu conseguir explicar.

-Temos que notar que: A imagem um mostra observador na estação e mede o comprimento da plataforma (L); na imagem dois, entre o ponto dois e três depois, determinam os instantes de passagem de uma marca efetuada no trem no início e fim da plataforma. Usa dois relógios sincronizados. Calcula-se a velocidade do trem: -aponto para a fórmula que usei. - Ou essa daqui -aponto a fórmula modificada- Imagem quatro mostra um observador no trem que vê a plataforma se aproximar com velocidade, ou seja, "v"; A imagem cinco registra o instante de passagem do início da plataforma usando a marca existente onde está o cronômetro; A imagem seis registra o momento de passagem do final da plataforma. Determina o intervalo de tempo ∆t' e calcula o comprimento Lv = v∆'. Usando aquelas duas equações concluímos que: -aponto para minha equação-, assim: LT = Ɣ∆t com LT > LV. Alguma dúvida?

Vinho TintoOnde histórias criam vida. Descubra agora