Eu estava, literalmente, contando os segundos para aquela aula terminar. Meus olhos estavam fixos no relógio pregado em cima do quadro-negro, atentos ao ponteiros dos segundos. Eu nunca fui uma má aluna. Apesar de detestar o que estou cursando e não manter nenhum interesse, eu não me permitia reprovar. Eu entregava todos os trabalhos em dia e tentava fazer o meu melhor. Claro, esse desempenho também era necessário para que eu mantivesse minha bolsa. Só que tentar ser uma boa aluna não fazia com que eu suportasse as aulas. Eu estava com o cotovelo em cima da mesa e uma das minhas mãos suportava o peso de minha cabeça enquanto eu esperava ansiosamente até o ponteiro dos segundos completar mais duas voltas. Quando finalmente o fez, eu fiquei contente e quase me levantei para sair da sala, mas foi aí que percebi que o Sr. Henke continuava a escrever algo usando o giz. Como eu odiava não ter um sinal sonoro para avisar que a aula acabou! E como eu odiava ter que ficar minutos extras presa na sala de aula. Um minuto a mais dentro da sala era um minuto a menos para eu almoçar e ir para o trabalho. Pensei em sair de fininho, mas era o Sr. Henke. Eu já havia escapado mais cedo da aula dele semana passada e esse homem parecia que tinha uma visão de 360 graus. Eu com certeza não sairia sem ser notada.Enquanto eu pensava em um plano para escapar dali, ele, ainda escrevendo no quadro, me pegou de surpresa.
- Eu posso sentir sua impaciência daqui, senhorita com nome de cidade canadense - ele disse, sem sequer virar o rosto ou o corpo e sem ao menos parar de escrever
Eu quis me encolher. E uma pequena raiva tomou conta de mim junto com a vergonha. Eu não suportava a aula dele, mas ele era um bom professor. Era o único que parecia se importar comigo, só que às vezes parecia que se importava demais. Já estava virando mania-de-perseguição aos meus olhos.
- Pode sair, se quiser - o Sr. Henke disse de novo sem olhar para mim
Eu não sabia o que fazer. Eu queria e precisava sair dali se quisesse ter tempo suficiente para me vestir e almoçar. Só que aquele convite me pareceu uma armadilha. Se eu levantasse e saísse, o que aconteceria? E agora era óbvio que todos os olhares da sala estavam direcionados a mim.
Eu decidi ficar calada e sentada, apesar de também querer sair para não me atrasar.
Ele ficou mais cinco minutos escrevendo no quadro e logo dispensou a sala. A sala, não eu. E eu já estava irritada quando o ouvi chamar meu nome enquanto os outros alunos saiam.
- O que foi? - eu disse com um pouco de hostilidade
- Eu realmente vou precisar chamar sua atenção todas as aulas para que assim você perceba suas prioridades?
- Eu não estou entendendo, Sr. Henke.
- É claro que você está entendendo. E você sabe muito bem que o que você diz que é sua prioridade está em segundo lugar.
- Sr. Henke, eu realmente não entendo por que o senhor pega tanto no meu pé. Apesar de tudo, eu sou uma boa aluna. Eu faço tudo e eu nunca reprovei.
- Porque você é orgulhosa.
- E você não é meu pai para me falar essas coisas.
- Me desculpa, é que eu não entendo. Eu sofro ao ver que você está infeliz porque parece que eu não estou fazendo meu trabalho direito. E em mais de trinta anos de profissão, eu nunca vi um aluno tão orgulhoso quanto você. Está escrito na sua testa que você não suporta esse curso e eu simplesmente não entendo porque você não o larga. E Deus sabe o quanto eu já tentei fazer com que minhas aulas te interessassem. Eu fico frustrado.
- O problema não é o senhor.
Eu quase deixei escapar um "quem está frustrado aqui sou eu", mas me segurei.
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21 Azulejos
General FictionNão há nada mais angustiante que uma vida monótona. Montreal sabia disso. Acordar, trabalhar, estudar e dormir. No outro dia, repetir a sequência. Aos 26 anos, ela sabia que sua vida tinha um propósito, algo mais significativo do que apenas servir e...