Meus dias passavam voando. Ou eu estava trabalhando ou acertando alguma papelada da adoção ou visitando Isa no abrigo. Eu mal sabia o que era dormir, afinal, toda vez que conseguia deitar a cabeça no travesseiro, uma grande ansiedade tomava conta do meu peito, tirando meu sono. Juro que só não desmaiei por desnutrição porque Enzo insistia que eu comesse algo sempre que podia, nem apetite eu tinha mais.Olga, do abrigo, me ligou enquanto eu saía do trabalho uma tarde, perguntando se eu não poderia passar pela manhã lá. Eu já iria visitar Isadora mesmo, então disse que sim, mas a pulga ficou atrás da minha orelha pela noite inteira.
Enzo me acompanhou pela manhã e antes mesmo de chegar a ver Isadora, fomos chamados por Olga à sua sala.
- Eu tenho algumas notícias para vocês - ela disse assim que sentamos - Preparados?
- Claro, só espero que seja algo bom - falei, apreensiva
- A noticia boa é que - ela segurou um sorriso - a adoção saiu. Vocês podem levar a Isa para morar com vocês em alguns dias.
Eu quis pular da cadeira, Olga não conseguiu mais disfarçar sua animação por nós.
- Eu nem sei o que falar! Isso é simplesmente tudo pelo o que eu estava esperando! - tentei controlar minha voz
- Mas... - Olga continuou e eu me sentei na mesma hora, sentindo a apreensão voltar a mim
Enzo segurou minha mão mais forte.
- Mas é temporário. São seis meses de adaptação. Um controle bem rígido pela assistente social e pela psicóloga vai acontecer nesses meses. Se tudo der certo, a adoção se torna permanente. Ok?
Eu afirmei com a cabeça. O medo da não-adaptação de Isa me deixou insegura, eu nem consegui comemorar direito a primeira notícia.
- Mas eu tenho certeza que tudo vai dar certo - Olga expressou um olhar de consideração
Enzo, que estava calado até agora, olhou pra mim. Eu sabia o que aquele olhar me dizia: "fica calma, vai dar tudo certo".
- Ok, e quais são os procedimentos agora? Quando a gente pode buscá-la?
Foi Enzo quem começou a fazer perguntas, eu fiquei até sem fala com o pensamento de tê-la por alguns meses e depois perdê-la.
No final, combinamos de buscá-la na outra sexta-feira de manhã, um dia antes da conclusão do meu projeto. A ansiedade não ia me deixar tão cedo.◆
- Acho que vamos virar pintores profissionais assim, ein? - ele comentou passando o rolo na parede
- Você acha que ela vai gostar dessa cor? - falei, olhando as paredes e a tinta lilás
- Você perguntou a cor preferida dela e ela disse lilás, não foi?
- Sim, mas é que quando a gente é criança a gente muda muito rápido de opinião, eu era assim, um dia gostava de uma coisa, depois enjoava e eu só quero que dê certo e...
- Ei - ele me abraçou - Fica calma. Tenho certeza que ela vai gostar, tenho certeza que ela vai amar o quarto lilás só para ela ao invés de dormir numa beliche num salão cheio de outras crianças. Você precisa se acalmar.
- É que eu tenho muito no que pensar, Enzo. Eu acho que estou ficando maluca.
- Vai dar tudo certo. Sei que a semana que vem vai ser corrida, é a preparação pro seu projeto, Isa vindo para cá, isso tudo ainda trabalhando. E eu estou aqui, lembra?
Suspirei.
- Mal acredito que realmente está acontecendo, que ela vem mesmo pra cá e, se tudo der certo, vai ficar comigo pra sempre - eu sorri para mim mesma - Obrigada por estar me ajudando com o quarto dela...
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21 Azulejos
General FictionNão há nada mais angustiante que uma vida monótona. Montreal sabia disso. Acordar, trabalhar, estudar e dormir. No outro dia, repetir a sequência. Aos 26 anos, ela sabia que sua vida tinha um propósito, algo mais significativo do que apenas servir e...