Era domingo e o calor estava tão insuportável que não me deixou dormir até mais tarde. O ventilador não resolvia muito a situação e, se eu fechasse a janela, derreteria. Enzo estava ao meu lado, dormindo sem camisa ou coberta, com os cabelos na nuca molhados de suor. Eu o observei por um tempo, sua pele descoberta, seu peito se inflando devagar somente para que todo o ar fosse expelido em seguida. Como eu passei anos da minha vida sem nem ao menos saber como seu rosto era? Agora parecia simplesmente impensável não esbarrar com seus traços ao lado dos meus durante a noite. Quis tocar sua pele, mas eu não queria acordá-lo. O jeito foi me levantar.Fui ao quarto de Isadora. A janela estava aberta e ela abriu os olhos quando me ouviu entrar.
- Pode continuar dormindo, não quis te acordar - eu me agachei perto da cama
Ela bocejou, fechou os olhos de novo. O vento feito pelo ventilador mexia de leve seu cabelo.
- Ela dormiu bem? - um sussurro surgiu na porta do quarto
Eu me virei no mesmo instante.
- Que susto, Enzo - sussurrei também - Achei que você estava dormindo.
- Tá muito calor.
- O verão podia acabar logo, está insuportável - eu levantei, deixando Isa dormir
- Vamos tomar um banho gelado, depois a gente acorda ela para tomar café.
- Perfeito.
Eu tentava não demonstrar nenhuma estranheza ao tomar banho com outra pessoa, mas eu não sei quando isso ia ficar normal. Estávamos dividindo a ducha, a água gelada correndo pela nossa pele, nos fazendo esquecer um pouco do calor infernal que fazia do lado de fora. Ao tentar tirar a água de meus olhos, senti a mão de Enzo na minha nuca e ele me puxou para um beijo. Eu fui pega desprevenida e o beijo não foi nada suave ou gentil, mas isso não quer dizer que não foi bom. Era fácil perceber que não era um beijo qualquer.
- A porta está trancada? - eu larguei seus lábios abruptamente
- Não sei.
- E se a Isa acordar, nos procurar? E se ela entrar aqui, agora? Nós temos que ter mais cuidado.
- Você está certa, desculpa - ele falou, me soltando um pouco
- Não precisa se desculpar. Não é como se eu não tivesse gostado da surpresa.
Ele riu, mas eu vi que tinha uma pontinha de frustração em seu rosto. Só que eu ficava preocupada, já que não queria expor Isa a nada que pudesse fechá-la cada vez mais, afinal, eu não sabia pelo que ela tinha de fato passado, eu não queria que ela se sentisse mal dentro da sua própria casa. Eu geralmente não beijava Enzo perto dela, pelo menos não mais que um selinho. Ao mesmo tempo que não era apropriado ao meu ver, não queria ela ficando ainda mais desconfortável.
Encontrei Isa acordada, apoiando-se no batente da porta e observando a rua. Fiquei grata por termos colocado uma tela de segurança.
- Olhando a vizinhança? - perguntei e ela se virou, tomando consciência de que eu estava ali
Ela confirmou com a cabeça.
- É legal ter uma janela.
Eu não sabia o que responder. Na verdade, eu não sabia o que responder à metade do que ela falava, parte porque apenas me fazia querer abraçá-la, parte porque ela era criança demais para ter enfrentado tudo o que enfrentou.
- O que você acha de tomar um banho gelado para melhorar esse calor e depois tomar café da manhã?
Ela concordou com a cabeça e pegou em minha mão, pronta para ir ao banheiro.
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21 Azulejos
Fiksi UmumNão há nada mais angustiante que uma vida monótona. Montreal sabia disso. Acordar, trabalhar, estudar e dormir. No outro dia, repetir a sequência. Aos 26 anos, ela sabia que sua vida tinha um propósito, algo mais significativo do que apenas servir e...