O dia seguinte, um domingo, foi bem o que um domingo é: um tédio. Não adiantava ligar a TV, porque eu sabia que ia ficar rodando os canais e não parando em nenhum. Então eu decidi parar de preguiça e revelar as fotos do sábado. Eu tinha que ter cuidado, afinal, as fotos não eram para mim e sim para o casal recém-casado, sem contar as fotos para o trabalho. Na verdade, eu estava com medo de revelá-las e ver que nenhuma tinha saído boa, mas sabia que eu não teria muito tempo para fazer isso durante a semana, e eu não podia adiar tanto.Peguei o primeiro rolo de filme e entrei no meu laboratório improvisado. Conferi as emulsões químicas e todas as medidas quinhentas vezes antes de começar o processo. Eu não podia errar em nada. A primeira foto do primeiro filme revelado me surpreendeu. Eu mal lembrava que a havia tirado. Era Enzo, no dia em que eu o fiz fazer coisas que ele nunca havia feito. Foi a foto que tirei dele na paisagem nunca percebida por mim antes. Não sei quanto tempo fiquei olhando o negativo contra a luz, analisando cada detalhe, sem ao menos ampliá-la no papel e revelá-la. Minha curiosidade falou mais alto e eu peguei o papel fotográfico, ajustando o negativo e a exposição. Assim que joguei o papel no revelador, um sorriso também veio ao meu rosto. Tinha ficado ainda melhor do que no negativo.
Quando percebi que havia gastado tempo demais com uma foto só, comecei a me dedicar às outras. Eu havia gostado das fotos que tirara. Não tinham muita coisa especial, mas achei que refletiram a simplicidade e a beleza que foi o casamento, ainda mais porque o segundo filme era preto e branco. Fiquei analisando também a foto da tal Susan, que havia pego o buquê, ou quem sabe, havia sido pega por ele. Qualquer um que visse minha foto, nunca falaria que ela não acreditava em amor. Lembrei então do comentário de Enzo. Será que eu estava equivocada em pensar que meus pais se encontrarem do jeito que se encontraram foi apenas sorte? E eu acreditava no amor, afinal de contas?
Deixei essas perguntas para lá e fui para o terceiro rolo. Meu papel fotográfico já estava no fim e eu tive que ser bem cuidadosa. As fotos do trabalho ficaram boas. Normais, mas boas. Agora só faltava escrever sobre os lugares.
Quando acabei e olhei ao meu redor, me vi cercada de fotos penduradas para todos os lados. Eu já estava com dor de cabeça por causa do cheiro da química, então resolvi sair. Eu precisava de um laboratório maior.
Naquele mesmo dia, à noite, separei as fotos do trabalho e as coloquei sobre a mesa. Peguei um caderno e uma folha e tentei escrever sobre cada lugar da foto. Como a cidade não era turística, tive a ideia de ir além de somente descrever o lugar ou elogiá-lo. Eu olhava para foto, lembrava do lugar e descrevia, além do geral, o que aquele lugar havia me feito sentir ou pensar. Achei aquele jeito de persuadir alguém a visitar um lugar um pouco mais humano, mais poético, e esperava que o Sr. Henke gostasse.
Quando cheguei na última foto que tirei, de uma estátua no meio da praça, lembrei do momento. Lembrei de Enzo me agradecendo e lembrei dele confessando que tinha medo de esquecer detalhes de Catherine. Foi aí que tive uma ideia. E então decidi chegar um pouco mais tarde na aula de segunda feira para antes passar no centro da cidade e comprar o que eu precisava.
◆
- Onde esteve sábado? - Karina perguntou, enquanto patinávamos entregando os pedidos
Já havíamos nos acostumado aos patins. Quedas eram raridade agora, mas as bolhas no pé só aumentaram.
- Eu fui a um casamento - eu disse
- Perdeu um dia de gorjeta por um casamento? Era o casamento real? - ela riu
Eu rolei os olhos.
- Eu fui paga para ir - foi tudo o que eu disse
- O quê? Como assim? Espera. Alguém te pagou para ir como acompanhante? Se for isso, eu também quero. Onde que eu entrego meu currículo? - ela brincou

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21 Azulejos
General FictionNão há nada mais angustiante que uma vida monótona. Montreal sabia disso. Acordar, trabalhar, estudar e dormir. No outro dia, repetir a sequência. Aos 26 anos, ela sabia que sua vida tinha um propósito, algo mais significativo do que apenas servir e...