Capítulo Nove

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Eu não poderia negar: aquilo foi um bom apaziguador para a minha ânsia incontrolável e ajudou mais do que jamais poderia esperar. Na manhã seguinte, eu estava regenerada, novamente a vivaz Kate, que tinha o mundo aos seus pés e céu sobre a cabeça.

Meu primeiro ato pós regeneração foi escorregar para fora dos braços tão bem torneados de Jason ― um martírio, em definitivo ― e recolher as minhas peças de roupa jazidas no chão. Coloquei uma a uma, procurando manter o máximo de silêncio que podia para não acordá-lo e lidar com qualquer tipo de arrependimento de sua parte. Logo que estava devidamente vestida, esgueirei-me para fora do quarto pela porta, olhos focados no ahnkalov apagado, mas torcendo para que ninguém estivesse por ali para me ver fugindo daquele modo tão... vergonhoso.

Quem sabe seria o meu dia de sorte se ele não tivesse uma droga de parceiro...

― Uau, ele é mesmo muito hipócrita ― a voz indignada surgiu atrás de mim e eu virei lentamente para encarar Frederick, assim que ouvi o barulho de "clique" da maçaneta.

Seus olhos noturnos me ofereciam um tanto de diversão e eu quis me esfregar em sua barba por fazer, que nem um felino. Uma sobrancelha se ergueu, num ato que me soara curioso, e então, eu pensei em como seria divertido poder ficar invisível e fugir dali.

― Eu... ― contudo, as palavras voaram como pássaros medrosos para bem longe e tudo que eu tive foi um mero nada.

― Você passou a noite inteira com ele? ― perguntou e ponderei um tanto sobre responder aquilo com uma verdade ou uma mentira; acabei apenas assentindo com uma leveza excepcional. ― Ele está dormindo agora? ― Repeti o gesto. ― Vamos, eu vou te levar de volta para o seu quarto. Você não tem nenhuma aula hoje, pelo que eu sei.

Mergulhei no silêncio que havia me imposto e o segui, sem explicações, sem nenhuma vontade de falar sobre o que acontecera. Ele também não parecia exatamente confortável com a situação e lá no fundo, não pude evitar me perguntar se ele estava com um pouquinho de raiva por causa do corrido. Não era o tipo de questionamento que ficaria sem uma resposta, afinal, logo que a ideia passou pela minha mente, recebi seu olhar voraz e um balançar de cabeça um tanto enfático.

Aquilo só me fez achar que estava certa.

E se ele notou isso? Não pude afirmar com certeza, já que sequer se deu ao trabalho de olhar novamente para mim, até o momento em que entrei no meu quarto e bati a porta em sua cara. Não houve resistência, muito menos objeção, apenas a quietude impassível e pouco depois, a total escuridão, quando obtive o resto do descanso que precisava no momento.

Ousaria dizer que nos dias que se seguiram, eu com certeza estava bem melhor. Jason e eu não conversamos sobre o assunto, claro ― era como se tivesse sido apenas um sonho muito, muito bom, mas ao menos fora capaz de repor as energias que Peter descarregara com sua partida por um período maior de tempo que os meus consortes eram capazes. Eu me aproveitava deles, hora ou outra, com a "benção" de Frederick, que ainda não contestava nada, e isso me deixava feliz. Satisfeita, minha vida voltou a girar em torno das coisas banais que Kalanova queria para mim: estudos, treinamentos, passar mais tempo com os outros sacerdotes e sacerdotisas; especialmente com Helena.

Ela, ainda que eu obviamente já tivesse superado Peter, mantinha ele como o nosso único assunto proibido. Se alguém sequer ousasse mencionar o nome dele perto de mim, seu olhar penetrante cortava essa pessoa como a mais afiada espada. Depois de um tempo, as pessoas haviam parado de falar nele e era como se Peter sequer existisse... até que.

Sempre existe um até que para atrapalhar a vida das pessoas.

De qualquer forma, meu período voluntário junto a Lucien havia terminado, entretanto, isso não nos impedia de passar tempo juntos. Como ele era muito amigo de Helena, sua presença acabou se tornando um constante entre nós e contanto que a sacerdotisa estivesse junto comigo, os ahnkalov tinham permissão de manter sua distância. Era por isso que naquele momento estávamos os três no jardim de ervas que o rapaz mantinha, à sós. No dia, eu me sentia disposta o suficiente para ajudá-lo a plantar algumas mudas que um dos consortes de seu pai havia trazido para ele numa visita, poucas horas antes. Helena colhia o que quer que já estivesse pronto e parecíamos estar em uma harmonia um tanto quanto bizarra.

Sacerdotisa de Landar - Livro Um (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora