Ela sabe

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Mentiria se dissesse que tinha sido fácil contar tudo, por vários momentos se perguntou se aquilo era o correto a se fazer, afinal, não era um conto de fadas, amenos não para ele. Considerando tudo que já havia passado até ali, essa a era a primeira vez que contava tudo a alguém, Lilly se mostrava encantada e por inúmeras vezes viu um olhar sonhador brilhar em seus lindos olhos ametista, parecia uma criança animada com uma boa história.

Cam sentia uma melancolia ao se recordar do Prado, a última vez que tinha estado lá foi quando a maldição havia sido quebrada, e Lucinda repetiu a escolha feita por Daniel milênios atrás ao escolher o amor. Naquela época acreditava que tinha se habituado com a perda, pois era um item acumulativo em sua imortal existência, e aquela seria mais uma para sua lista, pelo visto, a felicidade dos outros não se atrelava a dele.

O olhar compreensivo de Lilly sobre ele o fez acreditar que talvez agora sua felicidade estaria enfim ligada à de outra pessoa. Suspirou profundamente antes de prosseguir.

Descrever como foi a descoberta dele sobre os sentimentos o fazia se questionar, se caso soubesse o quão pesado eles poderiam ser se mesmo assim teria se entregado. A resposta estava ali diante dele, com o corpo recostado na cabeceira da cama, os cabelos negros levemente desalinhados, as mãos delicadas repousadas sobre as pernas flexionadas e aquele olhar que o entorpecia sempre que se cruzavam, sim, ele se entregaria com toda a intensidade que seu coração permitisse.

Havia evitado citar nomes, preferindo explanar todo um cenário e se focar na história de "Romance trágico" dos pais dela, e até aquele momento tinha alcançado seu intuito, contudo, precisava ser completamente sincero.

-Você deve estar se perguntando o por que estou contando tudo isso, não é mesmo? – Não havia entusiasmo na voz dele.- O seu sonho é parte de toda essa história. – Seus orbes esmeraldas cravaram-se nos dela, ela entenderia. – E você também, Li.

Cam notou nitidamente a confusão que se formava na mente dela, certamente Lilly não entendia onde se encaixava naquele contexto. Cam sustentou o olhar dela, ele havia aprendido a lê-la e sabia que a ligação que tinham facilitava essa comunicação silenciosa que existia entre eles.

-Mas aonde eu me encaixo nisso tudo? – O olhar dela era ingênuo, quase infantil.

-Você poderia me contar sobre o seu sonho?

Cam acompanhou atento a todo o relato que possuía uma riqueza de detalhes assombrosa, era como se Lilly tivesse presenciado aquele dia, e observou a dificuldade dela em conter as emoções que pareciam a flor da pele, era algo muito além dos ciúmes, como se ela compartilhasse da dor dele naquele dia, e as palavras que a ouviu pronunciar enquanto dormia, fizeram sentido.

Quando percebeu que ela tinha terminado, ele juntou as mãos dela as suas, toda aquela situação de seu noivado tinha sido superado e não haveria problemas em citar o assunto, porém, o que teria a dizer envolveria a vida de outras pessoas, mas como antes, seu coração parecia sempre exigir a sinceridade para com ela.

- Olha, eu não sei exatamente o porquê ou mesmo como isso foi possível, mas o seu sonho, descreve um momento em meu passado. – Ela entreabriu os lábios visivelmente chocada. – Aquele seria o dia do meu casamento, mas como você deve saber, as coisas não correram como o planejado, ela me chutou e eu mudei de lado. – Deixou um sorriso amargo tomar seus lábios tentando aliviar a tensão em torno deles.

Viu quando o olhar ametista dela pousou em um ponto qualquer do quarto de maneira dispersa, sua vontade era atê-la a seus braços e pronunciar apaixonado, que era ela a mulher da vida dele e que tudo ficaria bem.

-Mas meu pai estava nesse sonho. – Enfatizou mais para si do que para ele.

-Bem. – Cam analisou como essa parte seria impactante, mas ela era amada por um demônio, que mal teria ser filha de anjos? – Sabe o casal do início da caída e tudo o mais?

-Hum hum. – Concordou ela.

-O casal era Daniel e Lucinda, seus pais.- Concluiu rapidamente.

O coração dela parecia estar batendo acelerado e de onde estava, ele poderia jurar ser capaz de ouvir as batidas nitidamente, a respiração dela estava pesada, o os olhos seguiram até a abertura no teto de sua cabana, "Precisava arrumar aquilo", inqueriu a si mesmo.

-Li? – Estava preocupado.

Aquele silêncio estava se prolongando mais do que o esperado, talvez ela precisasse de mais tempo para absorver tudo aquilo. Ele a envolveu em um abraço terno e imaginou que poderia passar toda a eternidade assim, somente com ela em seus braços. Lilly acomodou o rosto na curva de seu pescoço, e logo Cam percebeu que a respiração dela estava se acalmando e seu coração retomado o compasso adequado.

-Anjos. – A voz dela saiu mais baixo do que um sussurro.

Cam nunca tinha permitido que a questão sobre o que ela realmente era lhe tomasse a mente tempo o suficiente para ser capaz de criar alguma teoria, Roland o havia alertado sobre isso, mas nem ele tinha as respostas. Ela poderia ser somente uma humana, mas isso não explica como ela consegue acessar o passado sem o uso de um Anunciador, Nefilins surgem com a união de um anjo e um humano, mas no caso dela os pais dela era dois ex-anjos.

-Li, seus pais terem sido anjos é fichinha, se comparado ao fato de você ter um demônio loucamente apaixonado por você. – Constatou descontraído recebendo um sorriso amplo em resposta.

-Eu te amo tanto meu demônio. – Ela deu ênfase ao meu, antes de selar seus lábios aos dele.

O que ela era afinal? Cam não saberia responder, mas iria tentar descobrir.

(...)

Estava parado olhando para aquela janela, isso estaria se tornando um hábito? Adam sabia que ela não estava, mas mesmo assim sentiu uma sensação estranha dentro dele que o fez seguir até lá, era algo incomodo e insistente, dentre tantas mulheres mortais ou imortais, porque estava pensando justamente nela?

-Só pode ser o tesão que tenho nela que está me deixando louco? – Resmungo para si antes de desdobrar suas enormes asas de penas negras e reluzentes, e alçar voo de volta para seu apartamento, deixando para trás a janela do terceiro andar da Crimson roses.

Libertação (Cameron Briel - Fallen)Onde histórias criam vida. Descubra agora