Aqui em Paris, andar de bicicleta não é um acinte aos motoristas de carro. Todo mundo anda: crianças, jovens e mulheres lindas de meia-idade, com sua bicicletinha com uma cestinha na frente. E permanecem magrinhas pela vida toda.
No dia em que completei 50 dias em Paris gritei: viva! O que era uma ideia havia virado um projeto e se mostrado, na realidade, muito mais interessante do que sequer imaginara. Por mais que você se prepare, pesquise, estude o assunto, o bom mesmo é a possibilidade que o "inesperado faça uma surpresa" — como lindamente cantou Johny Alf em "Eu e a brisa". E quem disse que eu gosto de surpresa? Pois bem, até nisso mudei. Sou uma taurina com os pés na terra e não me sinto confortável com mudanças e coisas inesperadas. Paris, porém, foi um aprendizado — e era isso mesmo que eu queria no meu aniversário de 60 anos. Descobrir que podia fazer coisas diferentes, me reinventar, porque só assim tenho a certeza de que não estou envelhecendo. Podem ser coisas banais — andar de moto, pegar um ônibus sem saber para onde, escolher uma academia de dança e mudar para outra — mas a sensação é do cacete.
Podia ter feito tudo isso no Brasil, claro que podia. Mas enfrentar a barreira da língua, o desafio de interagir com um povo rabugento como o francês tornou tudo mais engraçado. E vamos combinar, estava em Paris, para mim a cidade construída mais bela do mundo. No balanço dos 50 dias, a metade do caminho, pude sentir que estava tudo perfeito, que minha alma estava aquecida, meu coração, alegre e meu cérebro, estimulado — e podia querer mais do que isto? Claro que sentia falta de longos bate-papos, mas os amigos chegavam e eram mais do que bem-vindos. O telefone da minha casa era gratuito para o Brasil, então, também podia conversar com outros que estavam là-bas e me lembrar dos tempos em que minha filha era pequena e eu só ligava uma vez por semana, porque o orçamento não permitia mais e falava bem pouquinho. Uma tortura para uma mãe culpada.
Havia encontrado a minha turma de dança, então podia falar com outra linguagem, a do corpo, o que me fascinava. Meu único problema de fato neste quesito conversa era quando os franceses arriscavam pedir a minha opinião sobre futebol, que nada entendo. Passei um vexame em uma loja quando me disseram que o Thiago Silva tinha estado lá. E eu pensei: "Quem será?" "Um cantor de pagode?". Ao ver a minha cara de total desconhecimento, veio a explicação: era o capitão da seleção brasileira. Bem que eu podia ter estudado mais esta lição. Fica para a próxima. Perdão, Thiago.
Sentia saudade do arroz, do feijão e da farofa? Não. E se tivesse, iria na épicerie do Bon Marché e compraria tudo isso. Ou substituiria por arroz vermelho, lentilhas e manteria a farofinha de ovo. Ou trocaria tudo por uma baguette com camembert e não se falava mais nisso. Escrever sobre a experiência deu novo sentido à minha viagem — afinal, jornalista que não conta para os outros não é um vocacionado. De fato senti que aos 60 anos podia usar toda a experiência acumulada nessas pequenas crônicas do cotidiano, coisa que jamais ousei fazer. E assim me reinventei de outra forma, graças a Paris.
E, finalmente, a grande notícia do balanço dos 50 dias foi — soem os tambores, esqueçam o resto, nada tem importância diante deste fato crucial — os 160 degraus por dia me fizeram experimentar algo inusitado. Pensei que Paris ia significar pelo menos 8 quilos a mais depois da temporada. TCHAN, TCHAN, TCHAN, estava com 3 quilos a MENOS e até pensei em escrever o livro A dieta dos 100 dias em Paris, que teria apenas poucas linhas:
Coma de tudo;
Coma sem culpa;
Coma manteiga em vez de margarina;
Ande 4 horas por dia se perdendo pelas ruas;
Dance como se não houvesse amanhã;
Enfrente, no mínimo, 160 degraus por dia;
E seja feliz, mesmo que não perca nenhum quilo.
Ainda acho que seria um best-seller.