Monstro indestrutível

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O restaurante ficava localizado na esquina de uma encruzilhada


de avenidas, formada por prédios comerciais, lojas, bares e

restaurantes. Nas calçadas, o mesmo movimento de meio-dia, o sol


incandescia as pessoas que iam e vinham em direção a seus


restaurantes prediletos, era hora de almoçar. Os bares e pequenos


restaurantes de rua estavam entupidos de gente com fome. Seus


garçons e suas cozinhas anunciavam os pedidos aos gritos.


Will comia enquanto Niah o assistia bebendo seu suco de melancia - como me achou? - disse ela enfim, depois de um longo silêncio desde que chegaram, apenas fizeram seus pedidos e se calaram. O garoto tomou um gole do seu refrigerante - vi seu


chaveiro com a logo "CDs" pendurado na sua jaqueta, pesquisei ontem à noite e achei sua loja - respondeu limpando a boca com o lenço. A menina o encarava com desdenho, era a primeira vez que um garoto tomava essas atitudes em relação a ela, não sabia como se comportar, mas devido a suas experiências no passado, a única opção lógica era de se afastar - eu sei que você acha "incrível" e "surreal" as coisas que eu posso fazer, mas isso é perigoso, estar sentado aqui comigo agora, é perigoso... pra você - sussurrou, inclinando-se sobre a mesa. Ele sorriu - não se preocupe comigo, eu sei me virar, aliás, eu


pratiquei dois anos de MMA, sou ótimo na porradaria - disse ele se


gabando e sorrindo para temperar seu tom de bricadeira. Niah apertou


os olhos em direção a ele, depois de alguns segundos ela deixou


escapar um sorriso de canto de boca.


Ligeiramente Will encarou o sorrisinho da garota, viu que seus


dentes eram bem alinhados, não havia nenhuma deformidade, eram


perfeitos, brancos na tonalidade ideal.


Os dois conversaram por quase uma hora, não entraram em


assuntos particulares, mesmo assim a conversa foi prazerosa e


extensa.
De volta ao "CDs", Will e Niah caminhavam pela calçada

tomando sorvete de casquinha. O garoto preferiu de chocolate, a jovem rockeira se contentou com um misto. Falavam de coisas que gostavam, como bandas preferidas, comida, lugares. Assuntos incessantes surgiam a cada passo que davam - bem, chegamos - disse o rapaz olhando para a porta de vidro do CDs, depois se voltou para garota gótica com os olhos estreitados. Conversaram sobre muitas coisas, mas não sobre o que mais importava - Niah, porque você é tão forte... e veloz? - a pergunta atravessou a garota como uma bala. A jovem se retraiu, visivelmente, era um assunto do qual não gostava de falar. Olhou de um lado para o outro, sabia que devia algumas explicações. Por muito tempo viveu isolado, sem nenhum tipo de relação com as outras pessoas e então, aparece um rapaz que a faz rir e a trata com tanta delicadeza e respeito.


Já está na hora de confiar em alguém.


Agarrou o casaco do garoto com as duas mãos e saltou do chão da


calçada para o telhado do "CDs". As folhas secas caídas sobre o concreto da calçada se movimentaram formando um redemoinho em


volta. As lojas ainda estavam em horário de almoço, não havia muita


gente na rua, mas as poucas que tinham sentiram uma brisa forte


acerta-la nas costas.


Os dois aterrissaram no telhado. O jovem editor caiu de bruços para o chão, reduzindo o impacto com as mãos. Seus pulmões deixaram o ar escapar. O jovem tentou se pôr de pé, mas desabou novamente - caramba! Minha nossa! - gritou ele impressionado. Niah se aproximou do rapaz, ajoelhou-se e o ajudou a se sentar - você está bem? - perguntou ela tentando olhar em seus olhos - estou! Só preciso de um minuto! - e enfim, recuperou o fôlego - me conta, como ficou... assim? - a voz do menino saiu numa baforada. A garota dos cabelos esverdeados agora estava sentada em cima da caixa d'agua, a brisa fraca do meio-dia soava a sua volta, seus cabelos, embora fossem curtos, ainda assim eram sedosos, dançavam ao vento graciosamente.


- eu não "fiquei assim"... eu nasci assim... eu cresci em um orfanato...


não sei de onde vim, não sei quem sou e não sei o que vou fazer - Will se pós de pé com dificuldade - deveria haver algum tipo de documento de registro, informando quem... - a jovem virou o rosto em sua direção e o interrompeu - me deixou lá? Pode ser... se existia, foi destruído - o rapaz se aproximou com alguns passos - porque, o que aconteceu? - a garota gótica olhou para o céu azul, viu poucas nuvens,


provavelmente não choveria no fim da tarde, depois voltou a olhar


para o chão novamente, seu rosto entristeceu - não quero falar sobre


isso - sussurrou ela. O jovem editor de decupagem encarou seus olhos. Tentou pensar numa maneira de fazer com que ela lhe contasse o que aconteceu sem insistir muito. Rapidamente lembrou de algo muito triste e vergonhoso que fizera quando criança - quando eu tinha


9 anos, eu estava andando de bicicleta... eu tinha acabado de ganhar uma cachorrinha de 2 semanas, estava brincando com ela quando...


acidentalmente eu passei em cima dela com a minha bicicleta - Niah


ergueu os olhos para Will - eu chorei por três semanas direto... mas


nunca tive coragem de dizer aos meus pais... que eu matei o meu filhote... - fez uma pausa, seus olhos brilhavam, a garota continuou encarando-o - você é a primeira pessoa que eu contei... vai, agora é sua vez - ela desviou o olhar e percebeu que havia caído na conversa do rapaz, se fosse mentira, deveria admitir que ele era um ótimo ator, se não, deveria demonstrar a mesma confiança - ... quando eu tinha 10 anos, ouve um incêndio no orfanato... tentamos fugir, mas o orfanato era muito velho... a estrutura caiu sobre nós... todas morreram - sua voz saiu sombria como de costume, a garota olhou para Will com seus olhos de sono - foi assim que eu descobri o que eu era de verdade - o jovem se aproximou ainda mais olhando para


ela no alto da caixa d'agua - você descobriu que era... - então ela


pulou lá de cima para o chão, pousou diante do rapaz, ergueu seu olhar para ele e disse - um monstro indestrutível - passou andando por Will, indo em direção a porta atrás dele.


A resposta ecoou na mente do rapaz, paralisado por alguns


segundos. Monstro indestrutível? Então ele se virou e a seguiu - você


não é um monstro! Os monstros você combate! - ela parou, se voltou para ele e o olhou nos olhos - ... antes você perguntou porque eu ajo como uma heroína, porque eu impeço os monstros... - Will assentiu.


Ela olhou para o chão e respondeu determinadamente - eu... impeço


eles porque eu posso! - olhou friamente nos olhos do jovem.

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