Capítulo 1

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Aquele poderia ser um dia como outro qualquer.

Eu estava irritada com meu irmão e isso não era novidade. Seguia pela rua em direção à padaria, bufando de raiva por ele ter me feito sair cedo de casa. O motivo era irrelevante. Douglas sempre arranjava um para implicar comigo – era seu passatempo favorito.

Enquanto eu batia perna, irritada por ter perdido uma discussão sobre quem iria comprar pão naquele sábado nublado, ele ria divertido da minha cara, jogando-se no sofá com um sorriso vitorioso no rosto.

Aquele poderia ser um dia como outro qualquer...

Mas eu devia ter imaginado que não seria. Quero dizer, eu morava no Rio de Janeiro: a cidade do sol, da praia e do bronzeado, e aquele vento gélido que batia em meu rosto não era de Deus, não. Eu detestava o frio (afinal, quem é louco o suficiente para gostar de frio em uma cidade como essa? Quem prefere ficar em casa para tomar um chocolate quente em vez de ir à praia ver aqueles gatos de sunga enquanto pega um bronzeado?). Então, era mais do que óbvio que aquilo devia ser um indício de que algo ruim estava por vir.

Ou seja, o universo bem que tentou me avisar. Mas eu estava muito emburrada com o Douglas para ouvir. Enquanto olhava para a rua, quase correndo para alcançar a Bagel's, pensava na discussão que tivera mais cedo com meu irmão, o que só servia para piorar meu humor.

Eu tentava entender: por que irmãos mais velhos são tão chatos? Quero dizer, eu tenho o mesmo sangue que ele! Compaixão seria pedir demais?

Bem, para Douglas... Seria.

Meu irmão tinha realmente que me obrigar a sair às oito da manhã de um sábado frio para comprar pão para ele. Certo, admito que eu não era a mais santa das irmãs e vivia o obrigando a fazer coisas das quais ele não gostava, o que só aumentava sua sede de vingança. Mas, poxa, será que ele não tinha visto os sinais de que eu não devia sair de casa naquele momento?

Se ele os viu, estava se divertindo muito com a possibilidade de acabar com minha vida para se compadecer. O sorriso que ele exibia no rosto me fazia querer voar em seu pescoço, mas eu tinha acabado de acordar e não queria começar o dia com hematomas.

É. Você leu certo: hematomas. Além de tudo, meu irmão era um pouco troglodita. Ele treinava desde os quatorze anos, e com dezoito, era capaz de colocar medo em qualquer criatura – seja de cinco ou vinte anos – que preze pela própria vida.

Não me entenda errado... Douglas estava entre os garotos mais desejados do nosso colégio, o Honório de Paula. Porém, como toda irmã normal, eu não conseguia ver esse outro lado dele, pois nenhum encanto encobria sua completa lerdeza, ignorância e burrice constante – pelo menos no que se tratava de matérias escolares. Isso se devia ao fato de que eu era uma das pessoas que mais conhecia o verdadeiro Douglas. Principalmente, aquele Douglas implicante, que adorava me irritar até que eu me cansasse, ou que fazia porcarias tremendas – como arrotar na minha cara. E isso já era o suficiente para eu não querer ver mais lado nenhum.

Mas voltando à saga da padaria...

Tentei ver o lado positivo da coisa (era o que eu fazia quando estava prestes a explodir com Douglas). A casa do Davi ficava no final da rua, e fazia tempo que não nos víamos fora dos muros do colégio. Logo no primeiro bimestre de aulas, sua atenção não foi uma das maiores, por isso ele levou bomba em várias matérias. Sinto dizer que eu fui bastante culpada por isso. Nós éramos da mesma sala, tornando difícil que nossa atenção se focasse em alguma coisa do que a professora dizia. Em geral, nos uníamos para acabar com o tédio, conversando em voz baixa ou brincando de "detetive" e "stop!" com nossos amigos. E, bem... Às vezes, apenas ficávamos nos beijando no meio da aula – o que já nos rendeu umas centenas de idas à diretoria, óbvio.

Além da amizade (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora