Capítulo 16

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As semanas seguintes se passaram em um piscar de olhos. A volta de Natan à minha vida foi como a peça que faltava para completar um quebra-cabeça. Mesmo que muita coisa tivesse mudado, eu tinha meu melhor amigo ao meu lado novamente, para me ajudar a enfrentar qualquer tempestade. E isso já era mais do que suficiente.

A primeira coisa que fazia agora ao acordar era falar com ele ao telefone. Natan adquirira uma estranha mania de me ligar antes mesmo de se levantar. Ainda sonolento, ele discava meu número às cinco e meia da manhã só para desejar um bom-dia – ainda que fôssemos nos ver em alguns minutos. O que eu achava absurdamente fofo.

No dia seguinte ao meu quase-afogamento, ele me surpreendeu ao aparecer na minha casa depois da aula para colocar o papo em dia. Seguindo as instruções do médico, eu tinha faltado à escola e passado a manhã inteira dormindo, só fui acordar com Natan jogando pedrinhas na minha janela.

Passamos uma tarde como nos velhos tempos. Conversamos sobre tudo o que tinha acontecido durante o período em que ficamos afastados, sem deixar de lado as tradicionais implicâncias. Contei a ele de Douglas e Jullie (ele já sabia a versão dela, mas eu lhe falei da conversa que entreouvi no corredor, do desespero de Douglas e da confissão que me fez sobre seus sentimentos pela minha amiga), da nova fase do meu pai e da vinda de Letícia. Sobre esta última, tive que implorar ao meu amigo que prometesse se comportar.

Quando crianças, Douglas e Natan amavam implicar com a minha prima. Os dois, uma vez, colocaram uma barata na cadeira dela! Estávamos em um churrasco em comemoração ao meu aniversário e Letícia ainda morava no Rio, então é claro que estava conosco. Mas ela era muito tímida e, por não conhecer ninguém, tinha ficado calada a maior parte do tempo, mesmo que eu tentasse enturmá-la. Ela passou a maior parte da festa sentada à mesa com sua mãe, até eu convencê-la a vir se sentar conosco.

Não sei como não percebi. Natan sempre tinha sido um garoto implicante e levado e, quando juntava com meu irmão, ficava ainda pior. Quando eles e uns amigos nossos de infância se levantaram da mesa, eu jamais imaginaria o que estavam prestes a fazer.

Eu não os vi agachados às costas da cadeira da minha prima até ela começar a gritar e pular pelo gramado da casa. A barata caiu de sua blusa e voou longe, tamanho era seu desespero – mas foi realmente muito, muito nojento. Letícia chorou tanto que seus olhos ficaram enormes e vermelhos e ela não saiu mais de perto de sua mãe nem mesmo para cantar parabéns.

Os garotos, é claro, não conseguiam parar de rir enquanto assistiam à cena. Eu tinha ficado bastante chateada com todos pela brincadeira ridícula justamente na minha festa de aniversário. Douglas e os outros meninos não se importaram muito com isso. Já Natan me pediu desculpas por tanto tempo que eu me irritei e só aceitei por causa da insistência.

Eu sabia que meu amigo não era mais o garotinho bobo daquela época, mas não custava nada enfatizar a situação difícil que minha prima e sua mãe estavam passando. Ela precisaria de apoio para se enturmar e se adaptar ao Rio novamente, e eu arrastaria Natan para aquela missão comigo, ele querendo ou não.

Passamos horas nesses assuntos, mas o mais importante de todos eu havia deixado para o final. Depois de se tornar um motivo de briga entre nós dois, como eu poderia contar a Natan sobre Gustavo sem voltar a discutir com meu amigo? Eu sabia que uma hora ou outra ele descobriria – isto é, se ele ainda não tivesse nos visto na escola ou ouvido algo pela Jullie. Ainda assim, era tão difícil!

Para minha surpresa, na hora em que me preparava para contar ao meu amigo sobre isso, fomos interrompidos por um Gustavo que não gostou nadinha de me ver deitada na cama com Natan. Não estávamos fazendo nada, é claro, mas ainda assim ele fechou a cara quando nos viu e se despediu de uma maneira fria que não combinava com ele.

Além da amizade (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora