Capítulo XV
Pensei em contar aos outros da tinta, mas percebi que não valia à pena. Ainda falámos um pouco sobre como os lobos tinham entrado e quem misteriosamente assassinara o predador da Eleanor, mas acabámos por largar o assunto. Era só mais um inexplicável acontecimento, e já tinham acontecido tantos que já ninguém se esforçava para os tentar perceber.
Porque é que estávamos ali... porque nos tinham escolhido a nós... quem nos fechara na cave... quem escrevera MORTE nos dormitórios e como entrara... o desaparecimento da espingarda... a misteriosa tinta... o M que o rapaz escritor rabiscara na parede... os lobos...
Era demasiada coisa e sentia que ia literalmente explodir se continuasse a pensar nisso.
Eu, a Gabby e a Maisie usámos o chuveiro da casa de banho uma de cada vez. Eu fui a última. Soube bem sentir a água jorrar no corpo e ver o sangue e terra ir pelo ralo abaixo.
Estava tão paranóica com isto que de repente espreitei pela cortina para ter a certeza que o assassino não estava ali, pronto para me esfaquear.
Obviamente não estava. Era só eu na casa de banho.
O que se passava comigo... Nunca fora tão desconfiada. Encostei-me à parede de azulejos frescos e fiquei ali. O vapor estava a sair pela minúscula janela translúcida de casa de banho, por isso a visibilidade até era clara. Quem me dera poder adormecer e não voltar a acordar...
- A Lyra está? - Perguntou uma voz de fora da casa de banho.
Abri os olhos.
- Está ali, na casa de banho - respondeu a Maisie.
Ouvi os passos do Michael aproximarem-se da porta e a maçaneta rodar.
- Espera!! - Gritou a Maisie. - Ela está a tomar banho!
A maçaneta parou abruptamente.
- Oh...! Ok... diz-lhe que volto mais tarde.
- Espera! - Gritei. Saí atabalhoadamente da banheira e enrolei-me na toalha. Depois, abri a porta da casa de banho.
O Michael estava ali, ainda sujo e com a roupa manchada de vermelho. Obviamente estava à espera de poder usar um duche livre.
- Ah... Lyra, não precisavas de ter saído - disse ele, parecendo um pouco desconfortável.
- Deixa, já estava a acabar de qualquer maneira. - Encolhi os ombros.
- Bem... é sobre o que aconteceu ali no bosque.
O meu coração acelerou de repente.
- Hum... sim - foi tudo o que consegui dizer.
- Eu... queria-te agradecer, por... teres ficado embaixo a... proteger-me?
- Michael, poupa-me. Vocês achavam mesmo que eu ia subir e deixar-te ali?
A mim não me parecia nada de extraordinário. Sinceramente, nem se punha em consideração...
- Podias ter subido e ninguém te ia julgar. Só isso.
- Bem, TU saltaste do pinheiro abaixo e aterraste no lobo. Se não fosse por ti... - Passei o dedo pela garganta para elucidar.
- Oh, isso... - O Michael pareceu desconfortável quando de repente disse: - Sabes, na verdade foi sem querer. Desequilibrei-me e aterrei por sorte no lobo que te estava a atacar.
Foi como se me tivessem dado com um martelo. Limitei-me a olhar para ele, de boca escancarada.
Então não fora intencional. O Michael nunca fizera aquilo por mim. Fora mesmo estúpida em acreditar que sim. Porque é que ele haveria de fazer iss...
- Hey, Lyra - de repente ele sorriu. - Eu estava a brincar contigo, OK? Atirei-me de propósito.
- Seu...! - Um suspiro de alívio saiu-me involuntariamente.
- Lyra, o que é que achas que eu faria? De repente só te vejo cair para trás e este lobo pronto para te comer...
- Então, porque é que me estavas a criticar por ter ficado embaixo para te salvar? No fundo, fizeste a mesma coisa por mim.
- Bem... é diferente.
- Diferente como?
Então o Michael mudou de assunto.
- Fazes ideia de onde saíram os lobos?
- Não - respondi secamente, chateada por ele ter mudado de assunto. - E... Desculpa, Michael, estou demasiado cansada para discutir teorias. Vou acabar o banho.
- Tudo bem... então até logo. - E acrescentou: - Nada aqui faz sentido, hã?
- Pois não - concordei, entrando na casa de banho. - Já não me pareces assim tão seguro naqueles teus "detalhes estranhos"...
O Michael não me respondeu. Acenou-me e saiu do nosso dormitório.
Eu fiquei ali, a vê-lo ir embora. Percebi que ainda estava enrolada na toalha. Voltei a entrar na casa - de - banho, sentindo-me estranhamente mais leve. Devia ser do medo. Ou desta conversa.
Ou de ambos.
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Campo de Férias
Mystery / ThrillerEra para ser um campo de férias normal, não era? Era para nos divertirmos e passarmos duas semanas inesquecíveis, não era? Era para conhecermos gente nova e aproveitarmos o Verao, não era? Mas então, porque é que morreram todos? *Esta história foi e...