Capítulo XVIII

36.2K 2.1K 507
                                    


- Como é que ele entrou?
Estávamos reunidos na sala adjacente, o mais longe possível do corpo sangrento da Maisie. A palidez das nossas caras era assustadora, e eu não sabia como é que me estava a aguentar de pé sem cair para o lado.
- Não faço ideia, não quero saber e tenho raiva de quem sabe - afirmou o Alex, entredentes.
- Não é assim, Alex! Temos de descobrir a entrada! Obviamente, não é a pela porta nem pela janela. Se não soubermos qual é, o que o impede de nos vir fazer uma visitinha todas as noites? - Disse o Kay.
- O que fazemos, agora? Avisamos os outros?
Abanei a cabeça.
- Não vale a pena. Estão todos a dormir. Amanhã de manhã dizemos.
- OK. E quanto ao cadáver esvaído em sangue deitado naquela cama? - Perguntou a Rose.
- Deixamos ali o resto da noite...
- Desculpa aí, muchacho - interrompeu o Tom - recuso-me a dormir o resto da noite com a Maisie morta ao meu lado!
Olhei para o relógio. Eram 3:02 da manhã. O Tom tinha razão, ninguém aguentava seis horas com um corpo esfaqueado no mesmo quarto.
- Então, vamos pô-lo no bosque com os outros? Agora? De noite? - Pela voz do Alex, a ideia não lhe agradava.
- Não precisas de vir, Maria Malmequer - disse o Michael, revirando os olhos. - Vamos eu, o Kay e o Alfie. Duvido que o assassino nos ataque estando em grupo, bem acordados.
- Se tiver a espingarda não faz diferença - disse eu, nervosa. Olhei pela janela. Não se via nada no escuro da noite, excepto vagas sombras dos pinhais lá ao fundo e o céu estrelado. Eles iam ter de atravessar o prado todo e voltar, sem luz.
- É um risco que temos de correr. Alfie, Kay, 'bora.
Os dois pareciam menos determinados que o Michael, mas mesmo assim foram com ele. Ouvimo-los içar o corpo da Maisie e depois o Michael a puxar o móvel e destrancar a porta.
Respirei fundo e olhei. Queria ter um último vislumbre da Maisie. Não nos podíamos dar ao luxo de chorar a morte de cada pessoa, mas principalmente depois das confissões de ontem, eu estava realmente triste pela sua morte.
Ela só queria ter uma vida normal.
Senti água nos olhos, mas ignorei. Não podia chorar. Já bastara a Gabby.
Ouvimos os rapazes sair e fechar a porta. Ficámos eu, o Alex, o Tom, a Jayden e a Rose, em silêncio.
- Bem, não sei vocês, mas eu vou dormir - disse o Alex, por fim. - Boa-noite. - Sem sequer olhar para mim, deu meia-volta e ouviu-se as molas ranger quando ele se deitou na cama.
Também queria ir, mas não ia adormecer até os três rapazes voltarem sãos e salvos. Olhei pela janela. Parecia que estava ainda mais escuro que há uns minutos atrás.
- Que coisa horrível - ouvi a Rose murmurar. - Como é que isto pode estar a acontecer. Quero ir embora.
- Todos queremos. - Concordou a Jayden. Tinha quase a certeza que ela estava a olhar para mim. De repente ela disse: - Lyra, não viste nada?
Olhei para ela, desconfiada.
- Estava a dormir. Acho que ninguém acordou a tempo.
- Primeiro a Gabby, depois a Maisie... sou a única a notar que todas as tuas amigas estão a morrer?
- Deve ser uma maldição - riu-se a Rose. - Quem quer que seja amigo da Lyra, a morte o espera.
- Bem, então não tenho esse problema - rematou a Jayden.
Talvez pudesse responder, mas a última coisa que me apetecia era envolver-me numa discussão estúpida. Levantei-me e fui ter com o Alex. Podia esperar pelos rapazes do outro lado.
Graças a Deus não lhes aconteceu nada. Pareceram anos de espera mas finalmente bateram à porta. Espreitei pela janela para confirmar que eram eles e abri.
- Já a pusemos perto dos outros. - Disse o Alfie, entrando. - Bolas, lá fora está gelado.
- Já agora, a faca? - Perguntou o Tom, quando todos se acomodaram.
Em resposta, o Kay tirou-a do bolso do casaco. Já estava limpa, por isso calculei que a tinham lavado.
Observei-a. Era bem comprida e a ponta era afiadíssima. Quantas pessoas teriam sido mortas por aquilo? Estremeci e quis de repente muita distância daquela arma.
- Acham que o assassino deixou a faca espetada na Maisie de propósito ou foi porque nós acordámos e teve de fugir à pressa?
- Não sei. Também, de que nos adianta esta faca? Não nos vai dar vantagem.
- Podemos-nos defender. E talvez seja afiada o suficiente para cortar a vedação?
O Michael encolheu os ombros.
- Amanha de manhã tentamos. Mas tenho a impressão que não vamos conseguir nada.
- Vamos dormir agora. Já é tarde.
A Jayden, o Tom e a Rose também foram para a cama. Acomodámo-nos e depois o Michael apagou a luz.
Assim.
Como se nada tivesse acontecido.
Como se tivéssemos acordado com o barulho do vento e agora fôssemos adormecer de novo.
Mas não fora o barulho do vento que nos acordara. E eu sabia que não ia pregar olho o resto da noite.
Virei-me para a parede, para não ter de ver a cama ensanguentada da Maisie. Fechei os olhos com força, mas de repente as lágrimas que estivera a reter este tempo todo escaparam.
Chorei sem som. Simplesmente lágrimas. Não sabia se era por medo, pela Maisie, por saudades da Gabby ou por este massacre psicopata.
Acho que por tudo isso.

Campo de FériasOnde histórias criam vida. Descubra agora