Capítulo XXXIII

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Mesmo antes de abrir os olhos, já sabia que alguma coisa estava mal.

Sentia a cabeça estranhamente pesada. Quanto tempo dormira? Os meus olhos ardiam-me e percebi que sucumbira ao sono.

E então ouvi.

O meu corpo continuava meio adormecido e quando abri os olhos, fechei-os de novo rapidamente. Quem estaria a falar? O Michael e os outros teriam finalmente acordado?

Remexi-me lentamente nos lençóis. Havia uma espécie de sirene de perigo a piscar na minha cabeça, mas eu não percebia porquê.

A voz que se ouvia vinha de longe... muito longe... tentei concentrar-me no que dizia. Era uma espécie de cantiga, o que não fazia sentido nenhum. E à medida que ia ouvindo as palavras, os meus olhos foram abrindo lentamente.

Eles já estão arrumados

Pu-los todos a dormir

E daqui a nada nada

Para longe eles vão ir

Eles já estão arrumados

Pu-los todos a dormir

E daqui a nada nada

Para longe eles vão ir

Para longe eles vão ir

A voz vinha do outro lado do dormitório, da sala. Sentei-me, de repente bem desperta. O medo começou a percorrer-me, como se fosse sangue nas veias, a espalhar-se e alastrar-se pelo corpo.

Olhei-me em volta, com o coração descompassado de repente e uma sensação de pânico crescente.

O Kay, o Michael, a Summer e o Alex continuavam deitados nas suas camas, a dormir.

Então, quem é que estava...?

A cantilena continuou. Pela voz, parecia-me ser uma rapariga, e além da canção que ela estava a cantarolar ouvia-se também um barulho de metal.

Ela estava a limar uma faca.

De repente apeteceu-me vomitar. Percebi que estava a tremer, mas não conseguia parar. Tentei chamar pelos outros, mas estava completamente muda, e de qualquer forma eles não iam acord...

Pu-los a dormir.

Era isso que dizia a música. Pu-los a dormir. A cantilena continuava a vir de longe, mas o meu cérebro viajou até a pasta de dentes, supostamente de uma das raparigas. O assassino tinha-a envenenado, ou posto um sonífero. E eles, ao lavarem os dentes com ela, adormeceram como umas pedras. Eu fora a única que não a usara, consequentemente era a única acordada.

Meu Deus. Eu estava morta. O assassino achava que eu também lavara os dentes, por isso não estava à espera que nenhum de nós estivesse acordado. Uma onda de frio gelou-me da cabeça aos pés e senti que ia vomitar de verdade pelo medo.

Já estava a considerar fugir pela porta quando o barulho de metal a ser limado cessou.

O dormitório ficou silencioso. Os meus órgãos pararam todos. Em toda a minha vida, jamais sentira tanto medo. Devagar, deitei-me de novo nos lençóis, sentindo lágrimas nos olhos. Se queria sobreviver, eu tinha mesmo de me acalmar. Mas qualquer tipo de presença de espírito que eu pudesse ter desvanecera-se. A única coisa em que consegui pensar foi em fingir estar adormecida. Talvez isso me desse alguns minutos, ou segundos.

Ouvi passos a vir da outra sala para o dormitório. Quem quer que fosse continuava a murmurar aquela melodia assustadora, como se estivesse muito bem-disposto. Abri uma fresta dos olhos. Conseguia ver o vulto da pessoa, mas estava demasiado escuro para a identificar. Uma súbita luz rasgou o escuro: o luar refletido na faca que o assassino trazia na mão.

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