Capítulo XVII

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A Jayden levou-me para fora do dormitório até o seu. Estava vazio, e ela olhou para mim e disse, num tom de voz cortante:
- O que é que tu e o Kay foram ontem à noite fazer, na casa de banho?
Esta coisa toda deve ter-me atrasado um pouco o raciocínio, porque pisquei os olhos e demorei uns segundos a perceber ao que é que a Jayden se referia.
- Ahh... isso... - Mas como é que ela sabia? Não estava no nosso dormitório.
- A Rose acordou com os vossos passos e viu-vos entrar na casa de banho - elucidou a Jayden, atirando os enormes cabelos ruivos para trás. - Vocês ficaram lá bastante tempo, segundo ela me contou - a Jayden arqueou uma sobrancelha tão alto que quase chegou ao fim da testa. - Não é preciso sermos génios da matemática como tu para perceber o que se passou.
- OK, Jayden, deixa-me explicar. Não foi bem assim. ADMITO que nos beijámos, mas o Kay chamou-me durante para a noite porque me queria "mostrar uma coisa", e eu fui atrás dele. Só percebi as suas intenções quando chegámos lá.
- Isso não me interessa, Lyra. Quero só saber exatamente o que aconteceu lá dentro e se vocês namoram ou assim.
- Espera lá, Jayden, eu não te devo explicações - interrompi, um pouco irritada. - Que tens a ver com isto?
A Jayden pareceu um pouco hesitante, mas por fim disse:
- Não é segredo para ninguém que estou interessada no Kay, Lyra. E preciso de saber se há algo entre vocês ou se tenho hipóteses.
A Jayden interessada no Kay?
Por esta eu não esperava.
Já os vira falar, uma ou duas vezes, mas nunca me passara pela cabeça que... pronto!
- Não namoramos, se é isto que queres saber - respondi, no mesmo tom seco. - O Kay pediu-me em namoro, mas eu recusei. Pelo menos por enquanto.
- Então se eu tentar a minha sorte com ele, tu não te vais meter no meio? - Perguntou a Jayden. Era mais uma ordem do que uma pergunta.
Engoli em seco. A Jayden não me agradava nada.
- Não sei o que te dizer, Jayden. Suponho que não, não me vou meter no meio.
- Ótimo - disse a Jayden, atirando de novo o cabelo para trás (um tique irritante que ela e a Rose têm). - Então, acabaram as escapadelas noturnas. Se vocês não namoram, não têm nada que andar por aí aos beijos.
Eu estava tão espantada que nem sabia o que responder.
Quase tínhamos sido queimados vivos e esta miúda toda preocupada com a sua vida amorosa.
A Jayden atravessou o dormitório e saiu, mas ainda disse:
- Tens o Alfie, não tens? Aproveita. Não tens nada que andar num joguinho de gosta - não - gosta com três rapazes diferentes.
E foi embora.
Sentei-me na cama, e respirei fundo três vezes.
A Jayden e o Kay juntos...? Nunca imaginara, mas porque não? Ela parecia obviamente interessada, e bem vistas as coisas, talvez o Kay também lhe desse troco? Podia fartar-se da minha indecisão. EU estava farta da minha indecisão.
Imaginei-os abraçados e tentei perceber se sentia ciúmes ou desconforto.
Não sabia.
Não sabia nada.
Entrei na casa de banho e olhei-me ao espelho. Os meus olhos verdes, normalmente luminosos, pareciam estar sem brilho, como se alguém tivesse diminuído a luminosidade do visor do telemóvel. O meu cabelo estava num rabo de cavalo improvisado e sentia-me cansada e assustada. Até tinha emagrecido um pouco, mas isso acontecera a todos.
A Jayden era ruiva, com um corpo bem feito, sorriso rasgado e olhos castanhos claros. Na verdade, parecia o par perfeito para o Kay. Agora tinha só de ver se ele ia entrar no jogo dela ou recusar.
Antes de ir embora também, lembrei-me do que a Jayden dissera.
Um joguinho gosta -não - gosta com três rapazes.
Alfie. Kay. E, tal como ela dissera, não era preciso ser-se um génio matemática para perceber quem era o terceiro elemento.

***

Quando cheguei ao dormitório, vi que estava toda a gente deitada num círculo, excepto a Rose e a Jayden, que estavam num canto a sussurrar sobre mim, suponho.
- Lyra - disse o Alfie, quando me viu - onde estiveste? Anda, estamos a fazer um plano.
Um plano? Curiosa, decidida a esquecer estas complicações amorosas, sentei-me no chão, juntando-me ao Michael, Kay, Alfie, Mel, Alex, Julian e Maya.
- Decidimos tentar prever o próximo ataque dele. - Explicou-me o Michael, embora não me olhasse nos olhos. Tinha uma folha e uma caneta onde rabiscara umas coisas. - Até agora ele tem sempre estado um passo à nossa frente, mas desta vez vamos ser mais espertos.
Suspirei. Quando o Alfie dissera plano eu pensara que tinham feito uma estratégia elaborada para descobrir o assassino, ou para sairmos daqui. Assim, não me parecia tivéssemos muitas hipóteses.
- Já nos atraíram para a câmara de gás, soltaram cá para dentro lobos esfomeados, e atearam um incêndio que nos teria morto se não tivesse começado a chuva. Que mais nos podem fazer?
- Hey, e se isto for uma enorme arena como nos Hunger Games, onde controlam tudo a partir de uma sala? - Sugeriu o Julian, entusiasmado.
Todos olhámos para ele, em descrença.
- Que foi? Pediram sugestões, não foi? - Defendeu-se.
- Sugestões REALISTAS.
- Já agora, ontem à noite lembrei-me de uma coisa - rematou a Mel de repente. - Será que alguém não viu aquele fumo todo e está a vir nesta direção para descobrir o que era?
A cara de toda a gente iluminou-se como um farol.
Menos a minha e a do Michael.
- Gente, não quero ser desmancha prazeres, mas é TÃO improvável. Estamos no meio de uma floresta de árvores enormes, e a aldeia mais próxima é a 100 e tal quilómetros. - Disse eu, suspirando.
- A Lyra tem razão. Ninguém pode ter visto o fumo.
Os faróis apagaram-se, e toda a gente pareceu desanimada como antes.
A pequena reunião foi desastrosa. Apesar de algumas sugestões inteligentes e outras disparatadas (Cavar um buraco com uma colher como naqueles filmes de prisioneiros!,disse o Alex) ficámos na mesma. Só havia uma coisa a fazer. Esperar até o próximo Domingo.

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