Estela e a Fera - Parte 2

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Capítulo 1

"Até um ogro se renderia aos seus encantos"

– Isso é sério? – Estela perguntou num misto de desânimo e frustração.

O amigo alcançou sua mão que estava sobre a mesa e deu um meio sorriso e em seus lábios havia uma pequena cicatriz que lembrava, de um jeito meio cômico, a borda lascada de um xícara.

– Eu sinto muito, Estrelinha, mas foi tudo que eu consegui.

Ela sorriu com o apelido. Somente as pessoas que conheciam seu passado a chamavam assim. Uma garçonete chegou desviando por um momento as lembranças de Estela. Ela depositou à mesa uma cesta com pães de queijo, uma xícara de café com chantilly e um copo de chá gelado. Estela e Túlio agradeceram e a jovem voltou seu olhar perdido ao movimento de pessoas que àquela hora já passeavam pelo shopping.

– Desculpa – ela tornou a fitar o amigo. – Você foi tão gentil em arrumar um emprego para mim e eu ainda estou aqui reclamando.

– Tudo bem, Estrelinha, eu entendo o seu medo, mas vai dar tudo certo. – Túlio a encarou com o olhar encorajador. – Você é encantadora e é impossível que alguém não goste de você. Até um ogro se renderia aos seus encantos.

Estela soltou um riso fraco. Ela não estava muito certa sobre seus encantos, mas não refutou o amigo. Ele estava tentando apenas ser gentil e positivo e ela precisava ser assim também.

Le Palais era uma empresa muito conceituada. Há alguns anos atrás todos sonhavam em trabalhar naquele lugar e, mais que tudo, ao lado de um dos filhos do dono que possuía a fama de ser um homem irresistível apesar de rude e mimado. Mas tudo era diferente agora. Ninguém mais queria ficar perto dele. Todos sabiam que, após o acidente que havia sofrido, ele não somente havia se transfigurado e se transformado numa fera – como o chamavam –, mas também havia se tornado um homem sombrio e de difícil convivência.

Um suspiro involuntário escapou dos lábios de Estela. Ela entraria lá como sua assistente pessoal e não era nada promissor saber que teria que lidar com alguém com um caráter tão irascível. Mas precisava aceitar aquele emprego. Seus pais não estavam num bom momento na editora. A crise os havia atingido e ela precisava contribuir para ajudá-los, ainda mais depois de tudo que eles haviam feito a ela.

Estela havia sido abandonada ainda muito pequena. Ela não se lembrava muito de sua mãe, embora já tivesse sonhado várias vezes com o momento em que havia sido deixada, com a voz daquela mulher sussurrando e os passos dela se afastando. Mas isso tinha sido antes de ser adotada por Lilian e Júlio. Quando eles a escolheram dentre tantas crianças, foi certamente o momento mais feliz de sua vida. Desde aquele dia eles a haviam amado com um carinho especial. Ela sentia como se fossem seus pais de verdade, porque era assim que ela os enxergava não importava que não tivessem o mesmo sangue. Não quando os laços do coração os uniam de uma maneira tão única. Agora, precisava retribuir aquele amor.

– Eu estarei lá pela manhã – decidiu por fim.

– Vai dar tudo certo, Estrelinha, tenha fé.

ღღღ

Tudo em volta era grande e imponente. Os móveis eram sofisticados, o piso brilhava, polido, e, embora fosse de mármore, seu desenho dava a impressão de que o chão era revestido de madeira. Estela entrou no elevador com Gastão, o braço direito da Le Palais. Ele era um homem alto, possuía cabelos loiros e um olhar sagaz. Quando as portas se abriram no último andar, ela se deparou com um ambiente bastante sério. Havia ali uma grande mesa de mogno, com papéis organizados, um notebook, um telefone e um porta-canetas. Ao lado, um grande corredor com um tapete azul estendido que levava a uma porta que provavelmente dava acesso a uma sala. Ela entortou o pescoço para olhar melhor e sobressaltou-se com a voz de Gastão muito perto do seu pescoço.

Para Minha Querida Amiga SecretaOnde histórias criam vida. Descubra agora